Impossível descrever o tamanho desespero e agonia ao ver aquele carpete coberto com aquele líquido vermelho derramado pelo meu tio, pedi que ele desse um pouco de suco ao Jack mas pelo visto essa não foi uma ideia muito boa. Mesmo sendo clemente nas horas úteis, ele é inábil quando o assunto é educar ou dar comida para crianças de 3 anos.
- Está dando mais trabalho do que deveria. -digo enquanto tiro a criança dos braços do meu tio.
- E só tem 3 anos. -ele responde passando a mão pela sua camisa suja, o que faz com que o suco se espalhe sobre ela.
- Eu não estava falando do Jack. -ele me olha e sorri, eu retribuo o sorriso. - Vou subir para limpa-lo, pode dá um jeitinho nisso para mim? -digo me referindo a toda aquela sujeira.
- Sim, eu só preciso achar o meu celular que está tocando. -então esse era o som irritante que o meu cérebro recusava aceitar.
Dou de ombros e subo as escadas correndo para limpar aquela criança, não podemos perder essa roupa também, já é a terceira só nesta semana. Os outros casos se resumem ao crescimento e a lavagem errada, queria que pelo menos o papai tivesse aqui, ele tornava serviços como lavar roupas tão divertidos. Assim que entro no banheiro trato logo de encher a banheira, tiro as roupas de Jack que está calado e estranho, apenas me olha sem esboçar nenhuma reação. Coloco ele na água que está um pouco fria mas a minha pressa faz com que eu ignore isso, ele demora um pouco a se adaptar até que começam as brincadeiras com a água.
- Calma garotão, quem precisa de banho aqui é você. -brinco e ele sorri.
Depois do banho, preparo outro alimento para o garoto antes de colocá-lo na cama. As coisas vem sendo fáceis comparado com os primeiros meses. Após a morte "repentina" do papai há quase 4 anos a mamãe enlouqueceu, pequenos detalhes como um sapato no lugar errado ou um sal a mais na comida fazia ela surta e tudo parecia ruim o tempo todo. Eu tentava amenizar as coisas pois sabia que a gravidez seria difícil, e foi. Com 6 meses o papai morreu, e com sete o meu irmão lutou para vir ao mundo de todas as maneiras possíveis, eu sabia que ela não estava bem e ainda assim não podia ajudar em nada. Quando Jack completou dois anos ela fugiu de casa, deixou uma carta falando sobre um homem russo que tinha dado a ela "uma nova chance".
"Eu sei que me vê como uma mãe ruim mas eu dei tudo de mim até hoje e no final não foi o suficiente!"
Dou um beijo no Jack e puxo o lençol até a altura do seu ombro, apago as luzes antes de fechar a porta atrás de mim e escuto a campainha tocar.
- Tio Bobby, atende logo essa porta, o Jack vai acordar desse jeito! -grito enquanto desço as escadas mas percebo que estou sozinha no cômodo. Vou em direção da porta é quando abro me deparo com o moreno alto carregando duas sacolas nas mãos.
- Que demora para abrir essa porta! -ele reclama e eu dou lugar para ele entrar.
- Eu estava colocando o Jack para dormir, seu idiota. Você é muito impaciente. - retruco e cruzo os braços depois de fechar a porta. - O que faz aqui?
- Que tal começar com um "Oi amigo, como foi o seu dia? Que bom que veio até a minha casa me fazer companhia e alegrar a minha vida sem graça!" - ele faz gestos estranho enquanto tenta fazer uma voz de garota.
- Deixa de drama Louis e me diz logo o que tem aí? - aponto para as sacolas que ele jogou no sofá e me aproximo para olhar.
- Trouxe um lanche para ti. -ele abre o outro saco e pega um hambúrguer de dentro. -O Bobby saiu? -diz antes de morder o lanche.
- Acho que sim, lembro-me de ter pedido pra ele limpar o carpete. - olho para o local e está limpo, o que eu considero um avanço se tratando do meu tio. - Pelo menos ele limpou a sujeira dessa vez. - sento ao lado do meu amigo e pego o controle para mudar o programa de TV.
- A carta já chegou? - ele me olha entusiasmado.
- Não Lou, não é assim que funciona, e mesmo que chegue ainda não sei se vou aceitar. -digo, esparramando-me no sofá.
- Qual é, você sonhou com isso a vida toda. - ele faz uma cara feia antes de tomar gole de refri.
- Eu tenho duas crianças para cuidar, tenho que ser uma mãe responsável. - digo em tom de brincadeira e ele ri. -Mas se acontecer, eu prometo que vou dar meu jeito.
- Ah mas você vai! Nem que eu precise virar babá de uma criancinha de três e de um neném bêbado de 48. -nós dois rimos.
O Louis não demorou muito, antes das dez ele já tinha se despedido e eu tive que voltar ao tédio de ver aquela TV chata que só passava programas de Miss e vendas de produtos estranhos. Aos 19 anos não se tem muito o que fazer na vida a não ser arrumar a casa, estudar e procurar um emprego. Sinceramente, não posso reclamar, ainda recebemos uma pensão que meu tio conseguiu por conta de um acidente de trabalho que as vezes dá para sustentar a casa e eu tenho minhas poucas economias, então fome eu não passo. Juntava dinheiro para a Faculdade mas comecei a gastar quando o Jack pegou uma gripe dois meses atrás e o plano de saúde me deixou na mão, as coisas vão ficar difíceis e se eu não conseguir esse desconto na bolsa será um verdadeiro inferno. Preciso de um emprego, não sei como vou encaixar um emprego na vida que eu levo mas eu preciso! Por Jack, pelo tio Bobby e por mim.

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