Á cada passos que eu dei até chegar na porta branca, e tocar na maçaneta dourada, com as pontas dos dedos, parecia que á qualquer momento eu ia perder as forças para continuar á subir três degraus. Durou segundos, que virou minutos, inerte igual uma estátua. Olhei para á direita, bancos pintados de brancos, sem nenhuma alma viva sobre ela, no meu lado esquerdo dois jarros com palmeiras dentro, fitei o meu reflexo no chão de cerâmica, brilhando, verifiquei as solas dos sapatos, graças á Deus nenhum vestígio de sujeira, ou eu passaria vergonha logo na entrada.
Antes de bater na porta, fui recebido uma bolada na cabeça coberta por uma boina, a pequena bola de tênis rolou no chão, degraus abaixo, até cessar na grama verde baixa. A voz de uma criança cativou a minha atenção. Do outro lado da cerca, um pequeno garoto, de olhos claros, camisa azul, seus cabelos loiros, e lisos, chegaram na testa, contrastando ainda mais com o brilho do sol.
- Ei, o senhor pode me devolver essa bola, por favor? Ele estendeu a mão para mim.
- Claro, mas com uma condição. Galguei até a bola, peguei-a, e devorei a distância até o menino.
- Qual? Perguntou o menino, com os olhos fixos nos meus.
- Você me deve um pedido de desculpas. Me curvei um pouco, ficando na altura dele.
- Desculpa, senhor. O garoto arqueou as sobrancelhas; típica expressão que não me lembra felicidade.
Entreguei a bola nas mãos do garoto. Os meus olhos percorreram o antebraço magro, quando encontrou o rosto dele, vislumbrei o meu semblante, quando eu era mais novo.
- Eu sou tão velho assim? – Ele indagou
- Você, sou eu?? – Revidei com outra pergunta.
- Sim, sou eu. Ele respondeu harmonicamente. – Ainda bem que sou criança, independente, posso brincar o dia todo, quero ser assim para sempre.
Esbocei um sorriso fechado. Era melhor manter a mente dele limitada sobre o mundo, tão novo, e inocente, queria experimentar novamente a minha infância.
- Carl, cadê você? Gritou uma voz masculina.
- Estou aqui! – Respondeu o ''eu'' do passado.
Veio se aproximando um homem alto, magro, com um boné sobre a cabeça, uma camiseta branca, encardida, e calça verde, acompanhado por um par de tênis, segurando duas raquetes nas mãos.
- Encontrou a bola? – Ele pousou a mão sobre o ombro do garoto, em pouco tempo recobrei a consciência.
- Sim, papai. Ele que achou. – O garoto apontou o dedo para mim.
- Obrigado, senhor. Nós apertamos as mãos – Me chamo Charles, esse é o meu filho Carl Júnior.
- Prazer em conhece-los. Sou Carl. Respondia com um pouco de humor na voz.
- Que incrível. Tá vendo filho, você não é o único Carl que existe nesse mundo. O pai agachou, bagunçando os cabelos do Carl Jr.
- Que legal, mas, ele é velho, e eu não. Então, somos diferentes. Retrucou Carl, um tanto sério.
- Filho, não pode falar uma coisa dessas para um senhor. Pede desculpas já. Reprimiu o pai.
- Não se preocupe. Novamente me agachei diante do Carl Jr. – Você é independente, pode brincar todos os dias, não vai ser uma criança para sempre, mas, poderá se divertir muito com o seu pai.
Ele sorriu e olhou para o seu pai. Ajeitei a minha postura, segurei o gemido na garganta, pôs uma das mãos nas costas, exatamente na coluna, sem que eles percebam.
- Muito obrigado, senhor Carl. Tenha um ótimo dia. Vamos filho ?
- Sim, vamos.
- Bora, dessa vez, vou jogar mais fraco para você.
Um pouco distante do cercado, o garoto chamou o meu nome, me virei na direção dele novamente.
- O senhor sabe jogar tênis? Perguntou-o.
- Infelizmente não. Mas, posso ter o privilégio de te ver jogando? Falei
- Sim, sim! Terá um campeonato nesse sábado, o senhor pode ir se quiser, vai acontecer na quadra, na área esportiva da cidade.
- Irei, vai ser que horas?
- Vai começar 13 horas.
- Certo, irei comparecer.
Eles retornaram ao jogo, e eu á porta. Antes de eu bater, ela se abriu, revelando uma mulher corpulenta, de cabelos curtos, pretos, e lisos, trajando um vestido com desenhos de flores coloridas, que chega os joelhos, expondo sua pele morena, e aveludada, que me deu vontade de tocá-las.
- Olá, Carl. Ele me recepcionou com um belo sorriso.
- Oi, Rachel. Respondi com certa dificuldade, senti saudades de dizer ''amor'' ou invés o nome dela.
