I PARTE

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Lia costumava brincar na rua até tarde. A menina de cabelos curtos e olhos grandes adorava brincar de bater a campainha dos vizinhos e depois se esconder. Junto com seu amigo Rui, atormentavam toda vizinhança e, não deixavam ninguém dormir até que eles entrassem para suas casas. Mas naquela rua, havia uma casa no qual ela e Rui nunca se atreveram incomodar, era a casa 81. Assim as crianças da rua se referiam à velha casa no final da rua. O lugar era estranho e, parecia não morar ninguém. Construída com madeira, o lugar tinha o teto faltando alguns pedaços. O jardim mais parecia um campo de batalha com tanta coisa velha e quebrada. Mas o que dava medo mesmo era a varanda, com uma só janela, parecia que quem morava ali acompanhava todo o movimento da rua. Lia só sabia que o lugar era habitado por alguém, porque à noite a luz ficava acesa e não tinham correspondências acumuladas na caixinha de correios. Os outros amigos ou vizinhos não comentavam sobre a casa, na realidade não gostavam nem de falar no assunto. Pouco se sabia sobre o lugar, a única vez que alguém comentou algo, foi quando o Sr. Leonildo da padaria viu uma fumaça preta saindo da chaminé. A rua ficou infestada por um cheiro ruim, parecia que estavam queimando algo em decomposição. 
Os burburinhos duraram o mesmo tempo que a fumaça - quase nada. Ninguém teve coragem de chamar a polícia, apenas ficavam lá, dentro de suas casas observando pela greta da janela. Até que um dia, enquanto brincava na rua com seus amigos de “verdade ou consequência”, Lia fora desafiada. A menina era corajosa. Apesar de sua baixa estatura, ela era astuta e não permitia que ninguém a desafiasse e saísse impune.
— Ok, Lia! — falou o menino desdentado. — É por sua conta e risco — alertou.
— Pode falar — ordenou Lia.
O menino olhou para um lado, olhou para o outro lado e pensou. As outras crianças estavam ansiosas para saber qual desafio o garoto iria escolher. Enquanto isso, Lia sorria e enrolava uma madeixa de seu cabelo preto formando pequenos cachos no cabelo liso.
— Eu desafio você… — O menino fez uma pequena pausa e olhou novamente para a menina. — Eu desafio você... a tocar a campainha da casa 81 — gritou, apontando para o lugar mais assombroso da rua.
A menina engoliu em seco e seus olhos se esbugalharam. Houve um alvoroço entre as crianças, afinal, o desafio se tratava do lugar mais assustador do mundo.
Lia respirou fundo e sorrindo falou:
— Sem chance, Carlinhos! Você sabe que não podemos ir lá e se a minha mãe descobrir vou ficar de castigo — argumentou, tentando explicar os motivos para não aceitar o desafio.
— Sabia que você não teria coragem — zombou. — É uma medrosaaaa — Carlinhos começou a gritar na rua que Lia não era de nada. A menina foi ficando vermelha até que não aguentou mais a "zoação" e gritou.
— Está bem! Eu vou!
Todos pararam imediatamente de falar. Houve um silêncio mútuo. As crianças se entreolharam com expressões de medo.
— Não precisa fazer isso, Lia — avisou Rui.
— Deixa isso pra lá, foi só uma brincadeira — replicou Joana, amiga da garota.
— Está decidido, eu vou! 
Lia ajeitou o short e a blusa listrada e, com um rabo de cavalo prendeu o curto cabelo.  Todos que de início caçoavam a garota, agora apenas observavam aflitos. A casa 81 era o limite para todos eles e, a punição por quebrar a regra era...castigo!
A rua já estava deserta e passava das 21 horas da noite. Todos os moradores já haviam se recolhido e, apenas as crianças ainda estavam na rua. Era período de férias da escola e por essa razão os pais permitiam que eles brincassem até um pouco mais tarde. 
— Alguém me acompanha? — desafiou Lia.
Todos se entreolharam e apenas Rui respondeu.
— Eu vou!
— Eu também! — dissera Joana.
Carlinhos apenas sorriu e ironizou.
— Vou ficar aqui para ver tudo de camarote.
Os três olharam para ele e voltaram seus olhos para a casa. Não seria nada fácil cumprir este desafio, mas Lia estava disposta a não desistir.
E assim, os três saíram em direção a casa 81.

O mistério da casa 81Onde histórias criam vida. Descubra agora