- Senhorita Reis! - me assusto quando uma professora grita batendo na minha mesa, vermelha de raiva com uma careta impagável, o que me faz querer rir, mas não o faço.
retiro meus fones e a encaro.
- Poderia por gentileza se retirar da minha sala e ir a caminho da direção?
sem dizer nada, pego minha mochila na mesa e saio, colocando meu fone e ignorando o mundo a volta.
Nesse momento estou sentada na sala de espera da direção com a cabeça baixa ao som de Con Clavi Con Dio - Ghost
"Demigod
Our task
Behind mask
Chosen sonOh, you rebel chief, destroyer of the earth
Rise from precipice through birth"pensamentos não são necessários, apenas fecho os olhos e presto atenção a cada letra cantada, com uma sensação gostosa se instalando no meu bombeador de sangue.
entro em alerta quando alguém toca no meu ombro, tentando chamar minha atenção. Levanto a cabeça rapidamente achando que era minha vez de falar com o diretor pateta, mas ao invés disso, está um garoto sentado ao meu lado me encarando com um sorriso discreto. O olho por aproximadamente 2 segundos antes de voltar a abaixar a cabeça.
Siamo con clavi
(Siamo con dio)
Siamo con il nostro dio scuroSiamo con clavi
(Siamo con dio)
Siamo con il nostro dio..sou interrompida dos meus desvaneios quando o mesmo tira o fone da minha orelha, fazendo-me novamente encara-lo com certa raiva.
ele dá um sorriso forçadamente caloroso, e diz:
- Atrapalho?
balanço a cabeça afirmativamente e o encaro com tédio. Na real, to morrendo de sono.
- Você não é de falar muito né? Ta ouvindo o que? - pergunta me olhando nos olhos (que provavelmente estão cheio de olheiras) e parece realmente esperar uma resposta. Por fim, sem escolhas, o respondo:
- Música.
ele parece que ia responder algo, até que sou salva pelo gongo.
- Srta. Reis, sua vez - anuncia o diretor entrando de volta em sua sala. Levanto puxando meu fone e indo em direção a sala que fui, pelo menos, 3 vezes esse mês.
o garoto diz algo, mas apenas o ignoro e colocando novamente meu fone.
cheguei na sala do diretor Everson Crane.
esperava que ele fosse fazer como sempre: me entregar a detenção sem trocarmos uma palavra, mas dessa vez ele me pediu para tirar os fones (pelo que parece a milésima vez só hoje) e me encarou, começando a falar.
- Bom, Caroline, eu apenas quero o seu bem. Desde que entrou nessa escola você está sempre desligada de tudo e todos, sempre pelos cantos e com notas baixíssimas. Se continuar nesse ritmo repetirá de ano.
bocejo, talvez pela noite mal dormida ou pelo tédio. ou ambos.
continua:
- Eu conversei com a psicóloga da escola, e ela me deu duas dicas. Ou você começa a fazer sessões com ela, ou podemos fazer diferente.. - me olha com expectativa, na esperança de que eu vá perguntar do que se trata. porém, meus pensamentos estão rondando pelo meu quarto, pensando o quanto tempo ainda vai demorar para que eu volte a dormir.
o diretor bufa frustrado e continua:
- Podemos pedir a algum colega seu lhe ajudar nas matérias, e quem sabe, na sua vida social também. O que me diz? - pelo seu jeito meio inclinado para frente e o sorriso sutil em seus lábios, presumo que ele esteja ansioso para minha resposta.
"agora você está num beco sem saída, vadia" imagino que é exatamente isso que ele está pensando.
qual é menos pior. aturar um adolescente ou uma velha achando que entende perfeitamente minha vida?
acho que a primeira opção.- Que seja! - digo mais para mim do que para ele. pego minha detenção e saio daquela sala. Faltam 4 aulas para acabar o dia letivo, e tenho certeza que vou mata-las.
vou para as arquibancadas, ou melhor, para trás delas, e me deito escondida, usando minha mochila quase vazia (contém apenas 2 casacos e um carregador dentro) como travesseiro. Penso em acender um cigarro, mas desisto quase instantaneamente. se alguém descobrisse chamaria muita atenção.
acabo por cochilar ao som de Ghost.
acordo num susto com o som do sinal, indicando a hora do almoço. Coloco a mochila nas costas e levanto-me, indo em direção ao refeitório, tirando o dinheiro do bolso para pagar minha comida e aumentando o som do meu celular. Quando estou voltando para as arquibancadas alguém segura em meus ombros, fazendo-me parar. É o mesmo garoto de mais cedo. E está dizendo algo que não compreendo por causa da música alta. Ele parece perceber, pois se sente na ousadia de tirar meus fones. Já disse o quanto isso me irrita?
calminha aí, não se irrite por pouca coisa
Fecho meus olhos
1 inspira..
2 expira..
Abro os olhos e o encaro. Pensando bem, aquele cochilo só me fez ficar com mais sono.
- Eu perguntei se não quer se sentar conosco - diz ele divertido, apontando para uma mesa do refeitório com 3 pessoas, que também olhavam para mim. Acabei de perceber que basicamente o refeitório todo está olhando pra essa ceninha patética.
Eu devia ser menos desligada. Ou não. Minha vida é desligada, eu basicamente vivo num devaneio constante. Meu pai me diz que pareço uma morta-viva, e por conta disso levei meu primeiro soco do dia. Deve estar marcado agora, mas isso não interessa. Mas eu não preciso estar totalmente ligada a tudo toda hora, eu prefiro ser uma morta-viva do que uma idiota deplorada por atenção. A quem eu to tentando enganar? Certamente ser deplorada por atenção significaria que eu sou uma adolescente normal. Então diremos que sou assim simplesmente por que não consigo ser de outro jeito. Me acostumei com o tempo, então foda-se tudo.
senti uma pontada bem aguda na costela, onde meu pai havia acertado um soco. Automaticamente me curvei um pouco, prendendo a voz e esbugalhando os olhos.
- Eiei, você tá bem? - seus olhos azuis me analizavam de um jeito estranho.. preocupação? Como sou idiota, é claro que é só curiosidade. Balanço a cabeça afirmamente e passo direto, voltando a ignorar tudo e todos.
Quando chego na arquibancada apoio minha bandeja sobre ela e respiro fundo pra aliviar um pouco a dor, o que certamente adianta.
Volto a colocar meus fones e começo a comer, desejando mentalmente que as aulas passem logo para mim poder voltar para casa.
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A ENTEDIANTE VIDA DE CAROLINE REIS
RandomCaroline Reis, uma garota excluída que certamente não se encaixa em nenhum padrão estabelecido para adolescentes, talvez nem para seres humanos de qualquer idade. Sua vida é uma rotina, uma deplorável e amarga rotina. A estranha e excluída da turma...