Prólogo

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Quem você ama?

É uma pergunta que qualquer um deve ser capaz de responder. Uma pergunta que define uma vida, cria um futuro, guia a maioria dos minutos do dia das pessoas. Simples, elegante, envolvente.

Quem você ama?

Ele fez a pergunta, e senti a resposta no peso do cinturão do meu uniforme, nos confins constritivos do meu colete à prova de balas, no brim justo do meu quepe, puxado por cima da testa. Baixei a mão lentamente, meus dedos raspando no alto da Sig Sauer no coldre em minha cintura.

ー Quem você ama? ー ele gritou novamente, agora mais alto, mais insistente.

Meus dedos passaram além da arma padrão da polícia, encontrando a presilha de couro negro que mantinha o cinto preso em minha cintura. O velcro fez um barulho alto quando soltei o primeiro anel, depois o segundo, o terceiro, o quarto. Soltei também a fivela de metal e o cinturão, completo com a arma, o taser, e o cassetete desmontável caiu da minha cintura e ficou ali pendurado entre nós.

ー Preciso fazer isso ー sussurrei, um último apelo à razão para ele me entender.

Ele apenas lubrificou os lábios e desviou o olhar.

ー Não precisa.

ー Pouco demais, tarde demais.

Ele me encarou com desdém, eu sentia.

ー Onde está Hyunjin? O que você fez? ー a preocupação com minha companheira de trabalho era notável. Eu gostava de trabalhar com ela.

ー O cinto. Na mesa. Agora.

ー Não.

ー A ARMA. Na mesa. AGORA! Você já fez, não tem volta, apenas faça o que eu mando.

Em resposta, deixei a postura mais evidente, erguendo os ombros ali no meio da sala, o cinturão ainda pendurado em minha mão esquerda. Seis anos da minha vida, patrulhando as estradas da cidade, jurando defender e proteger. Eu tinha o treinamento e a experiência do meu lado.

Eu tinha vontade de pegar a arma. Ir adiante sem hesitar, pegar a Sig Sauer e começar a atirar. Atirar na cara daquele Capitão desgraçado que me tratava diferente apenas por ter uma aliança no anelar esquerdo. E, especificamente, por usar com um de seus melhores detetives. Homem.

A Sig Sauer estava no coldre em um ângulo estranho, isso me custaria segundos preciosos e uma vida ao lado do meu marido. Ele possuía mais experiência e seria mais rápido. Estava me olhando, esperando qualquer movimento súbito; me conhecia. Se eu errasse uma palavra, a punição viria de forma firme e terrível.

Quem você ama?

Ele estava certo. Era isso que importava no fim. Quem você amava e o quanto arriscaria por essas pessoas?

ー A ARMA! ー ele bradou. ー Agora, mas que droga! Está surdo?!

Pensei em meu marido que estava comigo por seis anos, no cheiro do cabelo dele, na sensação dos braços ao redor do meu pescoço, do som da voz dele quando eu deitava ao seu lado para dormir todas as noites. "Eu te amo, Seo", ele sempre sussurrava.

Também te amo, meu bem. Eu te amo.

O braço dele se moveu, primeiro hesitante na direção do cinturão pendurado, procurando a arma no coldre.

Uma última chance...

Pensei nos olhos do meu marido. A duração de uma batida do coração.

Quem você ama?

Tomei uma decisão. Coloquei o cinturão sobre a mesa dele onde jazia uma placa cujo nome "Capitão Jeong" estava bordado por letras douradas e bonitas. Lhe encarei a última vez nos olhos, aquelas pupilas opacas que, por um lado, agradecia por esse meu ato.

Saí da sala. A farda parecia estar mais pesada em meu corpo, passei na minha mesa apenas para deixar, em cima da madeira, o distintivo com o nome "John Seo" bordado ali.

A mesa de Jaehyun estava vazia, e no estacionamento pude perceber que este me esperava parado ao lado de minha moto, com os olhos avermelhados e um embargo na garganta.

ー Não vamos falar disso agora, Jae.

E, enquanto pegava meu capacete, pude o ver assentir e deixar um breve selar nos meus lábios, tendo de se levantar levemente.

Eu te amo, Seo. Confio nas suas decisões.

E então o deixei no estacionamento, voltando para casa em cima das duas rodas que pareciam demorar séculos para girar no asfalto.

Quem você ama?

A verdade, era que eu o amava. E essa era a única certeza que eu tinha na vida.

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