Prólogo

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Eu tinha esquecido os óculos em casa. Conseguir enxergar meu nome na lista seria um sacrifício, tendo em vista minha debilidade de visão às curtas distâncias. 

Ótimo começo de dia, não?

— Moça, — senti alguém tocar meu ombro. Tive que me virar para visualizar a pessoa. — pode dar licença?

Revirei os olhos e dei dois passos para o lado, de modo que o homem atrás de mim, pôde se posicionar onde antes eu estava.

— Julie, você passou! — Quando ouvi meu nome, mesmo já de saída, olhei para o moço. Ele, contudo, visualizava alguém através da minha pessoa.

— Não acredito! — Uma voz estridente tomou conta daquele hall vazio. Fiz uma careta ao sentir meus ouvidos tinindo. — Mas eu não mereço...

Tive que observar a cena. A menina de prováveis dez anos tinha uma linda pele negra como a minha, olhos verdes e cabelos encaracolados. Diferentemente dela, os meus haviam passado por tantas químicas que nem uma transição capilar tornaria-o como antes.

O homem, que agora eu notava a aparência jovial, se direcionou até a criança e pôs-se de joelhos para encará-la melhor.

— Você é a melhor atriz de todas, filha. Será um lindo pássaro! —Abraçando ele a garota, um sorriso escapuliu de seus rostos.

Pai e filha. Pelas minhas experiências de vida, aquela relaçãozinha acabaria quando a menina aparecesse com o primeiro namorado. Ela trocaria o pai por ele e blá blá blá.

A vida é desse jeito. Se acostuma quem tem juízo.

Embora houvessem mil julgamentos na minha cabeça, uma frase do homem me chamara atenção. Precisei interromper o momento fofinho para sanar minha dúvida.

— Com licença, — limpei a garganta — o que quis dizer com "será um lindo pássaro"?

Eu esperava que não fosse uma frase familiar interna que os dois tinham, pois, tal situação seria, no mínimo, desgastante para o meu resto de sanidade naquele dia. O homem levantou-se para me visualizar, ao passo que segurava a mão da criança. Sorri cordial, ansiando a resposta.

— É o papel que ela interpretará. Julie será o Pássaro na peça "O voo que pássaros não fazem".

Por fim, quando não expressei nada além de desespero em meu semblante, pai e filha se foram.

Só restou eu e aquela bendita lista na parede. Então, espremendo a visão, tive vontade de morrer ao ler meu nome como o papel de protagonista na dramaturgia mais desconhecida da minha cidade.

Eu tinha duas opções: arranjar uma produção muito boa para angariar minha nota na faculdade de teatro, ou fazer daquele bendito papel desconhecido o melhor de todos da minha vida.

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