A mulher que me ensinou a cantar.

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Ela não é uma cantora profissional,

ela não é professora de canto,

ela nem mesmo se sobressaia em um coral.

A mulher que me ensinou a cantar corria pela relva, molhada pelo orvalho com pés descalços, carregava uma sacolinha com uma folha de papel e o que sobrará de um pequeno lápis.

Todas as manhãs, ela corria, para a escola com seus irmãos, todas as manhãs ela corria. Corria de malucos na estrada antes mesmo do sol despontar no céu, corria dos bois e das vacas. Corria para a escola, onde aprendeu o básico.

E depois corria mais, corria para a lavoura para levar comida para os mais velhos, corria de volta pra casa, ajudava nos afazeres domésticos.

Brincava com os irmãos e irmãs, cultivava memórias que mais tarde contaria a beira da mesa em um café da tarde, entre risadas e olhares curiosos de três garotinhas, que aprenderiam com ela a cantar.

A mulher que me ensinou a cantar, também me ensinou a cuidar, ela cuidou dos sogros, dos pais, dos filhos, do marido, mesmo que muitas vezes certos não merecessem.

Ela também me ensinou a cozinhar, entre corridas pela casa, a beira do fogão eu querendo comer a massa que restou na vasilha da batedeira. Ela dizia:

– Isso vai crescer na sua barriga, para de comer massa crua.

Mas devo dizer que foi assim que fiz meu primeiro bolo, sem receita, só provando a massa até chegar no gosto de infância. Sim, ela me ensinou a cozinhar, a escrever receitas no livro mais antigo da família.

A mulher de cachos castanhos, olhos escuros, sorriso fácil, que nem terminou o fundamental, foi ela que me ensinou a cantar.

No cair da noite, a casa silenciosa, filhos e marido fora, ela me ensinou a cantar.

Com sua harpa já gasta de tanto folhear ela me ensinou a cantar.

As duas garotinhas risonhas quando se falava dos moribundos, palavra mais engraçada, não? era para eu e minha prima.

Mais a frente se tornaram três garotinhas, orando e cantando, no cair da noite na cama entre cobertas, com a casa silenciosa, só elas, Deus e a mulher que me ensinou a cantar.

A mulher que me ensinou a cantar não é uma cantora profissional,

ela não é professora de canto,

ela nem mesmo se sobressaia em um coral.

Ela é minha avó, uma das mulheres da minha vida.

Para: Vovó Saula. 

As Mulheres da Minha VidaOnde histórias criam vida. Descubra agora