Pequenos sentimentos

Jessica e Carol

Jessica e Carol se conheceram aos 11 anos. O fato de serem as garotas novas da escola uniu-as quase que automaticamente. Em pouco tempo elas eram unha e carne, faziam absolutamente tudo juntas: os trabalhos da escola sempre rendiam boas risadas (e quase nenhum trabalho), o futebol era motivo de falatório durante as aulas de geografia, até as lições de casa elas conferiam uma com a outra, pra ter certeza que estava tudo igual.

Mesmo após alguns anos, elas ainda mantinham um vínculo inseparável. Agora elas não estavam mais sozinhas contra o mundo, mesmo não sendo as mais populares da escola, suas novas amigas eram tudo o que elas pensavam. Aos 14 anos tudo estava para mudar, todos iriam para novas escolas, mas nada podia abalá-las. O último ano foi sofrido, mas elas fizeram questão de escolherem a escola juntas, tudo ficaria bem, elas não precisavam se distanciar das outras amigas.

Um mundo de novas descobertas se abriu para as duas. Jessica descobriu os livros, os textos, os desenhos, a internet. Carol descobriu os beijos de língua. Elas dividiam seus conhecimentos, compartilhavam cada momento de sua vida. Com a idade veio a liberdade, e agora elas podiam se ver mais, conversar mais, e, mesmo que raramente, se encontrar com as amigas.

Carol olhava com inveja para as garotas populares, e se pudesse roubaria seus lugares, ela era melhor que aquelas garotas exibicionistas de qualquer jeito. Jessica encontrou o canto perfeito para comer durante os intervalos, onde ninguém poderia vê-la e ela estaria livre para conversar com sua amiga com tranquilidade.

Elas tiveram suas primeiras experiencias naquela escola. A primeira festa, Carol poderia ir em uma daquelas todo fim de semana, dançando por horas, mas Jessica ficou estressada com as várias mãos que passaram por seu corpo sem permissão e sentia que era culpa dela nenhum garoto ter tentado beijá-la. O primeiro beijo de Carol. O primeiro texto que Jessica publicou. O primeiro garoto que roubou o coração de Jessica e o primeiro garoto que Carol teve seus momentos mais intimos.

Tudo era motivo de as duas gastarem horas da madrugada falando sobre. Era ótimo ter alguém ao seu lado, que sabia absolutamente tudo que tinha para saber. Ao fim dos três anos, antes das duas se prepararem finalmente para aquilo que a escola estava preparando-as, elas sabiam que aquilo era muito mais que amizade. Elas eram irmãs. Almas unidas, que deveriam ficar juntas para todo o sempre. Elas se casariam com amigos e viveriam como vizinhas, uma sempre apoiando a outra.

Faculdade. Jessica queria estudar literatura. Carol queria medicina. Jessica entrou na faculdade. Carol precisava trabalhar para ajudar a família. O tempo não ajudava. As duas conversavam todos os dias, se contavam tudo. Mas elas sentiam falta do contato, dos abraços reconfortantes, das risadas sinceras. As duas tinham novos amigos agora, mas elas não estavam mais tão juntas.

Ciumes.

Carol começou a ir em festas com seus novos amigos.

Mais ciúmes.

Jessica não parava de falar de seus novos amigos.

Muito ciúmes.

Elas queriam se ver, mas elas não tinham tempo.

Jessica foi a uma festa com Carol e seus amigos. Tudo deveria estar resolvido, mas ela não sabia como se comportar ali. Ela sentiu como se aquele não fosse seu lugar.

Elas foram passear no parque, mas Carol sentia como se tudo estivesse parando e ela perdia um tempo precioso.

Elas se falavam menos. Os assuntos da outra não interessavam mais.

Carol só convidava Jessica para festas. Jessica queria ficar em casa. Carol tinha um namorado novo a cada 2 meses, Jessica queria alguém para dividir seus momentos também, mas ninguém parecia querer ela.

Elas brigavam. E ficavam meses sem se falar.

Até tentaram se reaproximar, mas o tempo não ajudava, muito menos o resto.

Hoje em dia elas se encontram na rua de vez em quando, mas elas sabem que não combinam mais. Aquilo foi só uma fase que elas não podem voltar. Muito foi dito, muito foi sentido.

Elas não sentem ódio, nem decepção. Apenas aconteceu. Elas estão em momentos diferentes, elas não se amam mais. Mas elas amam o que elas passaram. Elas ainda se respeitam, mas não são mais amigas, nem conhecidas. Apenas pessoas que passaram por suas vidas. E está tudo bem com isso.