Two.

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“ When the vision you have gets blurry, you don't have to worry, I'll be your eyes ”
— Union J: Carry You ♡

Ceci 

Eu ainda lembro do meu primeiro desfile, anos atrás. Estava tão nervosa que evitei tocar qualquer objeto frágil que estivesse perto de mim. Ele iria definir o resto da minha vida, sendo perfeito ou um total desastre. Algumas das minhas motivações para não desistir de tudo e voltar pra casa, derrotada: meu pai. Benjamin Martinez garantiu que não me deixaria sozinha nunca. Promessa que se cumpria desde o dia em que eu nasci, 27 anos atrás. Lá estava ele na platéia, ansioso e tão nervoso quanto eu. E claro, a loira de olhos verdes que me fazia a garota mais feliz do mundo. Emma. Ela estava do lado dele. Eles cochichavam alguma coisa por conta do barulho. A primeira modelo foi anunciada e meu coração disparou. Lembro que a sensação de querer vomitar tomou conta de mim naquele instante. E a próxima foi anunciada, depois mais outra e outra, até que a minha vez chegou. Respirei fundo e me dirigi até a passarela. 
Consigo lembrar de ver Emma e papai na multidão orgulhosos, batendo palmas sem parar e gritando meu nome. Eles ficaram de pé até que eu saísse de lá e me senti a pessoa mais sortuda do mundo. As pessoas mais importantes da minha vida me esperavam no camarim, ambos com um buquê de flores, e vieram me abraçar fortemente. Comemoramos a chuva de elogios e propostas que eu recebi depois do desfile saindo pra jantar fora. Isis e Lorena foram com a gente e quando cheguei lá Charlie esperava todo mundo com um sorriso orgulhoso. Enquanto pedíamos pizza de calabresa — Miss Americana das massas segundo Emma — ele contou que era surpresa, que ele tinha chegado a tempo de ver o desfile e só tinha elogios pra mim. 

Aquela foi a noite mais feliz de toda a minha vida e meu pai estava presente nela. Como sempre esteve em todos os momentos da minha vida. Agora eu estou na sala de espera de um hospital, rezando para que ele fique bem. Como isso foi acontecer? Ele sempre foi tão forte. Lembro de quando era pequena sempre adoecer ao mesmo tempo que Charlie, mas ele nunca adoecia. Eu queria ser mais como ele. Foi enquanto pensava nisso que ouvi alguém sentar do meu lado. Emma. Quando a encarei, tudo o que ela fez foi me abraçar e ficar em silêncio. Meu coração se aliviou um pouco. Se ela estava ali, então tudo ficaria bem, certo? Certo. Estava me desesperando atoa.
— Como sabia que eu estava aqui? — perguntei. Ela abriu a boca pra responder, mas o médico interrompeu, vindo até nós em passos lentos. Meu coração disparou.
— Sinto muito. — ele começou. — Fizemos de tudo, mas ele não resistiu. Sinto muito mesmo... — ele começou a falar sobre a burocracia que eu teria de enfrentar, mas eu parei de ouvir no “ ele não resistiu ”. O ar faltou em meus pulmões, meu peito ardia, pesava e eu me desesperei imediatamente. Desabei em lágrimas, minha cabeça a mil. Meu pai morreu. Não consigo e nem quero acreditar. Meu corpo parecia pesado demais e só consigo lembrar do choro desesperado de Emma, ela pedindo para que eu acordasse, voltasse pra ela. Mas eu não consegui achar o caminho de volta. Tudo ficou escuro. 

Dia seguinte

Quando acordei horas atrás, Emma havia cuidado de tudo. Meu pai teria um enterro simples, mas digno de um homem como ele. Ava garantiu que os nossos parentes distantes estivessem presente, grande maioria ficou em hotéis, enquanto outros resolveram alugar apartamento para que pudessem ficar mais tempo. Faltava pouco para me despedir oficialmente dele, mas eu não estava pronta. Nunca estaria. Lá no fundo, eu torcia para que tudo não passasse de um pesadelo ruim. Ele iria fazer panquecas com carinha feliz especialmente pra mim no café da manhã, como se eu ainda tivesse 7 anos. E iríamos conversar sobre coisas completamente aleatórias, dar risada e depois, lavar a louça juntos.  

Emma bateu no meu quarto perguntando se eu estava pronta. Fiz que sim, ela apenas disse que estaria me esperando lá embaixo e saiu. Fiquei sozinha. Eu não fazia ideia do quanto já tinha chorado desde que abri os olhos, horas atrás. Doía pensar em todas as coisas que meu pai iria perder. A primeira coisa que passou pela minha cabeça foi: ele nunca vai ver os netos. Meus filhos não vão conhecê-lo, ou passar o fim de semana com ele, ou chamá-lo de avô. Eu nunca vou poder pedir para ele cuidar dos meus filhos enquanto eu estiver ocupada com alguma coisa. Eu nunca vou poder dizer “ lembra de quando eles cabiam no meu colo? Agora já estão estudando e eu tenho que ajudar eles com a lição de casa. Como o tempo passa rápido ”. E ele daria risada, diria que está orgulhoso de mim, das minhas conquistas. E iria agradecer, eu perguntaria pelo quê e ele responderia “ por existir e por me fazer o pai e avô mais feliz do mundo ”.

cruel summer ²Onde histórias criam vida. Descubra agora