𝐑.𝐈.𝐏 𝟐 𝐌𝐘 𝐘𝐎𝐔𝐓𝐇, 𝑠𝑝𝑖𝑛-𝑜𝑓𝑓

𝗣𝗥𝗢𝗟𝗢𝗚𝗢

JÁ PASSAVA DA MEIA-NOITE QUANDO O CARRO CONVERSÍVEL DE JAMES STONEN estacionou em frente a casa grande de janelas cobertas por cortinas coloridas e Faith Norton deitou-se sobre o banco do passageiro para, mais uma vez, usar a luz de seu telefone para iluminar o rosto inchado do garoto latino, que tinha um sorriso no rosto, como se ouvisse sem parar uma piada que só ele conhecia. Faith não estava rindo.

- Não tem graça, Valdez. - A morena disse, tocando o hematoma em seu olho com o indicador fazendo com que o garoto soltasse um "au" agudo. - O que vai dizer aos seus pais?

Leo já havia ouvido a mesma pergunta tantas vezes aquela noite e já havia dado tantas respostas diferentes, respostas engraçadas, evasivas, respostas que não eram de fato uma resposta, que, agora, diante de sua casa, quando realmente precisava de uma, não fazia ideia do que dizer. O latino deu de ombros e Faith assentiu negativamente com a cabeça, bagunçando os cabelos do moreno enquanto James e Leo se despediam com algum tipo desajeitado de aperto de mãos-soquinho-tapa.

A casa dos Valdez era conhecida na vizinhança por seu jardim bem cuidado, decoração singular e pela música, que sempre tocava, principalmente durante a noite, depois do jantar, quando seus pais dançavam juntos na sala de estar até que o sono e o cansaço os vencessem e os fizessem subir para descansar. Contudo, naquela noite, não havia música na casa da família cubana, que estranhamente tinha as luzes da varanda ainda acessas, e Leo sabia bem o porquê. Em meio as várias espécies de plantas e pequenas árvores, uma mulher de idade, de cabelos escuros e óculos fundos, tinha as mãos unidas uma a outra apertando o que ele reconhecia como o terço de pérolas de Santa Teresita, e os olhos castanhos focados no outro lado da rua, até que o encontraram, surgindo da parte escura do jardim. Imediatamente, Leo abriu um sorriso largo e andou em sua direção.

- Papito! - Ela exclamou, com alívio na voz e o abraçou. Leo beijou sua testa e a envolveu com um braço só. - Por qué llegaste tan tarde?

- Estava com meus amigos, mama. - Respondeu o garoto, pousando o queixo no topo da cabeça da mulher baixinha.

De dentro da casa, o som dos passos pesados de um homem que havia trabalhado o dia inteiro se aproximavam rápido, e Carlo Valdez surgiu na porta da frente com suas canecas cheias de chá pintadas uma com a Dama dos filmes da Disney e a outra com o Vagabundo. Assim que os olhos por trás dos oclinhos redondos o encontraram, o sorriso se destacou abaixo do bigode branco do patriarca da família. Carlo colou sua testa na do filho e acariciou seu cabelo antes de sentar-se ao lado da esposa, entregando a ela uma xícara de chá.

- Não seja tão protetora, mi amor - Disse o homem, que havia ouvido a conversa. - Leo estava com os amigos, Max ligou agora pouco, também demorou a chegar em casa. Leo devia estar com a namorada, por isso atrasou, não é, mi hijo?

"Ligaram para o Max?"

Leo teve vontade de perguntar, mas não o fez. O garoto apenas sorriu e confirmou, tagarelando sobre a reunião, tirando, é claro, a parte onde quebrava a janela de um garoto da escola com o taco que trazia em suas mãos. Tinha seus olhos presos às mãos da mãe, que seguravam tranquilas o chá.

Apesar de fazerem parecer assim, o Valdez sabia que o encontro de seus pais na varanda aquela hora não era mera casualidade. Ou sua mãe estar rezando o terço assim tão tarde. Eles estavam esperando que voltasse para casa. Estavam rezando para que estivesse consciente onde quer que estivesse, que estivesse vivo. Imediatamente, enquanto encarava as unhas curtas e pintadas de bege de sua mãe, Leo lembrou-se de como as mãos calmas tremiam nas de seu pai enquanto a mulher chorava ao lado de seu leito no hospital, implorando por um milagre, gaguejando e dizendo que não saberia viver seu su hijo. A lembrança ainda fazia seu estômago revirar e os lábios secarem, mas Leo estava acostumado a esconder toda e qualquer sensação de desconforto com a melhor máscara que já haviam inventado - seu sorriso.