CAPÍTULO 2

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Ellie

O domingo passou voando. Acordei e estranhei meu pai não ter me chamado ainda para o café, já eram dez da manhã e ele nunca me deixava passar das oito, pois dizia que acordar tarde dava preguiça e fazia mal para o corpo. Ele mesmo levantava às seis. Me levantei e fui até o banheiro, mas a porta estava trancada.

- Pai, com licença, preciso entrar. - bati na porta, balançando as pernas querendo fazer xixi.

A porta se abriu e eu virei estátua.

Alan saiu do banheiro e parou segurando a porta aberta.

Meu mundo caiu. Como eu poderia deixar aquele Deus me ver descabelada, de pijamas e ainda com bafo?

Instintivamente levei minhas mais ao cabelo no mesmo instante para ajeitar o máximo possível, e pedi desculpas num sussurro enquanto ele se desculpava com aquele sorrisinho de canto e ia para o lado me dando espaço para entrar.

- Pode usar, mademoiselle! - fez uma reverência exagerada quase tocando as mãos no chão ao se curvar. Não aguentei e cai na gargalhada junto com ele, enquanto ele corria já descendo a escada.

Entrei e me apoiei na pia. Que vacilo. Vacilo do meu pai! Como não me chamou e avisou das visitas? Principalmente AQUELA visita. Meu deus. Eu precisava compensar aquela visão que ele teve de mim.

Um ritual de beleza básico, isso deveria ajudar! Me arrumei com uma roupa normal, porém bem ajeitada, penteei o cabelo, passei uma base e um rímel para dar uma melhorada no rosto amassado. Me olhei no espelho e estava ok. Nada exagerado, porém bem mais aceitável que minha cara de quem dormiu demais. Abri a porta, mas voltei para passar um gloss (gloss nunca é exagero) e corri escada a baixo. Eles estavam na cozinha me aguardando, Alan avisou que eu havia acordado então meu pão com manteiga e leite já estava preparado, como meu pai sempre fizera desde que eu era pequena. Cumprimentei todos e me sentei para comer. O papo estava animado, mas não prestei muita atenção, estava tentando comer rapidamente, sem reparar em Alan para não esquecer como se engolia. Mas quando voltei a mim, percebi que Alan ria muito e estava com fotos nas mãos. Estranhei aquilo e me inclinei para olhar. Mais vexame!

Eram fotos minhas, tiradas de uma caixa que estava entre as pernas dele e ele deveria estar arrumando e não fuçando! Fotos de quando eu era criança e, como sempre, vergonhosas.

Desde montada nas costas do meu pai fingindo ser cowboy e ele o cavalo num colchão no meio da sala onde nossa família muitas vezes se juntava pra dormir todos juntos assistindo filmes, até eu pré-adolescente completamente emo, com os olhos pretos, franja cobrindo um dos olhos e uma guitarra na mão. Era essa última que ele olhava e ria, de tanto rir ele já nem emitia sons, só se chacoalhava na cadeira.

- Ela nunca aprendeu a tocar essa coisa, compramos porque ela fez um escândalo que queria uma. Era viciada em Green Day e Linkin Park, ficava tirando fotos com a franja tapando metade do olho com cara de triste, pé torto pra dentro... Bom, dá pra perceber né. - a risada do meu pai se sobressaiu a de Alan, que ainda enxugava os olhos enquanto Paul apontava minhas meias e cintos listrados de preto e branco.

- Sabe, vocês poderiam esperar a pessoa não estar presente para rirem da cara dela. - eu disse, mas não me aguentei e ri também. Aquela foto era realmente um terror atualmente, mas eu tinha saudade daquela minha fase. Na época era moda, não era vergonhoso, mas o que eu sentia falta era das poucas preocupações que eu tinha naquela idade, onze ou doze anos e da autenticidade que era viver daquela maneira. Era verdadeiro. Eu me sentia incluída em um grupo e não só pra me enquadrar, mas porque eu realmente fazia parte daquilo. Eu era admirada, era reconhecida e, dos outros adolescentes do grupo, eu sempre fui uma influência. Aquilo era eu e eu vivi intensamente aquela fase.

CACOS DE VIDROOnde histórias criam vida. Descubra agora