HELENA

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Sob os pés de Helena, repousava o homem. Homem do sertão de mínimas palavras,pouco estudado, carregado de bruteza no trabalho rural. Acariciava  membros inferiores da mulher, esta que vivia fantasiada pelo amor dele.
       “Eles erram na gramática, mas acertam na poesia.” Preciso parafrasear Manoel de Barros pra conseguir descrever Alberto, caro leitor. Esse era Alberto. Deixava bilhetinhos sob a mesa que ficava entre a cozinha e a sala, esta tão pequena que cabia apenas uma cadeira velha e o rádio miúdo, Alberto escrevia com caligrafia torta “Leninha .  vô mais vorto” Helena se deliciava com as mensagens do homem, se Alberto soubesse o entusiasmo da mulher á frente de sua chegada nem bateria na porta, mas ele fazia questão.
-Minha neguinha, mas tu demora á beça, abre esses portão.
-Bertin, pra que tanta pressa?
  Colocava os pés pra dentro da casa e já enlaçava os braços na mulher, que ficava alegre com a afeição que o homem demonstrava, beijando o todo rosto da mulher. Era o horário que os vizinhos espiavam nas janelas.
-Que pouca vergonha!
A mulher invejosa dizia.
  Helena não se importava mais, sua êxtase quando aproximava de Alberto explicava mais que qualquer lei da ciência poderia definir. Compartilhava suas angústias, aflições e desejos mais profundos com ele. Alberto sempre a ouvia atentamente, opinava e a enchia de beijos no cangote, Leninha ficava toda arrepiada e dava gargalhadas.
   O amor era imensurável, o fomento pela paixão ardia o peito da mulher, caída de sentimentos. Alberto ia trabalhar cedo, ao sair beijava Lena repetidamente, como um desespero que o atordoava de perder a moça. Ás vezes a vizinhança se perguntava, como um amor pode durar tanto tempo?
Havia 30 anos. Alberto tinha 16, Helena 15. Conheceram-se na igreja, Helena ia constantemente conversar com o padre João Paulo e Alberto ia com a avó, mas sempre teve a rebeldia dentro de si. O homem era a escuridão, o pecado, o conflito e a dúvida. Já a mulher, era a santidade, a fé, o divino e o concreto, apesar disso, sua carismática beleza era abstrata. Ela tinha cabelos negros longos, que formavam cachos nas pontas, alta, tinha um porte como das duquesas de antigamente, talvez seu jeito de moçoila adorável que tenha afeiçoado tanto Alberto. Ele era forte, alto, cedo já era homem, sua pele era negra, lábios grossos e costas largas, isto que encantou a moça, nunca vira um jovem tão bonito, já homem formado.
    Casaram-se poucos meses depois, Alberto dançava com a moça quase todos os dias, segurava sua mão, eram dois passos para lá, dois passos para cá, girava Helena, a ternura era explícita.
    Nas noites de amor, até os colchões sentiam inveja, o jeito que Alberto tocava Helena faziam até mesmo seus sentidos mais ínfimos estremecerem, ele a venerava, achava a mulher linda de todos ângulos e jeitos, tirava suas roupas e admirava os seios da moça, ela ficava toda corada, inda tinha um espírito de menina, talvez isso tenha feito o incêndio no coração dos dois intermináveis. Tinham certeza que o fascínio seria eterno.
    Até o momento que Alberto começou a demorar mais. No primeiro dia, Helena fez janta, sentou na cadeira envelhecida batendo com os pés no chão, ansiosa á espera dele. Mas o homem chegou na madrugada.
    Na segunda vez, ele não bateu na porta.
     Na terceira, espiou de canto se Leninha estava acordada. Com os olhos quase caídos, ela levantou.
   -Alberto.
   Ele sabia que ela estava com coração cheio de perguntas.
   -Tava trabalhando muié.
    Ela aceitou sua justificativa, mas seu âmago trazia desconfiança á frente do homem.
     Depois da vez que chegou tarde, aparecia cada vez menos. Pouco olhava a mulher como antes. Ela prendia os cabelos para trás e laçava botões de laranjeira, mas o homem nem percebia.
      As discussões eram cada vez mais fúteis, por coisas que nunca percebidas. Pelo jeito que o homem deixava os sapatos na porta ou pela gema do ovo pouco mole. Helena nem insistia mais para Alberto acompanhá-la nos bairros e missas.
    Ela sabia que numa hora ele iria de vez, ele rodeava os sentidos dela mas nunca adentrava nos mesmos.
    Leninha mandou uma carta para Pedro,  amigo de Alberto. Esta carta, leitor, nunca vi a cor, mas sei que nela, a mulher pedia ajuda para que Pedro conversasse com seu esposo.
   Não adiantava mais. O homem não ouvia ninguém, nem queria saber mais de Leninha, esta deprimida.
   No domingo, a mulher pediu para acabar de vez com tal confusão, e que de tanto esperar sentia o peito cansado e instalou em si a profunda tristeza. O homem não era o mesmo, disse que precisava acabar e que nem acreditava mais no amor.
   Helena debruçou aos pés no chão, chorava como criança, quando Alberto acrescentou:
-Nosso tempo, muié, acabou. Inda gosto das noites que tira as tralha de roupa pr’eu, mas te amar, amo mais não.
   Ele, que antes tinha medo de perdê-la, nem se importava mais com a mulher, desconsiderou-a.
   O coração de Helena sentia baques tão fortes como o bater de carros em algum acidente, não que não tivesse sendo um também, mas seu estômago parecia vazio quando ao mesmo tempo eram pássaros dentro de seu ínfimo.
    Já era. Alberto não precisava mais dela. A noite chegou, era frio e tinha um ar de melancolia. Mas ela ainda necessitava dele, seu corpo inteiro pedia. 
   Depois de conhecer os dois, eu mesmo me pergunto, como pode um amor da saúde e doença acabar assim? Sem mais, nem menos. Num dia qualquer que ninguém espera que chega, ou até sabe que vai chegar, mas adia o fim.  Como pode Alberto deixar de dizer Leninha para dizer Helena?
   Um não saciava mais o outro. Quando antes, as árvores tinham vida, essas caíram como folhas no outono, e era verão. Quando antes, havia balançar na imaginação do outro, ele parou de pensar nela ou imagina-lá.

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⏰ Última atualização: Apr 26, 2020 ⏰

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