Capítulo 2/A Lua

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Narradora on****

Pó, o ar cheirava a cinzas, algo impossível de se respirar.

Cheiro de queimado...

Era dificil de enxergar um palmo em sua frente naquela ilha, apenas um breu até onde a vista se extendia.

Uma luz aos poucos surgia no meio das trevas, a jovem ergue sua mão para poder alcançá-la.

A luz ofusca sua visão por alguns minutos, e quando ela finalmente se acostuma com a claridade, ela avista Mathew, o mesmo carregava consigo um pequeno lampião para enxergar nas trevas.

Seus olhos, vermelhos por conta da praga, encaravam a jovem com preocupação e alívio ao mesmo tempo.

Mathew: Ella! Ainda bem, você está aqui, não suma assim de novo! (O homem diz, abraçando a menor com força.)

O rapaz de olhar acolhedor se afasta e a encara, mesmo com a aparência debilitada e doente, o jovem Mathew ainda era lindo. A pele pálida destacando os olhos vermelho sangue, as íris acizentadas e opacas, lábios secos e um sorriso encantador.

Mathew: não foi sua culpa, Ella...a praga, ela não tem cura, não havia nada que pudesse ter feito para salvá-la. (ele diz enquanto alisa o rosto da garota, Ella suspira fundo e permite que suas lágrimas caiam.)

Ella fecha os olhos, a pá em sua mão cai no chão, bem encima do buraco recém cavado e agora fechado, onde as cinzas da pequena criança foi enterrada pela jovem mulher de cachos negros.

Ella: eu podia ter...feito algo, eu tenho magia, devia ser o suficiente. (Ela diz entristecida, a jovem olha para o rapaz, seus próprios olhos também vermelhos, contaminados pela praga. As íris violetas opacas e sem vida.)

Mathew: ei...não faça isso consigo mesma...(O rapaz diz antes de lentamente puxar a morena pela cintura e abraçar a mesma novamente, Ella suspira e enterra seu rosto no peitoral do homem, respirando fundo o cheiro de seu amado.)

Mathew sorri fracamente, uma mão desliza sobre a pele canela de sua amada, o homem deposita um beijo terno no topo de sua cabeça, respirando fundo seus cabelos negros.

Mathew: não irá demorar muito agora, minha joia, logo seremos libertos desse tormento...vagaremos juntos pela eternidade. (Ele sussurra aquelas palavras com amor e sem medo, Ella sente seu coração um pouco mais leve após ouvi-las.)

Por favor, meus Deuses...acabem com o nosso sofrimento.

Ella e Mathew faziam parte do grupo de Vesuvianos contaminados com a praga, mas diferente dos que estavam na cidade, eles foram vítimas de diversos experimentos no Lazaret, a ilha que servia como crematório para os cadáveres contaminados.

Os médicos os observavam e usavam seus corpos como cobaias para diferentes tipos de tratamentos, na esperança de encontrarem uma cura. O rapaz loiro possuía seus vinte e oito anos, enquanto Ella estava com seus vinte e cinco.

O casal tomava conta dos que ainda viviam, e por serem os menos debilitados de lá, eram responsáveis por cremar e enterrar as cinzas no solo.

Um a um, eles viam seus companheiros perecerem. Até que um dia...

Seu corpo já estava fraco demais para ficar de pé, a pele grudava nos ossos e a tosse só piorava. Os cabelos loiros agora estavam opacos, seus belos olhos cinza já não possuíam a faísca da vida. Ella estava ao seu lado, olhos inchados de tanto chorar.

Ella: não, não! Isso não é justo, leve-me com você! Por favor, por favor, Mathew...(Ela gagueja enquanto se agarra ao corpo fraco do homem que com dificuldade dava seus últimos suspiros.)

Mathew: minha joia...não fique *tosse* assim...você vive, é um milagre...os deuses me ouviram enfim. (Ele diz, o rapaz lentamente levanta sua mão que fracamente acaricia o rosto de Ella.)

Ella: não! Mat...não me deixe...(Ella implora, era visível que a praga por algum motivo estava se dissipando de seu corpo, os olhos violetas brilhavam com vida, o vermelho ao redor das íris lentamente diminuía.)

Mathew olha para sua esposa uma última vez, seu sorriso fraco ainda tão encantador. Seu peito não pesava mais, ele estava aliviado pela primeira vez em dois anos.

Mathew: sorria, Ella...você é tão linda quando sorri.

Ella soluça alto e vê seu marido se agarrar ao que lhe restava de vida para poder olhar ela uma última vez antes de partir. Ella respira fundo e força um sorriso fraco, Mathew sorri antes de lentamente fechar seus olhos. A mulher ouve o último e fraco suspiro ser liberado pelo seu amado antes do mesmo cruzar a ponte entre este mundo e o próximo.

E então ela se permite gritar, gritar e chorar o mais alto que podia. Sua voz ecoava por toda a ilha e pelos destroços daquele local abandonado e amaldiçoado. Agora só restava a jovem em meio ao silêncio de todos aqueles mortos.

Ao fim da tarde, quando a lua cheia se erguia ao topo dos céus, Ella enterra seu amado virado para o mar, para que ele pudesse seguir a lua até o horizonte e retornar para casa, a pequena província de onde vieram em um país distante de Vesuvia.

Um mês havia se passado quando um jovem feiticeiro atraca seu pequeno barco na ilha, carregando consigo uma pequena caixa contendo as cinzas de sua falecida aprendiz. Os brancos cachos se destacavam entre o cinza da vegetação morta do lugar. Ele enterra a caixa e se prepara para ir embora quando ouve uma melodia ecoar mais ao sul da ilha.

Mestre Asra jamais imaginaria encontrar alguém vivo naquele lugar, ainda mais uma mulher. Mas lá estava ela, cantarolando sozinha, sentada ao lado de um túmulo de frente para o mar, os longos cachos negros emaranhados e sujos dançavam com o vento que levava sua voz para longe.

Asra sente algo cantar em seu coração, e uma força que o puxava até aquela figura. Ele caminha até a mulher que lentamente se vira para o mesmo, seus olhos violetas encaram os olhos roxos de Asra e o tempo parece voltar a correr.

Ella sente a energia se esvair de seu corpo e desmaia, porém Asra é rápido ao correr até a mulher e segurar a mesma em seus braços.

Ele retira os cachos que cairam sobre o rosto da jovem e vê o inchaço em seus olhos, as olheiras de quem não dormia. E era como se ele estivesse olhando em um espelho e vendo seu próprio reflexo.

Asra: você sofre da perda, não sofre? Pobrezinha...vamos, deixe eu tirá-la daqui. (Ele fala enquanto a levanta em seus braços e caminha até seu barco.)

"O destino é tão...engraçado...não é mesmo, Asra? Você veio até aqui para enterrar o seu passado, mas saiu com algo que se tornará todo o seu futuro..."

Diz a figura misteriosa que observava da ilha o feiticeiro velejar de volta para o porto de Vesuvia com a mulher ao seu lado, um sorriso curioso surgia nos lábios negros de dentes afiados daquela figura encapuzada.

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⏰ Última atualização: Jul 04 ⏰

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