O Senhor Satoshi observava contemplativo a imensa cápsula de vidro cheia de líquido amniótico à sua frente. Pensava na guerra. No quanto ela havia tomado do seu povo antigamente e no quanto ela toma agora, 128 anos depois, 15 quilômetros acima do seu laboratório subterrâneo. Satoshi nunca pensou que o seu povo, próspero em tecnologia, cheio de uma cultura de honra, tivesse que vivenciar mais uma vez algo que ele só ouvira falar nos livros de história. "A Guerra".
Ele sabia da rendição do Japão em 1945, depois dos ataques a Hiroshima e Nagasaki. De como as crianças que foram pegas no raio da bomba atômica tiveram suas peles descoladas de seus corpos lentamente até serem finalmente carbonizadas. Como mães, pais, irmãos, tios e tias morriam como moscas ao serem pegos de surpresa. Ele sabia dos períodos de fome sem um grão de arroz para comer, dos corpos que jaziam nas ruas, mortos por inanição. Sabia das doenças cancerosas que surgiram nos sobreviventes— a verdadeira marca do demônio, que reverberou em gerações e gerações futuras— décadas após a guerra.
Agora, os "Yankees" vieram novamente. Suas políticas, que implementavam a corrupção, destruíram seu próprio país e aniquilaram seus nativos. Esgotaram seus recursos tecnológicos e naturais e passaram a invadir outros países, com o pretexto de instaurar a "liberdade" e de "cobrar suas dívidas para com os países que tanto ajudaram e serviram ao longo desses anos".
Um a um os países invadidos foram sofrendo sua nova política ditatorial, sufocando e morrendo. Os que se recusavam a partilhar de tal generosidade eram rechaçados com uma amostra da severidade bélica, o poder enviado pelo deus deles para transformar as coisas em Seu nome. Logo, várias colônias estadunidenses se formaram ao longo do planeta.
E, previsíveis como a tempestade que se anuncia, os Estados Unidos chegaram também ao Japão, exigindo as terras, a tecnologia e as almas que Satoshi se recusaria a entregar.
Antigamente, os ancestrais do Senhor Satoshi haviam se rendido. E não há desonra em se render, se for para salvar a vida de milhares. Mas, dessa vez, os japoneses contra-atacariam com tecnologia. Dessa vez os papéis se inverteriam e tudo graças àquela criatura que repousava dentro da grande cápsula de vidro.
Um bip e um barulho metálico de portas automáticas se abrindo não foi o suficiente para tirar os olhos de Satoshi do ser que flutuava diante dele.
—Senhor Satoshi, desculpe-me incomodá-lo. — uma voz feminina ecoou suavemente na sala fria e iluminada por diversos monitores e pequenas luzes de botões —Trouxe o resultado dos testes biológicos efetuados na "arma", senhor.
—Por Favor, Senhorita Aiko, não o chame de "arma". Gosto de ver ele como um "Projeto". Ande, venha até aqui e observe-o por alguns instantes. Venha ver o que nós criamos.
Aiko andou vagarosamente, porém com firmeza, em direção à cápsula tubular. Seus sapatos de salto alto produzindo pequenos ecos à cada passada. Parou ao lado do Senhor Satoshi e também contemplou a criatura.
O Projeto era largo e acinzentado, aparentemente bípede e com características ambas de dinossauros e rinocerontes. Duas presas protuberavam de sua mandíbula superior e muitos espinhos projetavam-se de sua cabeça: na parte de cima, um espinho que se curvava para a frente, dois pontos triangulares semelhantes às orelhas dos lados, uma crista larga e ondulada sob cada orelha e sulcos pontiagudos em cada bochecha. Possuía um abdômen de cor arenosa dividido em tiras por finas marcas. Uma placa rochosa sobre o peito se sobrepunha levemente ao abdômen. Havia uma fileira de espinhos em suas costas e uma cauda longa com finas listras pretas. Do alto de seu nariz, podia-se ver uma espécie de chifre em forma de broca. Fios que saíam de seus braços, costas e barriga o ligavam ao ápice do tubo como cordões umbilicais e, preso à sua boca, um respiradouro ejetava bolhas em intervalos de 4 segundos.
Aiko o observou por severos minutos, sua respiração calma e concentrada, como se estivesse em um santuário diante da imagem de um deus. Quando achou apropriado, disse em um sussurro devoto ao Senhor Satoshi:
—O Senhor tem razão. Não se trata apenas de uma arma. Ele respira. Está vivo!
—Sim. Ele será a nossa chave para o fim dessa guerra. Se ele der certo, nós ampliaremos os nossos horizontes e criaremos outros como ele, com poderes jamais vistos, não só para garantir a paz, mas para mudar o mundo!
Satoshi virou-se gentilmente para Aiko — seus óculos escuros não deixavam à mostra as marcas da idade em seus olhos ambiciosos — e lhe pediu os resultados dos exames biológicos do Projeto. Folheou-os suave e atentamente, e um sorriso quase imperceptível brotou no canto de seus lábios enrugados.
—Aiko... Eu acho que está tudo pronto para nós o despertarmos. —E virando-se para o monstro, completou sem tirar os olhos dele — e acho que me ocorreu um nome para ele.
Rhydon.
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Pokémon: Estilhaços
FanficEm 2073, o mundo entrou em colapso e uma Terceira Guerra Mundial estourou. Os EUA implementaram uma conduta ditatorial visando conquistar outros países, após terem esgotado completamente os seus recursos naturais. Mas o Japão não se rendeu facilment...