Capítulo 1

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MARIANNE 


Depois de uma manhã cheia dando aula para minhas alunas, a tarde estava vagarosa para se passar. Decidi sair um pouco antes do planejado para comprar tinta da cor amarela. - Uma aluna havia derrubado no chão por acidente o resto que eu tinha, naquela manhã. - A tarde estava clara, mas empoeirada. Lufadas de vento levantavam baforadas de pó da calçada e da rua. Duas quadras depois, virando a esquina estava a mercearia do qual iria comprar tinta à óleo. É um lugar simples, pouco requisitado, mas venho aqui desde criança com meu pai, pois segundo ele, o Sr. Sebastian produz as melhores tintas da cidade. Quando chego na entrada, um homem vindo da calçada de rosto familiar se aproxima em minha direção.

- Oi, lembra de mim? – Falou o homem sorrindo.

- Hã..? Oi. Acho que lembro... – Nesse exato momento a memória daquele homem me veio em mente, junto com um leve calafrio no estomago.

- Eu levei você para a casa da condessa, na ilha, a uns tempos atrás. – Haviam se passados 6 anos, na verdade. – Nunca mais esqueci de quando você pulou do barco no alto mar para pegar sua caixa de quadros. Foi muito corajosa, nunca esperaria uma reação dessas vindo de uma mulher. – E sorriu.

- Sim, lembro sim. Meus materiais de pintura são valiosos, protejo-os como se fossem filhos. – Dei um sorriso meio tímido. – O que anda fazendo pela cidade? Está morando por aqui?

- Eu moro em um vilarejo próximo. Mas estou trabalhando agora para a filha da condessa, Heloise. Ela se mudou da Itália e agora mora aqui, em Paris, com o marido e a filha. Vim aqui no centro a pedido dela inclusive, comprar algumas comidas para a casa.

Essa informação veio como uma facada no meu estomago. O nome que tento não lembrar, o rosto que mais quero esquecer. E mesmo que tenha se passado anos, a memória dela ainda me é muito presente. Heloise.

- Que bom que você continua trabalhando para a Hel... er... família da condessa. – Não consegui dizer o nome dela. – Tem notícias da Sophie?

- Claro que sim, Sophie está cuidado do nosso bebê que nasceu recentemente. Nós nos casamos. Ela está muito bem e feliz com o nosso filho em casa. – Disse ele com o brilho nos olhos.

Sophie era empregada da casa onde a Condessa e a Heloise viviam. Ela tinha um coração muito bom e puro. E a notícia de que ela agora se encontrava casada e com um bebê nos braços, realmente me deixou surpresa, por tudo que ela havia passado na questão do aborto do qual eu presenciei. Uma surpresa boa e feliz nesse bombardeio de notícias repentinas.

- Nossa, por essa eu não esperava. Muito feliz por vocês. Espero de verdade que dê tudo certo na sua nova família. Manda lembranças para a Sophie, por favor.

- Com certeza irei mandar. Bem, preciso ir agora para não me atrasar. Ah, desculpa não me apresentar antes, meu nome é Jacquin. – Ele estendeu a mão para me cumprimentar.

- O meu é Marianne. Foi bom te rever. Até.

Enquanto eu olhava o Jacquin indo embora, uma onda de pânico me tomou conta. Heloise, a mulher do qual eu não me contive de me apaixonar. A mulher que me deixou marcas das quais eu jamais curei, o amor do qual eu não pude ter, está morando perto de mim. Em Paris. Com o seu então esposo Milanês e sua filha.

Por um momento esqueci o que tinha ido fazer ao sair de casa. Logo em seguida o Sr. Sebastian muito simpático me chama de dentro da loja. – Não vai entrar, Marianne? Se veio até a minha porta é porque precisa de algo para suas obras de arte, não é mesmo?

Ser uma pintora, mulher, na sociedade em que vivo atualmente em Paris, com tantos homens no meio artístico, não é uma tarefa muito fácil. E visitar a loja do Sr. Sebastian é sempre uma aula de encorajamento e auto estima pois desde a morte do meu pai, este é o único homem que me apoia e elogia minhas pinturas.

Saindo da mercearia com a compra feita, faço o trajeto de volta para casa com alguns pensamentos melancólicos que começaram a me acompanhar. O fato é que há seis anos atrás, fui encarregada de pintar o retrato de uma jovem a pedido de sua mãe, para a obra ser enviada a um pretendente Milanês, convencendo-o a casar-se com ela. Me tornei uma dama de companhia durante o dia, para pintar o retrato da moça a noite, já que a mesma relutava contra esse casamento às cegas de conveniência e interesses familiares. A paixão pelo meu objeto de trabalho foi algo inevitável diante de sua beleza e dos olhares correspondidos. E inevitavelmente surgiu o amor, entre trocas de experiências jamais vivenciadas por ambas. Até o ponto de a obra ficar pronta e a despedida involuntária ser realizada. Mas as lembranças sempre me permaneceram vivas, da minha inesquecível, Heloise. 

Retrato de uma jovem em chamas: afterOnde histórias criam vida. Descubra agora