Capítulo 2 - O Começo do Amor

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Eu conheci o Endry durante o primeiro ano da faculdade de engenharia elétrica, dois anos antes da minha partida para os Estados Unidos. Naquela época eram poucos os jovens que, em meio à crise e miséria que o país enfrentava, tinham condições e coragem de frequentar a universidade. A busca pela fuga daquela situação era o grande objetivo da maioria da população.

A universidade estadual localizada na capital do país se encontrava em péssimas condições, os computadores eram muito antigos, não havia mais manutenção das instalações físicas e elétricas, paredes descascadas, telhados caindo, salas abandonadas, salários dos professores reduzidos em mais de cinquenta por cento. Essa era a realidade que eu havia presenciado logo naqueles primeiros dias de aula. Eu morava perto da universidade, pegava o primeiro ônibus todas as manhãs.

Eu tinha apenas dezessete anos e já havia dentro de mim a esperança de ser alguém na vida, algum dia, em algum lugar. Em meio à toda aquela escuridão, enfim eu pude ver a luz do amor brilhar pela primeira vez dentro do meu coração.

Depois de muito tempo de tempestade e falta de motivos para seguir em frente, um jovem com o sorriso que acalentou minha alma entrou pela porta da sala de aula. Aconteceu uma semana depois do início do ano letivo. Meu encantamento foi imediato. Como se fosse mágica, ele me notou, e senti até arrepio. Não sei se há alguma explicação para sentirmos empatia por alguém quando a vemos de imediato.

Certo dia Endry sentou-se perto de mim. Eu nunca me esqueço daquela semana difícil. Eu chegava à aula com o estômago vazio quase todas as manhãs, ainda sonhando em ser alguém, mesmo sem vislumbrar uma luz no fim daquele túnel obscuro. Mas enxergar o rosto daquele rapaz todos os dias era a verdadeira recompensa.

Sempre que sobravam alguns centavos, meu pobre pai os dava a mim, para que eu pudesse comprar pão com geleia e chá (era o que havia) na cantina da universidade durante o intervalo das aulas. Naquela ocasião, depois de aguardar na fila da cantina, peguei meu lanche e, como se estivesse distraída, esbarrei no Endry. Não teve jeito: meu copo de chá virou no colo dele, que ficou com a camisa manchada.

— Oh! Me desculpe. Agora já era. Fiquei sem chá e dinheiro, e não tenho mais dinheiro hoje pra comprar outro copinho – eu disse, mais preocupada por ter perdido meu café da manhã do que com a roupa dele que eu havia acabado de sujar.

— Rosa Maria, não se preocupe. Não foi nada. Eu divido meu copo de chá com você – ele respondeu com delicadeza. Meu coração acelerou ao ouvi-lo chamar meu nome.

— Endry, como eu sou indelicada. Sua camisa está toda suja de chá. Me desculpe.

— Já disse que não foi nada. Depois eu lavo no banheiro, ou deixo pra lavar em casa. – Ele me livrou da culpa mais uma vez.

— Eu agradeço, mas o copo de chá é seu e não seria justo que ficasse para mim. Eu como só o pão com geleia mesmo. Não é como as geleias de antigamente, mas é o que temos.

— Não seja por isso. Podemos dividir nosso lanche. Gostaria de ir comigo à mesa do pátio para partilhamos o pão com geleia e o chá?

— Seria muito legal. Vamos – eu respondi, sorrindo.

***

Endry e eu nos sentamos à mesa do pátio e começamos a conversar entre os goles de chá e mordidas no pão.

A partir daquele momento passamos a conversar todos os dias, Endry sempre se sentava ao meu lado durante as aulas. Naquele momento nós nem sequer imaginávamos que a realidade iria culminar na população comendo carne de cachorro e de rato pra não morrer de fome.

Razão de Te AmarWhere stories live. Discover now