- Entre! Ela abriu mais a porta, me deixando passar.
- Com licença! Entrei, e me deparei com uma sala grande, com móveis deslumbrantes, tudo aquilo não tinha um fio de sujeira. O cheiro de produtos de limpeza invadiu as minhas narinas, em conjunto com o ar refrescando os meus pulmões.
- Pode se sentar. Ela indica o sofá, diante de uma grande televisão, acoplada na parede.
- Você está lindo, hein. Como sempre. Ela continuou com o sorriso encantador.
- Estou sempre tentando manter a minha aparência como antes. Fiquei sem jeito.
- Entendo. Vou buscar o chá, espera um minuto. Ela foi para á cozinha.
Eu olhei para as costas dela, ergui a mão, que permanece vago no ar, a tristeza desabada em mim, espontaneamente. Cerro as pálpebras, e balanço a cabeça, seguro a bengala com as duas mãos.
Depois de alguns minutos ela aparece, me entregando uma xícara de café. Sem a intenção, nossos dedos se tocaram, e a gente ficou se olhando por um longo tempo. Até uma voz do bebê chorando vindo da TV, nos despertou imediato, depois percebi que havia sentado no controle, á retirei.
- Me desculpa, sempre esqueço o controle ai. Ela á tomou de mim, gentilmente.
- Não se preocupe. Retruquei.
Sentados, ficamos assistindo uma novela mexicana, que ela tanta ama. Lembrei do tempo que passávamos na frente da televisão, abraçados, e deitados sobre o sofá.
- Você está aqui, porque queria te ver. Ela pousou a xícara na mesinha no centro da sala. – Fico feliz, em saber que está bem, Carl.
- Eu também estou muito feliz. Deixei a xícara vazia na mesinha.
- Mas, tenho uma coisa para te contar, Carl. Ela olhou as próprias mãos esfregando uma na outra.
Será que ela vai dizer o que estou pensando?
Não consigo controlar os batimentos cardíacos do meu coração, vou ter um ataque ali mesmo?
- Depois de termos nos casados, e tudo mais. Confesso que fui ileal com você. Ela respirou profundamente, antes de prosseguir: - Se lembra daquele vizinho que ia para a nossa casa resolver problemas domésticos?
Assenti a cabeça.
- Teve um certo dia, que não aguentei quando estávamos á sós, enquanto você trabalhava. No entanto, fizemos amor. Depois disso, continuamos escondidos. Até que pedi divórcio no nosso casamento.
Apertei os punhos sobre as pernas, o meu semblante foi habitado pela seriedade.
- Continue! Falei.
- Era só isso mesmo que eu queria falar, mas, não tive coragem em lhe dizer o motivo da nossa separação. Simplesmente aconteceu tão de repente, não queria te magoar. Ela resolveu não olhar para mim.
Me magoar? Passei três anos sofrendo pela sua perda, ligando todos os dias para o seu celular, sem receber um telefonema, sem saber a sua condição. E ela não queria me magoar?
Mas alguma coisa me prendeu naquele sofá. Segurei uma das mãos dela, ela voltou olhar para mim.
- Isso não é culpa sua. Eu sabia que não era uma melhor pessoa para a sua vida. Respondi com a voz rouca.
- Isso não é verdade, eu te amava muito, Carl. Acredita em mim. Mesmo, eu e ele passando noites juntos na mesma cama, não consigo tirar você da minha cabeça. Ela falou tudo aquilo com a voz embargada.
Então, eles ainda estão juntos.
- Mas, hoje percebi que estou vivendo uma vida melhor. Consigo ter tudo o que eu quero. Sou muito feliz, Carl. Ela recolheu a mão, os meus dedos tocaram no assento do sofá.
- Fico feliz por saber que você está bem, Rachel. E que não vai ter mais dificuldade, á qual passávamos juntos. Olhei para o tapete vermelho no chão.
- Mas, ainda sinto á sua falta. E cheguei á uma decisão, com o meu futuro marido. Ela olhou para mim, vi uma lágrima escorrendo no canto de seu rosto. – Vou morar em outro lugar, que seja longe de você. Assim será fácil resolvermos essa nossa situação, e recomeça a vida.
Quando ela falou isso, fiquei como se eu estivesse petrificado, boquiaberto, fitando-a.
- Então, você quer me esquecer? Indaguei.
- Sim, Carl. Quero esquecer o que passamos juntos. Mas saiba, que seremos bons amigos, irei visita-lo de vez em quando. Ela respondeu com tanta calmaria, que eu estava gritando de ódio por dentro.
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Cartas ao meu grande amor
RomanceCarl é um homem de cinquenta anos que revê sua história, desde os amores de juventude até sua paixão por Rachel, filha única de uma abastada família norte-americana. Alicerçada por uma amizade, erguida em fortes laços de paixão, o amor dos dois amea...