PARTE 1: IV

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IV

"Está tudo terminando
It's all ending

Eu vou parar de fingir quem nós somos

I gotta stop pretending who we are

Nós, eu posso ver nós morrendo, não estamos?
You and me I can see us dying, are we?"

Don't Speak, NO DOUBT

Fazia um mês que Marcelo sentia que algo havia mudado. Por mais que gostasse de ir para a escola, encontrar seus amigos, sua animação não era a mesma. Não se importava mais em ter uma boa visão da janela de sua sala, nem mesmo a encarava com tanta frequência. Não arranjava mais desculpas para ficar na turma durante o intervalo. E não se importava mais em sair da aula de educação física dez minutos antes da aula terminar.

Poderia dizer que estava fugindo, e talvez estava. Os novos boatos sobre Felipe eram verdadeiros, ele estava namorando Priscilla.

Um acontecido que não só mudou Marcelo. O mesmo percebia como Priscilla passara a ser mais bem aceita, principalmente no grupinho de amigos de Felipe e ouvia menos comentários negativos sobre a aparência física da mesma. Mas demorou semanas para isso acontecer, de início Felipe e Priscilla foram alvo de piadas e muitos acharam que Felipe estivesse em uma espécie de aposta. Não tinha como o maior mulherengo da escola ficar com alguém feito Priscilla. Eram o que dizia, e até mesmo Marcelo chegou a pensar isso de início, mas mudara após perceber seu preconceito.

Semana passada, durante o intervalo, Marcelo estava na quadra junto com seus amigos. A discussão da vez era sobre Política. Na rodinha de amigos havia um anarquista, um centro esquerda, dois de esquerda e dois de direita extremamente insatisfeitos com o governo atual. Marcelo não entendia de política e se sentia intimidado com a discussão fervorosa. Ficava um tanto impressionado com seus amigos, tinha a mesma idade que ele e já eram tão decididos e sabiam quem eram. Enquanto Marcelo não se entendia. Era um completo confuso, se não entendia nada sobre seus sentimentos, nem sobre si como havia de entender política?

— O governo tem que ensinar a pescar. — Dizia o quatro olhos

— Eu também sou contra cotas, é dizer que negros são incapazes só por serem negros, é racista.

— Você não disse esse absurdo, disse?

Marcelo encarou sua amiga Manu, preocupado. Sabia quanto sua amiga era sensível a qualquer assunto que envolvia racismo. Marcelo também sentira o incomodo, apesar de não ter um pensamento concreto sobre cotas, sentia um incomodo quando pessoas brancas tentavam ditar o que seria racismo ou não. Não é como se as pessoas brancas entendessem sobre isso, mesmo estudados sobre o assunto, Marcelo sentia isso na pele algo que nenhum pensamento teórico poderia fazer um branco entender.

— Cotas não se trata sobre capacidade intelectual se trata sobre oportunidade. Mas acho que é difícil entrar isso na cabeça de um branco que acredita no conto de fadas da meritocracia.

— Okay, gente, vamos mudar de assunto. Acho que esse já deu. — Foi a vez do centro esquerda, intervir.

— Já deu mesmo e eu vou pra sala.

Manu se retirou. Marcelo e André foram atrás deixando um clima pesado para trás. No caminho de volta Marcelo se deparou com o novo casal.

Priscilla parecia brilhar, ela sempre foi uma menina bonita e atraente, mas além de as madeixas rosadas terem combinado mais com ela, o fato de ela andar com mais leveza e com a cabeça levantada e um sorriso no rosto tornava ela ainda mais bela e roubava a atenção. Tanto que Marcelo nem percebera que estava no meio do caminho e esbarrara em Felipe.

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