I-Amor Perfeito

43 5 16
                                    

"Afinal, amor-perfeito significa lembranças e pensamentos"


Estou na casa da árvore pela 3° vez essa semana, mais uma vez pedindo por favor, que talvez por algum milagre ou por sorte, você volte para mim, porque eu me recuso a deixa-lo ir da minha memória como te deixei ir pra longe, me recuso a olhar pra todas as fotos que tiramos e dizer que como flashes elas foram apenas um segundo de luz, me recuso a olhar aos desenhos e rascunhos empilhados no canto e lembrar que talvez nunca o terminemos, me recuso a ler nossas cartas abarrotadas de sentimentos densos e verdadeiros e acreditar que agora a autenticidade delas só existe no papel desbotado e empoeirado escondido em caixas espalhadas pelo chão de madeira da casa na árvore, me recuso a novamente guardar um milhão e meio de sentimentos em caixas rasas apenas para que aquele lugar continue do mesmo jeito que a última vez que estivemos lá, juntos.

Eu sinto falta de cantarmos juntos, de dançarmos juntos, de colecionarmos flores juntos, de lermos juntos, de sair juntos, de ficar juntos, de estar juntos e estou cansada de ter que abraçar memorias suas e não poder criar novas. Nesses últimos inverno, verão, outono e primavera teve peças de teatro que não pude aproveitar com você, acampamentos que você não esteve, comidas que você não experimentou e todas essas atividades me pareceram tão em vão sem sentido, porque não consegui te esquecer, porque quando eu ria da peça, eu esperava te ligar e rirmos juntos, porque quando eu ficava cansada das atividades do acampamento, eu esperava que estivesse lá para me distrair me ensinando o significado das margaridas, lírios e hortênsias. Desço a escada de madeira e corda, nos vejo ao pé da escada, e você me ajudando a descer, nos vejo trocando caricias na beira da lagoa a poucos metros da casa na árvore, nos vejo tomando milkshake de morango e chantilly na lanchonete a caminho de casa e finalmente ao chegar em casa, paro no outro lado da rua e nos vejo dançando pela janela do meu quarto, apenas sombras e vestígios nossos, respiro fundo quando olho para cima e aos poucos essas imagens escorrem pelas minhas mão, embora eu as agarre com todo o que meu eu pode oferecer, elas se dissipam, me trazendo ao presente, ergo meu queixo apenas alguns centímetros acima, contemplando as estrelas brilhando, até que uma delas decide cair, como um lance de brilho, uma estrela cadente leva consigo o meu pedido escondido. Entro em casa fechando a porta atrás de mim.

"Laura, é você?" Mamãe pergunta da cozinha

"Sim, quer ajuda com o jantar?"

"Sim, obrigada, guarda lá suas coisas e depois desce pra cortar as cenouras por favor"

"Está bom, já desço"

Subo até meu quarto e abro a porta. A brisa noturna transpassa a janela aberta, cruza a cortina que agora balança, traz a luz da lua e espalha o aroma nostálgico de flores violetas somente agora flagradas no centro da minha cama. Corro até o pé da cama onde desmorono ao ver que são amores-perfeitos, flores roxas, flores essas que me arrastam imediatamente ao momento exato em que Jimin me ensinou sobre elas, em meio a estantes de livros sobre biologia, ensinou que são caules de pensamentos e pétalas de recordações enquanto tecíamos essa memória em si, moldada ás cegas porém sobre medida pra essa ocasião, flores essas que agora em cima da minha cama cobrem uma carta. Uma carta. Carta em papel novo. Carta em tinta nova, carta desejada demais para ser real, mas, Meu Deus, estava ali, estava realmente ali, tão perto, diante de mim havia palavras carregando um pedaço meu, há muito, apartado e arremessado há quilômetros de distância. Abro-a com cautela, atribulada apenas com apenas a possibilidade impossível de que aquelas linhas voassem para longe. É agora, confio todas minhas esperanças e desesperanças em um único suspiro e começo a decisiva, preciosa, milagrosa, afetuosa, compassiva, plangente, dolorosa, serena leitura.

Universos com seus nomesOnde histórias criam vida. Descubra agora