Capítulo 1

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JANEIRO
Aeroporto de São Paulo
18:55

Eu não acreditaria que ficaria tão nervosa, e por isso eu e minhas malas estamos prontas desde as 17:00 da tarde. Eu não sou mais nenhuma adolescente nem nada, mas essa com certeza é a oportunidade da minha vida, ainda mal posso acreditar que consegui esse intercâmbio.

Sonho com isso desde os meus 12 anos quando via na TV o quão bonito era os Estados Unidos. Além disso, sempre considerei aprender outra língua e me tornar mais inteligente do que os meus colegas que jogavam papel no ventilador. Só que infelizmente esse sonho ficou congelado por muitos anos, e hoje, aos 23 anos eu percebi que está na hora de sair do freezer.

Me formei em Letras e mesmo após ouvir anos de críticas familiares sobre o quão pobre eu seria e pensar em qual ponte de são Paulo eu iria me estabelecer, hoje eu tenho uma vida estável e trabalho em uma editora não muito famosa, mas que me permite pagar minhas contas ao fim do mês.

Pense pelo lado positivo Alyssa, você venceu a opinião familiar e tem uma casa pra morar. Entretanto, pra mim ainda não era o suficiente.

Sempre sonhei com mais do que as circunstâncias podiam me oferecer, e isso nunca fez mal a ninguém, porém eu ainda não me sentia completa no emprego em que estava, e por isso estou aqui, com 5 malas no aeroporto partindo para uma nova aventura. Tenho certeza que irei me encontrar em Boston, eu posso sentir que se lá eu não tiver inspiração pra escrever um livro, eu não terei em mais lugar nenhum.

-Voo 424 partindo em 15 minutos para a cidade de Boston, Estados Unidos da América.

-É, a minha garotinha cresceu e vai me deixar pra sempre.

-Meu Deus pai, não seja tão dramático, eu só vou ficar um ano lá, já já eu voltarei pra ver o senhor. Não se esqueça de que não sou mais nenhuma garotinha, eu já tenho 23 anos e moro sozinha.

-Não vem com essa conversa de ser independente Alyssa, você ainda não consegue matar baratas e me liga ás 23:00 da noite para ir matá-las no seu apartamento.

-Isso é um caso a parte pai, e segundo o Ministério da Saúde, baratas podem causar doenças e eu posso ser levada a morte facilmente.

-Não vem com essa Lys, você precisa do seu pai. - Meu pai olha triste pro chão como se eu estivesse causando um grande vazio nele e isso por um segundo me fez pensar em desistir-. Na verdade, eu preciso de você.

-Eu também sinto falta da mamãe. Desde o acidente eu sei que estamos segurando a barra um do outro sozinhos, mas eu preciso seguir os meus sonhos pai, e sei que não irei conseguir realiza-los aqui. Prometo que ano que vem voltarei, e te ligarei sempre que puder. Além do mais, o senhor tem o Ruflles pra lhe fazer companhia.

-O Ruflles sim é fiel e nunca me abandona.

-Claro pai, ele é um cachorro.

-Senhores passageiros, o voo para Boston, Estados Unidos da América já irá sair em 5 minutos.

-Eu te amo pai, se cuida.

-Vai filha, também amo você e não quero que perca o voo. Sua mãe estaria muito orgulhosa. E ah! Cuidado com os garanhões nesse outro país, eu não tenho muito dinheiro, mas se alguém quiser chegar perto de você terá que pedir a minha permissão antes.

-Tudo bem pai. Vou ignorar o último comentário. Garanhões? jura? – respondo sorrindo comigo mesma e pensando no quanto sentirei falta do meu pai. Pego minhas malas e entro na sala de embarcação.

Vejo meu pai se despedindo com um sinal de adeus com as mãos e crio coragem pra embarcar nessa viagem.

Quando entro no avião vejo que minha poltrona está do lado de um homem não muito simpático e já imagino o quão longa será a minha viagem.

-Com licença, este é o meu lugar, poderia ocupar menos espaço?

-Como disse?- o homem me olha com olhar de desdém e percebo que ele não é tao velho quanto eu pensava, na verdade ele deveria ser apenas uns 4 anos mais velho que eu, mas isso não importava, porque de espírito ele com certeza já teria 40.

-Se o senhor não percebeu está ocupando praticamente os dois lugares. Seu refrigerante está no meu assento.

-E?

-Como assim e? para de ser otário ou eu jogo essa lata em você.

-Brasileiros, sempre tão ignorantes. Pode sentar senhorita, agora por favor, não me incomode mais com a sua presença pelas próximas horas. E passe um perfume melhor da próxima vez, você definitivamente não cheira bem. - Ele tira a lata do meu assento e se vira pro lado da janela do avião, como se nada tivesse acontecido.

Eu não podia estar acreditando no que estava ouvindo. Fora me subindo uma raiva tão grande, que eu não conseguia explicar com meras palavras. Quem ele pensava que era? Melhor do que eu só por estar com uma roupa de marca e um fone ridículo que com certeza custaria mais do que o meu salário?

Não importa, isso não iria estragar a minha viagem e com alegria eu não o veria novamente, eu só precisava aguentar por mais 9 horas.

Um ano [DEGUSTAÇÃO]Onde histórias criam vida. Descubra agora