Prólogo

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Prólogo

31 de março de 2004

Era um dia quente de outono, do lado de fora da casa da família Cabello uma grande tempestade caía. A pequena Camila que tinha acabado de jantar à luz de velas, pensava no que podia fazer para espantar o tédio, a força tinha caído a quase duas horas e a mente da garotinha de cabelos escuros borbulhava em ideias. Poderia brincar que era uma fada, e a grande e maldosa rainha da tempestade arruinava o jardim onde era seu reino. Não. Tinha brincado disso dois dias antes quando uma chuva forte caiu na tarde de sábado. Não podia estender sua brincadeira, tinha aula no dia seguinte mas podia sonhar antes de adormecer. Sonhar. Era isso, na noite anterior sonhou que era raptada por Gancho, depois de adormecer no sofá assistindo Peter Pan.
"Não pode me alcançar Gancho! Sou mais rápida que você!" – Ela gritou enquanto fechava a porta, e colocava a vela que levara ao seu quarto em cima da cômoda ao lado do guarda-roupa.

"Peter! Por favor corra, eu lido com ele sozinha, vá ver como está Wendy!" – Pegou um cabide caído do chão, imaginando que era sua nova espada, precisava se defender Gancho estava vindo. Camila lutava bravamente contra ele, por um descuido sem que notasse acertou a vela que caiu no chão de madeira, uma pequena parte da chama pegando no casaco pendurado na maçaneta do guarda-roupa. Um acidente.
Enquanto descia as escadas até a sala de estar, defendendo sua vida contra aquele pirata. Ninguém imaginava o risco que todos corriam.

Sua mãe, Sinu, uma mulher muito bonita de cabelos incrivelmente longos, com uma barriga que carregava a mais nova caçula da família, correu até a sala pra saber que gritaria era aquela, tarde da noite, Camila já devia estar na cama. Alejandro seu pai, um homem atlético, saiu do quarto para saber por que a esposa gritava com a criança no andar de baixo. Enquanto se encaminhava para descer as escadas um brilho laranja que bruxuleava aos poucos pela porta entreaberta do quarto da filha lhe chamou atenção.

Quando abriu a porta, o fogo se alastrava pelo móvel, quase chegando na cama. No desespero de descer as escadas e gritar para que a esposa chamasse os bombeiros, caiu do meio da escada sentindo uma dor insuportável no ombro direito.

A mulher alcançou o telefone sem saber ainda o motivo e falava desesperada com os bombeiros enquanto ajudava o marido a se levantar. Alejandro gritou com Camila aquela noite. Já tinha perdido as contas de quantas vezes chamara a atenção da garota pelas brincadeiras perigosas.

Em uma tarde quando a garota se jogou da casa na árvore, imaginando que suas lindas asas de fada azuis iriam alçar voo. Ou quando inundou o banheiro por imaginar que era uma sereia na banheira enquanto tomava banho. Ou quando quase deu uma junção de produtos de limpeza para Shawn o vizinho, em quanto imaginava que era uma cientista maluca criando poções. Tinha uma imaginação fértil e ainda não conseguia se expressar direito, ela era tão nova ainda, sete anos de vida. Alguns de seus amigos não conseguiam acompanhar, o seu amigo e vizinho tentava, antes de sua mãe o proibir de vê-la, mas tentava porque achava que aquela garota tinha um brilho que ninguém mais tinha.

Os bombeiros chegaram antes que o fogo se alastrasse ainda mais pelo quarto, a linda menina perdeu metade de seu guarda-roupa, a cama se fora, a cortina pela metade e os brinquedos todos queimados, restando apenas uma pelúcia de borboleta azul que Camila insistira em querer entregar a Sofia quando ela chegasse ao mundo. Escondida no baú em baixo da tábua.

Ela abraçou a pelúcia como quem abraça a esperança, uma lágrima inocente escapou enquanto observava o pai sofrendo de dor, ela ainda não entendia o que era romper o ligamento do ombro, mas parecia doer.
Do lado de fora, a policia, o jornal e os vizinhos faziam balburdia, conforme chegavam em frente a casa. A pequena ouviu quando Karen Mendes exclamou para quem quisesse ouvir "Essa garota é um perigo, quantas vezes vou ter que repetir? Já devia ter sido internada".

Camila olhou para o pai buscando auxilio e ele apenas chorava, ela não podia saber, mas não era apenas pela dor do rompimento, era o peso da decisão.

A garota não conseguiu ver quando tudo acabou, desabou de sono no sofá da sala, não ouviu a discussão que seus pais tiveram. E estranhou quando acordou com um barulho na cozinha, porque ninguém a tirou do sofá? Outro barulho fez com que ela esquecesse a questão e se lembrasse, Peter Pan buscava os meninos perdidos, ela havia se encrencado muito na noite anterior, talvez seus pais tivessem fugido a deixando sozinha. Wendy ficaria muito brava ao saber que teria outra menina perdida na terra do nunca, mas Camila seria gentil e esperaria o tempo dela.

Levantou devagar, colocou os pequenos e opacos – agora – olhinhos a cima do sofá em direção a cozinha, viu a mãe arrumando a cesta de piquenique e estranhou, ela não estava encrencada? Não era uma menina perdida? Com cautela e os braços atrás do pequeno corpo se encaminhou para a cozinha olhando a mãe por baixo dos longos cílios. A mãe suspirou quando viu a garota, um flash de tristeza passando pelo seu rosto, quando abriu a boca para falar, Alejandro abriu a porta da frente, uma sacola do shopping nas mãos e pediu que Camila pudesse se arrumar com as roupas novas, iriam ao Zoo Miami, um dos lugares favoritos da criança.

O caminho foi longo e silencioso, no banco ao lado da garotinha com um laço azul nos cabelos, a borboleta que ela apelidara de Hope a acompanhava. Ela tinha cada vez mais certeza de que a pelúcia era mágica, ela a ajudara a encontrar esperanças, Sofia seria uma criança de sorte.

Quando o carro parou a pequena não entendeu, o lugar era como um casarão, longe da entrada da estrada, em cima de uma montanha, algumas borboletas no letreiro que Camila não conseguiu ler a tempo. Enquanto fechava a porta do carro seguindo sua mãe, uma mulher incrivelmente linda de jaleco branco saiu pela porta. A menor apreciou tanto a beleza daquela mulher podia jurar que ela era alguma fada, que não viu quando seu pai colocou uma mala pequena rosa ao seu lado.

"Você deve ser Camila!" – disse a mulher com voz de sino dos ventos, e a pequena apenas assentiu tímida. "Estávamos ansiosos esperando você, meu nome é Lana, bem vinda ao hospital psiquiátrico Patrícia Ann Hill."

Camila sempre acreditou em destino, antes mesmo de saber o que era. Sabia que o que aconteceu naquela fatídica noite de março tinha sido um acidente. Mas sabia que por algum motivo devia estar ali, só não sabia por quanto tempo, esperava que fosse até as férias, esperava sair e ver Sofia.

Foi um acidente. Foi destino.

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Em revisão.
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1159 palavras, por favor votem e comentem espero que vocês gostem dessa jornada entre o passado e o futuro, que só o destino é capaz de criar :)

Efeito ColateralOnde histórias criam vida. Descubra agora