Ainda aqui

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Em seu sonho, Lan Wangji quebrou.

Quando ele acordou, a primeira coisa que notou em si mesmo foram as lágrimas caindo por seu rosto.

Haviam anos que ele não se permitia chorar. Controlar suas emoções era um dos princípios de sua seita, afinal de contas. Não chorar era necessário ― não era permitido.

"Não seja feliz demais. Não seja triste demais. Não..." Ele tentou citar as regas em sua mente, mas enquanto o suor frio descia por sua testa até seu pescoço e as lágrimas salgadas pingavam por seu queixo, ele procurava de maneira desesperada algo para se apegar, para se firmar. Para lançar para longe aquela dor alastrante que parecia querer quebra-lo.

No entanto, ele chorou.

Ele não estava sozinho, não mais. Mas ele ainda assim chorou.

Porque ele esteve sozinho. Por anos, ele esteve sozinho. Por anos sentiu o buraco vazio em seu peito, clamando por calor. Pelo calor especifico de quem ele havia perdido. De quem não voltaria.

Onde você está? Ele clamava aos espíritos quando tocava a Guqin até as pontas de seus dedos sangrarem.

Me responda... Ele implorava. Ele pedia desesperadamente. Por favor, por favor.

Wei Ying! Ele se humilhava para espíritos que nem mesmo o conheciam por alguma informação, alguma luz, qualquer coisa.

Chamava por ele, gritava por ele. Sua mão estava estendida eternamente na frente de um abismo de medo, dor e perda. Ele nunca o alcançava e não importava se ele corria até a pele de seus pés sangrarem. Ele não poderia alcançar Wei Ying.

― Lan Zhan...? ― A voz rouca chamou por ele. Wangji quis se estapear por permitir que seus sonhos acordassem Wei Ying. Quis gritar consigo mesmo. ― Lan Zhan, você está bem?

― Hm. ― Sua garganta arranhou como vidro quebrado. Pontudo e causando feridas sangrentas que não se curavam nunca. Ele continuava ferido, sangrando e sangrando até ceder às dores. Até que ele caísse e não pudesse mais se levantar.

― Não. ― Ele agora soou mais consciente. A nevoa de sono passando e se focando no corpo bagunçado que ele havia dividido a cama. Wangji podia ver as marcas de seus beijos descendo por toda a pele do pescoço e desaparecendo embaixo do hobby de linho branco. ― O que aconteceu?

― Pesadelo. ― Falou de maneira sincera. Ele nunca mentiria para Wei Ying, mesmo que isso custasse o preço de finalmente dizer a ele o que o atormentava noite após noite, durante treze anos. ― Estava sozinho.

Wangji rezou para que ele não precisasse dizer mais. Para que não precisasse explicar o que "sozinho" implicava. Ele não queria desabar, não queria que Wei Ying fosse o único a segurar a carga da dor que transbordava de seu peito.

Wei Ying não disse nada, o silêncio tenso entre eles. Não devia ser assim. Ele já havia passado por tanto, não devia ser assim. Wei Ying precisava de paz, não de lidar com a bagunça torcida que ele havia se tornado. Ele não precisava daquilo, não era aquele lado de Lan Wangji que ele queria entregar a Wei Wuxian.

Mas como sempre, Wei Ying não fez o que Wangji esperava que ele fizesse. Ele não virou o rosto e voltou a dormir. Não ignorou sua dor como ele desejava que seu amante fizesse.

Ele fez o que Wangji precisava que ele fizesse.

Os braços dele passaram por sua própria cintura completamente nua. O toque quente em contraste com seu corpo frio de pânico. Wangji mordeu os lábios para parar de chorar, para não soluçar, para não pedir por mais calor. Por mais toques e mais conforto.

Hymn for the missing - WangXianOnde histórias criam vida. Descubra agora