Capítulo 3 - A Escola Nacional Preparatória

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Em 1922, Frida Kahlo ingressou naquela que era sem dúvida a melhor instituição de ensino do México, a Escola Nacional Preparatória. Longe do controle da mãe, das irmãs, das tias, longe da vida de vilarejo, lenta e pacata, de Coyoacán, ela foi empurrada para o coração da capital mexicana, onde o México moderno estava sendo inventado e onde os estudantes participavam efetivamente dessa invenção. Entre seus colegas estava a nata da juventude do país, filhos e filhas de profissionais liberais da capital e das províncias, que queriam que seus descendentes se preparassem para cursar as faculdades de graduação e os colégios de ciências e humanidades da Universidade Nacional. Quando
deixassem para trás seus dias de estudante, esses jovens não apenas teriam ajudado a mudar sua respectiva faculdade ou universidade, bem como exerceriam papéis de liderança nacional. Não é de admirar que, quando Frida mudou sua data de nascimento, ela tenha escolhido o ano da eclosão da revolução. Se essa decisão foi tomada num lampejo fulminante, a história por
trás dela se desenrolou nos tumultuosos anos que ela passou na Escola Preparatória.

Desde sua criação, a Preparatória era impressionante. A escola fora fundada em 1868, depois da execução do imperador Maximiliano, quando o colégio jesuíta de San Ildefonso foi transformado em parte do restaurado sistema republicano de educação secular estabelecido pelo presidente Benito Juárez, e era mais parecida com uma faculdade do que com uma escola de ensino médio. Seu primeiro diretor, Gabino Barreda, descrevia o currículo como uma escada de conhecimento, em que um degrau levava ao outro, começando com a
matemática e culminando com a lógica. Entre o primeiro e o último degrau, os estudantes faziam diversos cursos em ciências físicas e biológicas; o ensino de línguas era coordenado com a sequência de estudo científico — primeiro francês, seguido de inglês, em alguns casos, alemão, e, nos dois últimos anos, latim. “Nosso lema será o seguinte: liberdade, ordem, progresso”, disse Barreda. “A liberdade como meio, a ordem como base e o progresso como fim.” Suas palavras eram uma interpretação daquelas esculpidas no escudo da Preparatória: “Amor, Ordem e Progresso”.

Em 1910, quando os primeiros disparos da revolução começaram a soar nas províncias, o último ministro da Instrução de Porfirio Díaz, Justa Sierra, criou a Universidade Nacional do México, e determinou que a Preparatória fosse parte integrante dela. Na década de 1920, frequentar essa escola significava ter aulas com as mentes mais brilhantes do México — por exemplo, o biólogo Isaac Ochoterena; o historiador Daniel Cosío Villegas; os filósofos Antonio Caso e Samuel Ramos; os literatos Erasmo Castellanos Quinto, Jaime Torres Bodet e Narciso Bassols (então diretor da Escola Nacional de Direito) — mais tarde, os dois últimos atuariam como ministros da Educação. Estudar na Preparatória era também estar no centro da efervescência cultural e política.

Durante os 34 anos da ditadura de Porfirio Díaz, os rumos da nação haviam sido ditados por um grupo de advogados, contadores e intelectuais conhecidos como científicos (em sua maioria, entusiastas adeptos da filosofia positivista de Auguste Comte). Eles tinham procurado na Europa “moderna” os modelos culturais e econômicos a serem implantados no México, e entregaram em mãos estrangeiras — de europeus e norte-americanos — a exploração dos recursos naturais do país. A cultura mexicana nativa era desprezada, e os indígenas que a
criaram eram aviltados. Os mexicanos sofisticados preferiam pinturas que
emulassem os mestres espanhóis Murillo ou Zuloaga, avenidas que copiassem a Champs-Élysées e edifícios de belas-artes que se assemelhassem a bolos de aniversário neoclássicos franceses. O próprio Porfirio empoava a pele cor de
bronze para esconder o fato de que era descendente de índios misteque, com um mínimo de sangue espanhol.

Passou-se uma década para que a revolução devolvesse o México aos
mexicanos, mas na década de 1920 as conquistas da longa batalha estavam
sendo consolidadas. Teve início um programa de reforma trabalhista e agrária; o poder da Igreja católica foi drasticamente reduzido; aprovaram-se leis decretando a devolução dos recursos naturais à nação. À medida que os mexicanos começaram a forjar uma nova e orgulhosa identidade, passaram a
rejeitar ideias e modas anteriormente valorizadas e exportadas da França e da Espanha, e abraçaram a cultura nativa. “Idealistas, persistam na salvação da República”, Antonio Caso exortava os estudantes. “Voltem seus olhos para o solo mexicano, para nossos costumes e tradições, nossas esperanças e desejos, para aquilo que somos de verdade!”
Eleito em 1920, o presidente Álvaro Obregón nomeou como ministro da
Educação José Vasconcelos, brilhante advogado e filósofo da geração pós-científicos e que participara da luta armada contra Díaz.

FRIDA KAHLO: Uma BiografiaOnde histórias criam vida. Descubra agora