Recebi uma carta duas semanas antes. Era do Príncipe. Era uma honra enorme receber de um remetente tão ilustre. Eu estava sentada na poltrona da escrivaninha na biblioteca, separando a correspondência que eu havia depositado despreocupadamente ali pela manhã. Estava com uma xícara de chá de ervas em uma mão e passava os envelopes despreocupadamente. A maioria eram cartas com relatórios que eu deveria transcrever para os registros. Uma ou outra carta de algum amigo distante e então... Lá estava o envelope dourado.
Engasguei com o chá e depois de uma tosse, abri o envelope com as mãos trêmulas. Eu era uma Cronista, mas muita gente me chamava de bibliotecária. Eu cuidava de registrar e transcrever os relatos da Guerra ao redor das colônias. Haviam outros como eu, mas receber cartas tão diretas era raro. Havia um bilhete escrito com letras douradas e muito bem grafadas.
"Receba os visitantes que virão pela divisa norte. Eles deverão se recuperar aí antes de prosseguirem viagem, depois ajude-os em sua missão."
Na divisa norte, subindo o rio, ficava uma das bases do General. Estávamos tão próximos de uma base inimiga porque não podíamos deixar que nossas fronteiras fossem invadidas. Todo o território que havia sido conquistado pelo exército do poderoso Pai era vigiado por pequenas bases como a nossa. Me pus em pé em um salto e corri para a administração.
Tínhamos um alojamento com quartos para rapazes e moças separadamente, uma grande sala de jantar, salas de convivência, um salão de reuniões, a biblioteca onde eu trabalhava, a área administrativa, a enfermaria, uma recepção, áreas de treinamento, academia, jardins, pomares... Éramos uma base bem completa.
A biblioteca ficava na ala leste. Era enorme, com estantes que iam do chão ao teto, que eu acessava com escadas próprias. Haviam milhares de livros ali, em dezenas de grandes estantes que comportavam todos os registros importantes da Guerra nos últimos milênios. Cartas chegavam desde os tempos mais remotos. A biblioteca era o setor que mais sofria expansões ao longo dos séculos. Eu trabalhava ali desde que tinha 13 anos, quando me ofereci para ser a auxiliar do Cronista anterior, que já era idoso. Ele descansou pouco antes de eu completar meu décimo oitavo aniversário, quando assumi o posto. Eu já conhecia todas as seções da biblioteca e cada livro me era familiar. Eu conhecia todo o nosso acervo. O escritório em que eu transcrevia os relatos, ficava em um mezanino no meio da biblioteca. Uma escada larga de madeira e corrimões de ferro decorado levavam até meu escritório.
Com a carta dourada em mãos, atravessei alguns corredores e áreas em que eu via alguns dos moradores de nossa base. Eu os cumprimentava com um aceno rápido e um grande sorriso, quase correndo de felicidade. Ao chegar à administração, dei duas batidinhas rápidas e abri a porta.
- Olha isso – falei erguendo a carta.
Rachel era a líder da base. Ela tinha os cabelos curtos e ondulados, que exibia orgulhosamente penteados para trás, completamente brancos. Ela havia completado sessenta e oito anos na semana anterior. O vaso de flores frescas que havíamos colhido para ela, estava começando a deixar algumas pétalas sobre sua mesa. Ela estava lendo alguns papéis quando entrei. Olhou por cima dos óculos e seus olhos brilharam.
- Lara! – ele se pôs em pé – Faz anos que não vejo um desses. Para quem estava endereçado?
- Para mim – falei quase sem fôlego.
Suas sobrancelhas arquearam. Senti parte do ânimo esmaecer.
- O que foi?
- Por que não se senta?
- O que isso quer dizer? – perguntei sentada.
- Nada ruim – ela disse com um sorriso – Mas acredito que isso indique mudanças. Para você, querida.
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A Guerra dos Mundos - Até o Fim (Em Revisão)
SpiritualA Guerra iniciada há tanto tempo continua em um avanço rápido. Os dois exércitos estão quase completamente definidos, e apenas um sairá vencedor. Cada pessoa foi convocada a apresentar sua escolha e à qual senhor irá servir. Lara havia escolhido, de...