CAPÍTULO 1 - VIRGÍLIA
Despertei, antes mesmo que o despertador me despertasse. Era meu primeiro dia no trabalho novo e eu não queria chegar atrasada. Depois de passar três semanas na expectativa de ser chamada para o cargo, não arriscaria por nada a chance de assumir a gerência de uma das lojas da famosa Joalheria Luc Prado, num shopping de luxo, a alguns quarteirões de onde moro.
Naquela tarde, aborrecida com uma série de problemas que resolveram surgir todos ao mesmo tempo, fui ao shopping espairecer. Entrei e saí de lojas. Experimentei roupas e calçados. Mas nada comprei. Nem tinha condições para isso. Eu precisava pensar em como faria para pagar as contas que se acumulavam. Ver coisas bonitas alegravam meus olhos. E foi diante de uma vitrine repleta de objetos belos e valiosos que estacionei deslumbrada com tantas maravilhas. Então, notei um anúncio no canto do vidro. Curiosa, cheguei mais perto e quando vi do que se tratava, tirei uma foto com o celular.
Duas horas mais tarde, compareci à agência oferecendo-me para a vaga. Foi o tempo de passar no apartamento, trocar de roupa e descobrir como chegar ao endereço especificado no anúncio.
Fiz minha inscrição e dois dias depois me chamaram para uma entrevista. Vestida com discreta elegância, mantive minha atenção nos olhos do recrutador, respondendo com firmeza todas as perguntas, sem tremer a voz uma única vez sequer.
Eu queria tanto ser contratada, que me imaginava circulando naqueles metros quadrados suntuosos, coordenando a equipe e me assegurando que tudo funcionasse com eficiência.
Seria o primeiro emprego conquistado pelo meu próprio empenho, pois as duas experiências anteriores foram estágios conseguidos por indicação de papai.
A sala da agência estava lotada. A concorrência era grande e mesmo não sabendo com quantos candidatos eu concorria, entendi que a disputa à vaga seria feroz. Por esse motivo, a comemoração em ser aprovada ao cargo teve um sabor especial.
Mamãe foi a primeira pessoa a quem avisei da novidade.
- Que golpe de sorte, filha.
- Sorte?
- Quando tem de ser, não tem jeito.
- E meu esforço? E meu potencial? E minha iniciativa?
- Ah, por favor, não comece a me retrucar, Virgília.
- Mamãe! Eu não...
- Já sabe quanto vai ganhar? - me interrompeu ela.
- Sei.
- E?
- É pouco no início. Mas o suficiente para...
- Melhor que nada. Agora tenho de desligar. Tá na hora do meu remédio.
- Tchau, mamãe.
- Oh, já ia esquecendo-me de avisar, seu irmão ligou e me pediu um favor. Eu disse que sim. Depois vocês conversam.
- Espera! Não desliga, mamãe! Qual favor?
Fiquei sem resposta e curiosa para saber do que se tratava. Meu mano nem mora aqui na cidade. Fora transferido a trabalho para outro estado, levando esposa e dois filhos. Achei que estavam bem. Agora isso. O que seria? Qual favor? Qual?
Fui me arrumar.
Tomei banho. Preparei um café preto com torradas. Vesti o terninho composto de uma saia cinza e uma camisa de seda branca, que me foi entregue pela agência. Calcei os sapatos pretos de saltos médios. Prendi os cabelos num coque. Fiz uma maquiagem suave. E fiquei admirando com satisfação o resultado em frente ao espelho, alisando o nome Joalheria Luc Prado, bordado no bolso esquerdo.
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O medo de Virgília
Ficção GeralCercada por pessoas desajustadas (psicopatas, neuróticas, depressivas, insanas, obsessivas, fóbicas e inescrupulosas), Virgília luta para manter sua sanidade mental.Dividida entre cuidar da própria vida e ajudar seus familiares que precisam dela fin...