Início e despedida a beira-mar

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" Se me pedisse pra morrer por você
Eu faria
Olha para meu rosto
Não teria preço que eu não pagasse
Se isso importasse pra você"
Always - Bon Jovi.

Na areia úmida pelas ondas que tocavam a orla, pegadas eram registradas conforme um casal caminhava com a brisa esvoaçando os cabelos escuros da jovem mãe que carregava nos braços o corpo pequeno e deverazmente fofo - com direito a dobrinhas de pe...

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Na areia úmida pelas ondas que tocavam a orla, pegadas eram registradas conforme um casal caminhava com a brisa esvoaçando os cabelos escuros da jovem mãe que carregava nos braços o corpo pequeno e deverazmente fofo - com direito a dobrinhas de pele nós braços e pernas- de seu unigênito, sendo amparada pelo marido.

- Lembra quando viemos aqui pela primeira vez? - Indagou a mulher, os olhos baixos com cabeça inclinada contemplando como aquele corpinho quente da criança se aconchegava em si.

- Claro que me lembro. Você me deu susto enorme quando saiu da água! - Exclamou ele.com um olhar nostálgico.- Parecia a Samara do chamado.- Seus lábios foram de orelha a orelha emitindo uma gargalhada ao lembrar da cena.

- Eu não sabia nadar Rafael! - Defendeu-se ela.- Na verdade, anda não sei.- Lamentou.

Camille era uma negação quando o assunto era sua habilidade de se locomover na água apesar de sempre gostar de manter seus pés molhados e seu corpo submerso quando via uma piscina. Claro que no mar as coisas são bem diferentes, e não ter o fundo sob se campo de visão - e noção também- a trazia um medo bem grande de um afogamento eminente.

- Esse seu falar alto assustou o Ivan, olhe só Mille! - Rafael indicou o pequeno filho de três anos com o queixo.

- Claro que não! - Repreendeu ela- Ele está encantado com o mar!

Era nitidamente um fato, o pequeno Ivan estendia os bracinhos em entusiasmo quando as ondas se aproximaram e seus olhinhos redondos e escuros brilhavam de empolgação.

- Espere para entrar no barco, ele está bem ali.- Rafael mostrou o pequeno e aconchegante barco com algumas luzes avermelhadas que reliziam na parte interna.

Perambular por aquela praia era um hábito que eles não queriam perder de jeito nenhum.

Já faziam vários anos que visitavam tal praia como um porto sentimental que reavivasse suas lembranças mais queridas como se estivessem assistindo-as neste exato momento. Afinal, fora ali que se conheceram aos dezessete...

- Droga! - Praguejou a menina.

"Porque alguém está reclamando em plenas férias na praia?"

Pensou Rafael, não demorou muito para que ele a observasse, se aproximando também. A garota parecia brigar com a água que fazia cócegas em seus pés e logo retornavam para água tão rápido quanto chegaram.

- Tem de estar por aqui......- ela murmurava.

- Posso ajudar?- Quando viu já estava praticamente ao lado da garota, que deu um susto assim que notou a sua presença.

- Meu colar caiu aqui.- Lamuriava-se ela, os olhos ziguezagueando.

Rafael olhou em volta, um brilho dourado não muito longe chamou sua atenção. Ele instintivamente seguiu.

- Por acaso, seria esse?- Questionou com o cordão repleto de areia úmida nas mãos.

Camille sorriu, mal sabia que aqueles olhos castanhos a intrigariam de uma forma que levaria mais do que um simples verão.

Casaram aos vinte e quatro.....

- Viva os noivos!!

Taças de champagne eram levadas ao alto e uma decoração rústica mas ao mesmo tempo esbanjando o romantismo pelo qual Camille era mais ligada do que qualquer outra coisa. Ela e Rafael se abraçavam, os cabelos dourados da mulher reluzindo tanto quando as lâmpadas suspensas por cordões que iluminavam o anoitecer na beira da praia. Seu vestido brando justo de saia rodada e a mão puxando a gravata de Rafael que exibia seus invejáveis dentes brancos para a câmera, Camille não fez objeções contra molhar a barra de seu vestido ao registrar momentos ao lado do noivo em que água os tocava.

E agora traziam o pequeno Ivan aos vinte e oito.

- É lindo, não?

Camille tinha colocado os pezinhos do garoto na areia, deixando que ele desse alguns passos em direção à água mas retornasse correndo de uma forma engraçada conforme a água tocava seus dedos e a areia ficasse agarrada na sola.

Rafael abraçou-a de lado, com um olhar sonhador enquanto o vento balançava os cabelos castanho avermelhados, sentindo os braços de Ivan tocar suas pernas e a da mulher quando voltava correndo e rindo.

- Vem gurizinho, vamos andar de barco.- O homem pegou Ivan no colo assim que o barco alcançou a orla próximo a eles.

A luz os acolheu e as águas se encarregaram de os conduzir. O vermelho das luzes e pétalas se destacavam no bar branco, semelhante ao modelo que usaram quando na lua de mel resolveram passear por aquelas águas. Queriam que esse momento se unisse aos outros que guardavam em suas memórias e corações com um sentimento especial.

Mas não sabiam que podia ser o último que iriam usufruir em família.

Quando num momento de efêmero contentamento algo parece mudar. Os olhos de Camille que outrora estavam brandos a observar Rafael segurar Ivan no colo, o garotinho olhando para a água abaixo, agora tinham entrado em choque e seu corpo parecia ter enrijecido.
Em meio as luzes surge o sangue e em meio a noite um grito de dor forte o suficiente para assustar o homem e até mesmo dispersar o garotom.

A criança confusa e nitidamente desnorteada pelo grito, o pai com os olhos arregalados em desespero e uma serpente escarlate deslizando a partir do braço da mãe onde o pulso sangrava pelas marcas atingidas e contaminadas com veneno.

- Não!- Indignado, foi tudo que sua língua conseguiu balbuciar.

Num solavanco, Rafael assegurou-se de proteger quem no mento dali para frente seria seu tesouro mais precioso no mundo. Ivan contemplava assustado a mãe se contorcer enquanto viram o rabo da cobra sair do barco e facilmente desaparecer na imensidão de água.

- Camille....- Rafael desvencilhou-se do rapaz com uma certa rapidez, tudo que seus olhos viam agora era o corpo da esposa.

O pai desesperado abraçou-a como se aquilo fosse capaz de conter o veneno e retroceder o tempo mas para seu desalento, nem se tentasse os remédios e tratamentos da unidade de pronto-socorro mais próximo não conseguiriam restaurar o corpo que já estava inerte. Essa era uma das desvantagens de estar em uma praia paradisíaca, parecia não ter absolutamente nada por perto.

Com os olhos marejados, a garganta com um nó e a mandíbula cerrada, o homem permitiu-se a observar o rosto da mulher que mais amou no mundo. Nem a morte conseguiria apagar a beleza daqueles olhos escuros. A vontade era de gritar e extravasar toda sua raiva de uma vez só, mas seu corpo parecia não funcionar como de costume.
Quando conseguiu, os dedos trêmulos da mão e suavemente fecharam os olhos de sua amada, sentia seu coração destroçado.

Queria partir junto dela, mas seus olhos captaram Ivan recostado no canto do barco o olhando sem compreender nada. Deveria continuar, por ele.

Pois naquela noite o barco não os levou a um passeio que gostariam de lembrar com felicidade.

Lembrar daquele dia só traria desolação, pois agora jamais veria o mar ao lado dela.

Uma memória levada com o vento, um coração destroçado pela perda.

Palavras ao VentoOnde histórias criam vida. Descubra agora