Há no preto um estigma comum
Do cabelo ao lábio
Da fala ao caráter
Pelo branco subestimado."Mas nem todo branco"
Enquanto falava isso indignada
Não viu a bala atingir a carne do preto
De doze anos."Mas nem todo branco"
Reclamava enquanto o homem preto
Sufocava na terra feito cão
E se fosse cão, talvez recebesse ajuda."Mas nem todo branco"
Dizia a madame enquanto lá fora
Uma menina maravilha se foi
Porque uma bala atingiu seu corpo
Porque a polícia não vê gênero, não vê idade
A polícia enxerga preto e solta bala."Mas nem todo o branco"
Disse inconsciente quase sempre
Sem fazer nada sobre o tal
Incidente isolado, sem nada registrado
Que mata todo dia um preto
E nós sabemos o seu segredo.Segredo de privilégio ancestral,
A chaga aberta escravocrata
Sangrando após a liberdade
Porque libertaram-se os corpos negros
e no imaginário ainda o escravizam
Em palavras
Olhares
Gestos
"A coisa tá preta"
"Trabalho de preto"
"Preto, mas bonito"
"Cabelo de preto"
"Duro, palha de aço"
São as cortesias brancas
Seguidas do famoso
"Não se pode mais brincar"
Pois essa brincadeira escravista
Racista, imunda, sórdida
Mata a alma e diminui
A criança, o adulto
O ser
Humano como tu.
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Isolada em palavras
PoezieUm livro composto por poemas-passarinhos voando com o poder da palavra enquanto sua criadora encontra-se isolada.