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Minha cabeça dói.

É o que posso informar agora. A minha cabeça dói, e dói muito. Meu corpo também dói, principalmente minhas costelas e pernas. Eu sinto a minha barriga queimar e meus ombros pesarem. Eu não quero nem abrir os olhos se você quer saber, não quero ver o que aconteceu pois eu não sei e estou com medo de descobrir. Eu sei que está claro, sinto a claridade mansa porém avassaladora. Essa claridade está queimando meus olhos, mesmo que eles estejam cobertos pelas minhas pesadas pálpebras. 

Acho que tem algumas pessoas falando em torno de mim, algo sobre sangue e cabeça. Talvez tenha ouvido a palavra costela e vértebras também. A minha vontade é de gritar que sim, minhas costelas doem. Acho que tem alguém chorando, será? A minha vontade de abrir os olhos e levantar é nula, mas a curiosidade do que está acontecendo está me matando. Deus, que luz forte.

Bem, está claro mesmo, tem neve para todo o lado e um sol branco que deixa as pessoas cegas mesmo que não olhem diretamente para ele. Olhar em volta está me deixando em pânico. Alguns carros parados, três ambulâncias, dois carros de policiais e lágrimas vindas de alguma garota que eu não estou reconhecendo. Meu joelho também dói, ainda mais fazendo esforço para me levantar. 

Acho que eu devia ter ficado deitado.

É, eu devia ter ficado deitado.

Eu olhei para trás e vi o carro dos meus pais jogado numa vala coberta de neve. Em duas ambulâncias vejo corpos conhecidos, mamãe e papai. Não consigo achar Abby, tenho certeza que ela está aqui, só pode estar aqui. Ela estava sentada ao meu lado cantando Somebody Told Me no carro. É, ela estava. E papai também, e mamãe tampando os ouvidos implorando ara trocar de estação. 

Dai apareceu o maldito cervo.

E papai desviou.

Então o carro foi parar na vala funda coberta de branco da neve, e agora de vermelho do sangue. Está moído, as janelas destruídas e a frente destruída. As portas arrancadas e sangue, muito sangue. E eu ainda não achei Abby. Somente papai e mamãe em uma ambulância, e eu na outra. Eu? Pois é Newt.  Minha camiseta branca está vermelha e molhada, muito molhada. Uns muitos arranhões pelo rosto e um ferimento realmente exposto na perna direita. Por isso meu joelho dói tanto.

Se bem que agora a dor está ficando mais fraca, cada vez mais fraca. Não estou quase sentindo ela. Mas sei que está aqui. Alguns médicos ali estão tentando estancar o sangue e gritando por um helicóptero. Uma morena com os cabelos num rabo de cavalo bem preso está gritando que se eu não for para o hospital agora terei o mesmo destino dos outros. Um careca está aflito no telefone e pessoas na estrada estão chorando.

Então pelo que a morena disse deduzo que estou vivo, não é? Então, o que faço aqui fora? Observando todo o caos? Por que papai e mamãe não estão aqui? Acho que eu nunca mais irei vê-los. Eu quero encontrar Abby. Preciso falar com Abby. Acho que a vi. Eu acho que ela está pior do que eu, acho que ela não vai resistir. Estou andando na direção de cinco paramédicos aflitos em torno de um corpo.

- Não tem mais o que fazer! Os batimentos estão caindo mais ainda. - Disse um alto.

É, era a Abby. Seu rosto está desfigurado e cheio de cacos de vidro da janela. Uma de suas costelas está atravessando a pele e era está cheia de sangue. Nunca mais vou esquecer essa cena, disso tenho certeza. 

- O helicóptero chegou! - Gritou um cara.

Eu corri em direção a maca que eu estou, eles estão correndo para o helicóptero vermelho tão depressa que quase derrapei na neve vermelha. Todos se espremeram em meio aos equipamentos e eu me encolhi num canto perto da cadeira do piloto, bem rente a morena que está do lado do meu rosto. Ouço ela fazer uma oração. Um dos médicos tenta estancar o sangue que eu ainda não sei de onde vem enquanto a morena fala baixinho em meu ouvido:

- Aguente firme, querido. 

O voo não demora, é bem rápido, na verdade. Acho que estão me levando para a cidade vizinha, para um hospital mais amplo ou sei lá. Agora comecei a me perguntar se avisaram alguém da minha família, ou algum amigo. Será que Anne está sabendo? Ela trabalha no hospital da cidade vizinha. Será que vovô Ben e Vovó Mags sabem? Kimmy talvez? Ou quem sabe Minho?

Será que Thomas sabe? 

Será que ele já está correndo para o hospital na maldita da caminhonete dele?

Sei que ele estava fazendo um teste para o teatro no Coveas Cafe. Ele me disse a um mês que faria o teste para interpretar Romeu numa adaptação de Romeu e Julieta. Eu lembro até de caçoar dele pois o papel parecia tosco demais. Então ele me caçoou dizendo que eu não faria nem um figurante na peça pois não conseguia nem tocar uma música no violão na frente da minha família. Então eu mandei ele se foder e ele me beijou.

(...)

Acho que chegamos ao hospital. Eu estou correndo ao máximo para acompanhar a maca, eles estão indo depressa para a sala de cirurgias. Eles abrem a porta e eu me esguio antes que ela se feche. Estão tirando meus jeans com uma tesoura e a camiseta também. Mascaras e luvas postas e eles começam a trabalhar. Cortaram meu peito e um corte no joelho. Acho que eu estou fodido.

Eles conversam entre si. Disseram que parti quatro costelas e uma delas furou meu pulmão, o que juntou uma quantia enorme de sangue e água, o que faz com que eu não respire. E meu joelho quebrou a junta, além de outros ferimentos bem graves, eu suponho. Não sei a quanto tempo estamos aqui, só sei que fazem mais de horas. Quando acabam de tentar me concertar, as portas se abrem e eu saio atrás da maca novamente. Estou com uma camisola tão fina que sinto frio, mesmo não sentindo nada.

Estamos entrando na ala da UTI e ali na espera vejo alguns rostos. Vó Mags, vô Ben, Tia Stele com seus gêmeos e mais algumas pessoas. Mais da metade começou a chorar quando viu a maca chegando. Estão me instalando em tubos agora. Estou vendo meus familiares pelo vidro. Todos ali.

Menos Thomas.

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⏰ Última atualização: Dec 19, 2014 ⏰

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