A população marcha a favor do Sem nome. Rastejam. Cantando o hino de Brazil em plenos pulmões. Respiram. Cospem. Rangem os dentes. Andam. Hasteiam a bandeira de Brazil. Vibram. Alguns gritam. Gargalham. Zunem como as velhas moscas na carne fétida. Flamejam a atual bandeira. Sua cor ainda é verde no retângulo maior, reconfigurada para simbolizar a luta dos povos pela economia e o que chamam de homenagem à "Green Area". Uma estrela amarela preenche o centro simbolizando riqueza e alegria do povo de Brazil. No meio, um brasão com uma águia, como quem mira o futuro, quem reforça a luta e a braveza de quem comanda o país, a força, mesmo que seja braçal e ideológica, a águia vem pra furar os olhos daqueles que se opõem à Besta. Logo abaixo, uma frase que exalta Deus e Família. "God bless the Family and the Nation", sim, em inglês, o Sem Nome idolatra os estadunidenses, acredita ser o povo que trará dias melhores para Brazil com seus tratados e devoção unilateral. O povo de Brazil nem sequer tem permissão para entrar nos Estados Unidos, as fronteiras são fechadas com pessoas armadas para impedir a passagem de qualquer latino. Não faz sentido tanto apoio.
As pessoas correm. Causam tumulto. A Guarda do Governo, atual força armada que monitora o território de Brazil abre caminho para que a nuvem de moscas passem sem qualquer incômodo. São pacíficos. Estão apoiando o Sem Nome, parecem ser legítimos. Gritam palavras de apoio. Ouve-se uma só voz que diz "O Messias permanece, o Messias vive", vindo do bater de asas e rastejar daquele punhado de pessoas. Desaceleram. Marcham nas ruas sem um propósito revolucionário, apenas louvar e bendizer o tal Messias, a besta. Eles acreditam que aquilo é fazer política. Quem apoiasse o governo e mostrasse total subserviência ao Sem Nome, poderia ir e vir sem impedimentos. O exercício da cidadania significava apoiá-lo.
Os Brancos, sentados às suas portas, observam a marcha infernal com olhos de tanto faz. Assim é o comportamento de tais. Empinam seus narizes. Trocam olhares. A marcha avança, como uma onda desgovernada procura pela faixa de terra. Os brancos não se movem, mas temem. Não lhes é permitido demonstrar vulnerabilidade, medo, terror, incerteza sobre os futuros dias, incerteza que assola e enfraquece qualquer um de Brazil que ainda não se entregou ao bater de asas daquela multidão. Os brancos são tão covardes quanto as moscas. Mas tão miseráveis quanto qualquer outro. Conseguiram a mão do Governo sobre suas casas, pois foram seus votos que decidiram a permanência do Sem Nome. Mesmo que indiretamente, permitiram o jogo carniceiro dos governantes, asseguraram o direito das moscas matarem, entregaram este território de mão beijada ao tal Messias..
Em Brazil, os Brancos são identificados pela roupa. Homens podem usar qualquer item do seu vestuário, desde que seja branco. Para mulheres, apenas é permitido vestidos. Longos. Alguns na altura do joelho, menos que isso é indecente. Atiça os homens. Eles tremem suas línguas como serpentes ao verem a presa. Muitos avançam sem cerimônia. É instinto. Muito já se conversou e estudou sobre isso, mas o Governo alegou que instintos humanos devem ser preservados, as pessoas são livres, não devem seguir doutrinamento de psicólogos. Não há erro em homens serem assim, agir pela emoção, pelo desejo, afinal são homens, dizia o Sem Nome, "somos incontroláveis", e soltava uma gargalhada como que de uma hiena satânica.
Essa classe, se é que podemos chamar assim, é restrita de alguns direitos. A manifestação está à serviço do povo, no entanto, o silêncio é quase que uma dádiva para aquelas pessoas que nem sequer tiveram segunda oportunidade. A verdade, é que ninguém teve. Sem expressão. Sem direito ao discurso. Noite sem lua. Quarto escuro. É como um Branco denomina sua vida tão repleta da alvura de suas roupas, tão manchada pelo mesmo sangue que embriaga a Besta. Aos brancos é permitido o sussurro, entre si, em suas casas. Aquele que cala diante do Messias é um sábio, sabe demonstrar respeito. Ser um Branco era ainda ser parte do povo de Brazil.
Pensar. Pressionar-se. Repensar. As paredes se fecham. Um quarto claro estreita as paredes, menor é o espaço, maior é a culpa e cada vez chega mais perto, mais perto, a decisão está tomada. Pressionar. Branco. Enquanto votos são computados, gatilhos disparam. A mão que votou derrama sangue, a mão que nega puxar o gatilho, de fato não puxou, apenas lubrificou o cano da arma para que o tiro fosse mais certeiro. Terceirizou até mesmo a culpa. A perspectiva de suas vidas mudaram. Pressionar. Repensar. Ser pressionado. Calar. Obedecer.
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Brazil, 2023.
General FictionO Brasil de 2023 não é mais como conhecemos. Sob uma forte repressão política, o território brasileiro passa a ter uma nova configuração e a população agora tem hábitos estranhos, fanáticos pelo seu Governador. Entenda como o Brasil tomou tais rumo...