Apenas o gigantesco castiçal no centro do cômodo de tom de madeira, dourado e branco, estava aceso para a iluminação. As cortinas fechadas, por causa do frio consistente no Coração de Titônia, colaboraram com as dezenas de velas suspensas no teto pelas hastes metálicas que se alinhavam de uma em uma até fechar o ciclo de 360° graus, proporcionando uma ambientação amarelada, pouco iluminada e, acima de tudo, fúnebre.
Dois caixotes de madeira polida, vermelha e reluzente, com proporção estimada em dois metros de comprimento e um metro de largura, estavam suspensos de forma equivalente e paralela no centro do cômodo espaçoso. Aos poucos, pessoas vestidas de tecidos pretos e de cabelos engomados se aproximavam, cochichavam alguma palavra, algumas até tinham o esforço de derramar umas duas ou três lágrimas antes de se afastar.
Era um velório.
O último rei de Titônia estava sendo sepultado ao lado de sua esposa. Os dois faleceram há três dias num acidente com a carruagem que caiu morro abaixo, foram engolidos e sufocados sem piedade pela neve branca e profunda que revestia tanto o Coração quanto a Zona Militarizada de Titônia. A coroa do rei fora encontrada enterrada e escondida no gelo quebradiço a poucos metros dos dois falecidos.
Os corpos inanimados do rei e rainha estavam expostos nas suas tumbas destampadas, as asas que em vida eram tão vangloriadas em suas costas, depois da morte estavam murchas e três vezes menores — os defuntos possuíam a pele tão pálida quanto as nuvens dos céus, ou como a neve. Tão apáticos quanto de costume. Entretanto, embora tanta brancura, os dois tinham cicatrizes escuras e profundas espalhadas ao longo do corpo, pouco disfarçadas pela maquiagem, a mais aparente delas era o corte que atravessava seus pescoços quebrados.
Yoongi rondava o território com olhos alertas de soldado eficiente, mas não pôde conter a curiosidade que o obrigou a desviar brevemente do seu caminho só para dar uma pequena bisbilhotada nos cadáveres reais. Mas, o que deveria ser uma singela espiadela, terminou em longos minutos vidrados. Yoongi ficou paralisado ao descobrir a existência peculiar das cicatrizes costuradas nos pescoços, marcas recentes e retas iguais ao corte de espada ou navalha, — em seu ponto de vista — precisas demais para serem efeito de um acidente.
Uma tossida indiscreta foi a responsável por obrigar Yoongi, que no momento já estava tão pálido quanto o pobre rei morto e estirado, a se afastar. Edin, o irmão mais novo do falecido rei, torceu os olhos ao ver um servente da milícia encarando a nobreza, ainda que sem vida, de forma tão inescrupulosa. Pouco expressivo, porém, Yoongi manteve aquela cara de desinteresse que só ele conseguia fazer quando cumprimentou Edin e sua família, antes de sair, com uma breve reverência, Amália tentou conter um sorriso ao vê-lo.
Yoongi se foi, sem olhar para trás. Edin, resmungou alguns xingamentos em sua direção até o momento que o rapaz desapareceu das vistas, só então se aproximou do corpo do finado irmão. Amália, por sua vez, era filha de Edin e Bela — que faziam parte da mais abastada nobreza do Sol —, ela também era irmã mais nova de Taehyung. A família estava toda reunida na borda do caixão de seu ente querido, em pleno velório, com roupas escuras e adereços bem preparados.
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Aʟᴇ́ᴍ
FanfictionEm Titônia há duas nobrezas, Sol e Lua dividem a monarquia. Onde todos têm asas, mas nenhuma pode voar; exceto as do rei. Após a misteriosa morte do último rei e rainha, o trono está vago à Lua. Comprometido numa antiga aliança de casamento com a fi...