(A rapariga na midia é a Ana Margarida, 19 anos)
A minha história perdeu o rumo quando os meus pais morreram. E com isso perdi também a noção do rumo que queria tomar na minha vida.
Acabei de chegar a esta nova cidade. Na verdade já estou nesta cidade faz uma semana. Mas ainda não me dignei a sair de casa. Nem preciso. Afinal não há nada que me obrigue a interagir com o mundo lá fora. Eu apenas fico em casa e existo. A minha vida tem se resumido a estudar, escrever e desenhar
Estou agora no meu novo quarto mais uma vez a desenhar no meu bloco. E teria continuado até ao fim da noite se o meu tio não tivesse aparecido lá.
-Ainda estás a desenhar?- Perguntou.
- É preferível que eu desenhe do que que saia e não saibas onde estou. Pelo menos não me comporto mal, e não volto para casa de madrugada. Outras pessoas prefeririam que os filhos ou sobrinhos agissem assim.
- Não se não tiverem nem sequer um amigo. E muito menos se desperdiçarem o talento a desenhar e escrever sobre um acidente que aconteceu há quase dez anos.- Ele disse. Eu ainda não acredito que ele realmente pensa assim.
- Acidente? Achas que foi um acidente o que aconteceu? Achas que o assassino os matou sem querer? E por mais anos que passem. Eu não me esquecerei nunca do que vi.
- Ok. Talvez tenha escolhido mal as palavras mas...- Ele ia continuar mas eu interrompo.
- Não é só isso! Desenhar, ou escrever ajuda-me. E não é desperdício de talento se eu não o tiver. Apenas....-respiro fundo antes de continuar a falar- Esquece. Não ias entender.
- Chega de discussão. Já vi que não adianta nada. O que queres para o jantar?- Perguntou a tentar cortar o assunto que tanto me incomodava falar.
- Tanto faz.
- Pizza?
- A minha é de vegetais.
Ele bufa e então responde- Está bem. Posso ver o que estás a desenhar?- Eu puxo o bloco para mais perto para que ele entendesse que não o deixaria ver os meus desenhos. Ele logo entende e muda de assunto.- Eu preciso de falar contigo.
- Sobre o quê?- Por vezes eu e o meu tio falávamos sobre algo. Não precisávamos de ter um assunto. Ele apenas me fazia sorrir. Mesmo que não durasse muito. Ele era a única pessoa que me fazia sorrir minimamente. Mesmo até que eu não sentisse que ele me compreendia, sabia que ele tentava.
- Na semana passada, quando nos mudámos para cá, eu conheci uma família.
-E daí?- Largo o lápis que tinha na mão mas continuo a olhar para o desenho.
- A família que é bem conhecida por aqui. É a família Proença Lencastre, e ela é conhecida por ser dona de uma empresa de catering, mas o que mais chama a atenção das pessoas é uma boate que abriram há alguns anos, que fica aqui mesmo na cidade.
- Ainda não entendi o que tem o assunto haver comigo.
- Eu passei por lá ontem, para ver como é e soube que abriu uma vaga. Eu mostrei o currículo que fizemos para a faculdade antes de recusares ir e conseguiste a vaga.
- Estás a dizer-me que me deram uma vaga para trabalhar numa boate, cheia de pessoas jovens, divertidas e bêbadas a curtir a música alta de noite?
- Exatamente.
- Não! Nem pensar. Eu não vou. Não consigo.
- Angélica, tu ouviste o terapeuta que disse que seria melhor te integrares em vez de te fechares em casa. Isso faz-te mal. Não remoas o passado.
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Olha-me nos olhos.
RomanceQuem diria? Quem diria, que um dia, eu estaria aqui? De cabeça erguida, com meu príncipe encantado? Com toda minha família feliz e perto de mim... Provavelmente ninguém. Porque não estou! Embora eu sempre tenha sonhado com isto. Mas... Seria isto po...