Sob a luz dos vagalumes

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Depois de passar por todo aquele sufoco envolvendo lobo voando, Savannah sendo Savannah e Nikolas e a criança finalmente acordando, estávamos todos reunidos e conscientes,  nos encontramos com o resto do grupo e contamos o que aconteceu, todos ficaram incrédulos com a história e Martin parecia decepcionado, quando perguntei o motivo ele disse que daria tudo pra ver um animal mítico pessoalmente, na próxima deixo ele ser comido no meu lugar já que é tão fã da criatura, se bem que admito que também fiquei encantada de início, mas agora temos que tomar cuidado extra já que sabemos que a floresta contém mais perigos do que imaginávamos, precisamos encontrar um lugar seguro e logo.

Com o cair da noite, montamos uma fogueira com a madeira coletada pelo Kaio, estávamos comendo frutinhas, e algum bicho que a Savannah matou está sendo assado na fogueira, ela pode aparentar ser aquelas "patricinhas" que tem nojininho de tudo mas as aparências enganam não é mesmo, todos sabem que ela é uma exímia caçadora, afinal, a família dela é famosa por ser composta por caçadores incríveis, moramos em uma cidade pequena todo mundo se conhece, minha mãe assim como todos os moradores Calíopolis, compra carne no açougue da família Morales, Savannah é a mais nova de 5 irmãos, todos mais velhos e todos homens, então, diria que ela é toda feminina mas é bem casca grossa, mas ela pode explodir com qualquer um por qualquer motivo, e sabe eu não vou ficar deixando ela descontar as frustrações dela em mim, quer saber, vou parar de pensar sobre ela se não vou começar a ficar irritada. Olho ao meu redor e estamos os sete sentados ao lado fogueira.

O silêncio é um pouco constrangedor, ninguém sabe muito bem o que falar.

A madeira estala com o fogo ardente, está frio mas a fogueira nos esquenta levemente, olho para cima e as folhas das árvores deixam apenas um pouco da luz da lua cheia passar. É angustiante ficar nesse silêncio, mas compreensível, ninguém sabe muito bem o que dizer, e estamos todos assustados e machucados.

O silêncio perdura por mais alguns minutos até que Kaio começa a falar.

- Então, alguém tem alguma teoria do que pode estar acontecendo?

Martin abre um grande sorriso.

- Teorias? Eu tô cheio delas desde que acordamos nessa maldita floresta, a minha primeira é... - seu olhar ficar sério e um suspense fica no ar, todos se inclinam levemente para a frente em expectativa, até que ele conclui - Aliens!

Damos um suspiro em conjunto, surpresos pela nossa sincronia e pela espontaneidade do nosso colega nos entreolhamos e damos risadinhas, Martin sempre conseguia quebrar o gelo, um garoto genuinamente divertido, atencioso e dedicado, apesar das teorias loucas que ele vive bolando e ser o seu típico nerd ele é muito respeitado e querido por isso minha sala o escolheu como representante de classe nos últimos  três anos que estudamos juntos, caso você esteja se perguntando nós 7 não somos da mesma sala, obviamente a criança vocês já devem ter deduzido isso, mas eu, Martin e Maeve estudamos juntos na mesma sala desde o primeiro ano do ensino médio, o mesmo com a Savannah, Kaio e Nickolas, que são de outra sala mas além de serem colegas são amigos de infância.

- Qual é gente eu tô falando sério, isso é estranho demais pra não ter sido alienígena.

-Ok, ok Martin - Kaio diz enquanto tenta parar de rir - O que mais você tem pra gente?

-Bom, eu tenho mais uma teoria, é algo que acho que já percebemos mas ninguém tem a coragem de falar - ele abaixa a cabeça, sério, nos entreolhamos, dessa vez, sem risadinhas - Essa não é a primeira vez que nós sete estamos juntos em um mesmo lugar - Ah, com isso percebemos do que ele está falando - O Grande Deslizamento,  de 10 anos atrás, fomos milagrosamente encontrados depois de dois dias, nós sete estávamos lá, fomos os únicos encontrados, não é estranho não nos lembrarmos de nada desse dia?

