Infinito

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Em meu espaço não há tempo.

Não há Sol, Lua ou estrelas.

Não há fome, sede ou sono.

Havia eu, você e o nada que passou a ser tudo.

Você ficou ao meu lado. Era curioso à respeito de tudo, e em nenhum momento neguei-me a lhe sanar dúvidas.

Era pura energia, seu jeito de falar, sua forma de gesticular, ou os trejeitos de seu rosto. Tocava-me nas mãos ou braços o tempo todo, como se para ter certeza de que eu era real e de que você não estava enlouquecendo.

No meu espaço não havia tempo, ainda assim eu o senti passar. Porque eu tive tempo de observar você, de decorar, de decifrar. E quando chegou seu momento de partir, eu senti que passou rápido demais.

Mesmo que em termos humanos, tenha-se passado meses.

— Então chegou minha hora? — você questionou naquele tom de tristeza — se bem que é estranho dizer isso... porque tipo... eu morri?

— Não acho que seja estranho — comentei — mas sim, chegou o momento.

— Você não vai dizer que já está com saudade? — indagou-me.

— Não tenho sentimentos humanos, já lhe disse isso.

— Cara, não precisa ser tão frio — riu, cabisbaixo — eu vou sentir a sua!

— Você não vai lembrar de mim, te expliquei isso — afirmei — eu sou apenas um estágio da sua triagem.

— E você... — começou receoso — vai lembrar de mim?

Encarando seus olhos eu vi tudo o que não havia no meu espaço. Inúmeros infinitos de possibilidades, uns menores e outros maiores. Todas as circunstâncias que o levaram até ali e o que o faria seguir adiante. Vi a fagulha de esperança em seu íntimo, lutando com todo ardor de quem se esforça para sobreviver; contudo, você queria uma resposta que eu não deveria lhe dar. Todavia eu lhe dei, mesmo não devendo:

— Sempre.

Te vi parar em frente a porta que te levaria embora. Você teria outra vida, outra chance de recomeçar. Teria uma nova família, novos amigos e novos amores. Novos sentimentos e direções. E você ainda teimava em me encarar com o sorriso aguado e os olhos marejados, que nem deveriam existir nesse plano.

— Vai me dizer seu nome agora, dona Morte?

— Eu não sou a morte — repeti pela centésima vez — sou um mensageiro.

— Posso então ter a honra de me despedir de forma correta, senhor mensageiro? — insistiu com a voz marejada.

— Meu nome é Katsuki — lhe respondi. E me peguei surpreso quando te senti me abraçar. Um toque quente demais para o espaço que estávamos inseridos.

— Vou sentir saudade, Katsuki. — Confessou em um sussurro. — Você diz que não vou lembrar de você, mas eu tenho certeza de que vou. — me apertando um pouco mais, você fungou em meu pescoço — você é bonito demais para que eu possa me esquecer do seu rosto.

Eu não disse nada, assim como não sabia como retribuir ao gesto. Mas você, Eijirou, não pareceu se incomodar, se afastando enquanto fungava e virando as costas para mim. Colocando a mão na maçaneta da porta, olhou por cima do ombro, rápido o suficiente para ver um sorriso, mesmo que ínfimo, cruzar meu rosto.

— Adeus, Eijirou.

No meu espaço não havia tempo.

O que antes era nada, agora era tudo.

Não era mais vazio, porque corria algo que não sabia que podia sentir.

Eu te vi reencarnar e viver mais uma vez, e me peguei tendo o mesmo desejo egoísta que presenciei em outros humanos.

Eu desejava a sua presença, Eijirou.

E muitos anos depois, quando chegou a hora de minha jornada, eu busquei sua alma novamente. Dessa vez você teve uma longa vida, foi feliz, foi pleno. Eu encarei mais uma vez seus olhos repletos de milhares de infinitos, enquanto você me sorriu como se anos não houvessem passado.

— Katsuki — meu nome soou perfeito em sua voz. Como se sempre fosse para ser.

— Senti saudade, Eijirou.

O nada agora era tudo.

Por tempo determinado, porque você sempre voltaria à Terra e eu aprendi o que humanos chamam de amor.



Notas do autor:
that's all folks! ♥

(In)FinitosWhere stories live. Discover now