Esse não era um assunto que costumamos conversar sobre, não apenas quase morremos mas perdemos pessoas importantes, meu pai também estava lá, assim como os familiares de todos que estão sentados ao redor dessa fogueira, várias outras pessoas também foram atingidas, por mais que procurassem as únicas pessoas que conseguiram encontrar no meio de toda aquela lama e terra foram nós sete. Calma. Não, não foi só nós sete.

- Martin, é realmente estranho e eu não entendo isso muito bem, as memórias daquele dia são distorcidas e confusas, mas nós sete não fomos os únicos encontrados, uma pessoa que não está aqui, também foi resgatada.

Todos me olham e então percebem de quem estou falando. Nickolas confirma o que estavam pensando.

- O seu irmão, o Lucas, ele tinha apenas dois anos na época, assim como o Vitor - esse é o nome do garotinho, ele nos disse depois de toda aquela confusão do lobo - todos ficaram dizendo que éramos crianças milagrosas, que sobrevivemos a uma grande catástrofe - a expressão no rosto de cada um é de dor e tristeza - Crianças milagrosas? - ele continua - pessoas que amávamos morreram naquele dia, nem seus corpos foram encontrados, isso está mais para uma maldição.

O clima fica pesado novamente, ninguém sabe o que dizer, é doloroso, é angustiante, e então pela primeira vez Maeve fala algo.

- Talvez seja uma maldição, talvez estarmos envolvidos em mais um acidente seja prova que deveríamos ter morrido naquele dia, mas ainda há uma chance de estarmos vivos por um motivo, Lucas não está aqui, é diferente do passado, dessa vez podemos fazer algo - ela olha pra mim - vamos achar o seu irmão e vamos voltar pra casa, ainda temos pessoas pra quem voltar, se estamos vivos, vamos fazer com que valha a pena.

Lembro da minha mãe, de seu toque reconfortante, de como ela foi o meu maior suporte depois do acidente, do quanto ela lutou pra que eu e o Luke ficássemos bem, não quero fazer ela passar por toda aquela dor de novo, precisamos voltar pra ela são e salvos. Acho que todos melhoraram um pouco depois de ouvir essas palavras, lembrar de quem esteve lá por nós nos momentos difíceis e aguardam o nosso retorno nos deu forças para continuar, para não desistir. Mas uma pessoa manteve um semblante sem vida, Nickolas perdeu ambos os pais naquele dia, ele ficou completamente sozinho, até ser adotado pela família do Kaio que ao perceber a expressão desolada do amigo, coloca a mão em seu obro, da um singelo sorriso e diz - Nossa família espera por nós, tenho certeza que estão preocupados, os seus pais também iriam querer vê-lo bem e eu te prometi não foi irmão? Ficaremos bem, estamos juntos, vai dar tudo certo, não estamos sozinhos.

Acho que essas palavras de conforto era o que precisávamos, estamos com medo, com frio, machucados, toda essa situação novamente, é assustador, mas não estamos sozinhos, quando Nickolas começa a chorar baixinho e Kaio o abraça é um estopim para que deixemos todos esses sentimentos transbordarem em lágrimas, a noite é preenchida pelo som abafado do choro de nós sete.

Com a visão embaçada pelas lágrimas, eu olho pra cima e vejo borrões verdes, limpo o rosto com as costas das mãos e tento olhar novamente, vários pequenos pontos de luz verde sobrevoam acima de nós, vagalumes, os outros também perceberam, e o choro vai diminuindo, ficamos um tempo observando, meus olhos ficam pesados, todo o estresse e cansaço do dia, a realidade finalmente foi assimilada, nos acomodamos no chão nos preparando para dormir e finalizar esse dia louco, amanhã precisamos encontrar alguma coisa, qualquer coisa, não podemos desistir, deitados no chão, admirando a belíssima luz dos vagalumes, um sentimento acendeu em cada um de nós.

Esperança.

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⏰ Última atualização: Nov 21, 2021 ⏰

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