Para esse capítulo, escolhi essa música. Espero que gostem. Boa leitura!
Play (Asystole - Hayley Williams )
P.O.V Alma
Abro os olhos e percebo a luz tranquila e calorosa do sol adentrar o quarto. Observo ao redor, e todo o ambiente possui tons calmos e claros. Além da cama que me encontro deitada, há um pequeno guarda roupas, ao seu lado há uma poltrona antiga, porém, bem conservada. Próximo a janela, uma escrivaninha bem organizada está posicionada para uma vista inspiradora. Há também uma prateleira com vários livros empilhados e alguns pertences de alguém que eu não reconhecia mais. O quarto é simplório, mas me trouxe, além de lembranças, mais paz nessa noite do que qualquer outro lugar nos últimos dois anos.
Respiro fundo, me levanto vagarosamente e me sento na cama. Já fazem alguns dias que eu fugi e ainda me pergunto se foi a coisa certa a se fazer. Desejar coisas não significa que você as terá. E, as vezes, o preço que se paga pelo esforço para se conseguir aquilo que se quer é extremamente alto. Eu sempre desejei ter uma família completa, mas desde criança isso nunca foi possível. Minha mãe, após papai nos abandonar, conseguiu um novo marido e fez uma nova família. Nos tornamos estranhas uma para outra. Minha semelhança com meu pai ajudava um pouco, acredito eu. As vezes ela não suportava olhar para mim e eu sentia que isso a deixava mal. Com o tempo, preferi não participar mais daquela família, eu não pertencia aquele lugar. Morar com meus avós fora a melhor decisão já tomada por mim. Nunca faltou amor, dedicação, atenção e carinho. Imaginei ter um amor desses em uma família só minha, mas nenhum homem conseguiu me envolver de verdade. Quase perdi as esperanças quando Minos apareceu em uma noite chuvosa. Foi como se eu nem precisasse de mais nada a não ser dele.
Vivi dois anos da minha vida completamente apaixonada por aquele homem e eu nem sei por que. Nosso relacionamento se resumia em abusos diários, físicos e metais. Me tornei prisioneira do amor que sentia. O pior de tudo é que eu acreditava ser sempre o ultimo xingamento, o ultimo empurrão, a ultima vez que choraria a noite toda por paz. Diversas vezes tentei sair desse ciclo vicioso que se tornou nosso relacionamento, mas eu ainda o amo e é tão difícil se desvencilhar disso. Por fim, o que começou no meio de uma tempestade também acabou em meio a uma. Me doeu e ainda me dói ter saído daquele casamento, mas eu valho mais que tudo isso.
Me levanto por inteiro e vou até o banheiro. Tomo um banho longo e quente, aproveitando o gosto de liberdade que eu mesma me proporcionei. A cidade pode ser meu velho lar, porém, irá me proporcionar uma nova vida. Eu anseio por isso, na verdade preciso disso.
Me visto e chego até a sala sentindo o cheirinho de infância e café fresco. Como é bom estar em casa com a minha família.
- Bom dia, vovó!! - A abraço por trás, depositando um beijo em seus cabelos.
- Bom dia, minha querida! Dormiu bem? Como está se sentindo? -Perguntou se virando para mim.
A preocupação extrema que meus avós demonstravam diariamente as vezes me causava desconforto, mas eu os entendo. Presenciaram muita coisa ruim acontecendo comigo então, é compreensível.
- Como um bebê. Tudo anda tão calmo no meu coração, fazia muito tempo que não me sentia assim.- Respondi me sentando a mesa e logo servindo uma xicara de café.
Olho para a cadeira vazia na ponta da mesa. O lugar de vovô está vazio.
- Antes mesmo que pergunte, seu avô já foi para a livraria. Eros está adoentado esses dias então ele anda tendo que fazer tudo sozinho.
- E por que ele não me pediu ajuda? Estou aqui para ajudar também! - Respondi amanteigando o pão.
- Até parece que você não conhece seu avô, não é? E ele anda muito preocupado com você. Na verdade, nós dois estamos. Faz só uma semana que você chegou e sabemos que você precisa de tempo para se reencaixar novamente.
- Eu já me sinto bem melhor vovó, sério. Acho que vou até lá dar uma mãozinha, é véspera de feriado e até onde me lembro as coisas ficam loucas lá. E esse cara, Eros. Está tão ruim assim para não ir? O que ele tem?
- Até onde sabemos ele deu um mal jeito na coluna, não sei bem. Suas costas estão horríveis. Parece que mal consegue colocar os livros nas prateleiras. Acredito que ele volte na semana que vem. Como as coisas estão um pouco difíceis, seu avô preferiu esperar a volta dele ao invés de contratar outra pessoa. E ele é um rapaz muito bom, adora aquele lugar tanto quanto seu avô então, podemos esperar.
- Entendo. - Disse enquanto terminava de engolir meu café. - Vou até lá então, tudo bem? Anoite todos nós nos encontramos para o jantar.
Fui ao quarto as pressas arrumar minha bolsa. Me dirigi a porta e antes que eu pudesse abrir minha avó me puxou para um abraço.
- Estamos tão felizes que esteja de volta! - Sua voz era tremula e feliz.
A apertei com bastante força e beijei suas bochechas.
- Eu também estou feliz em estar de volta!
Sai de casa e peguei meu caminho até a livraria. Passeando pela cidade a nostalgia de um tempo que não voltaria mais tomou conta do meu peito. A vida nessa pequena cidade era feliz. Ao mesmo que me arrependo de ter deixado esse lugar, agradeço por ter aprendido coisas estando longe dele. De forma dolorosa, mas me ajudaram a ser quem sou hoje. O tempo era agradável aquela manhã, me fazendo não demorar tanto até chegar ao meu destino.
A porta estava com uma placa escrita "fechado". Bati devagar até ver a figura simpática do meu avô. Ele se aproximou da porta com uma cara de confuso e a abriu.
- Ainda estamos fechados. - Me disse como se não me conhecesse.
- Vovô, vim te ajudar, desculpe por não avisar. - Respondi confusa
- Oh minha querida, é claro! - disse abrindo passagem para que eu pudesse entrar.
Tudo estava exatamente como eu me lembrava, com algumas reformas é claro.
-Então, por onde começamos? - Perguntei enquanto reparava que meu avô me olhava perplexo. -Está tudo bem?
- Está, minha querida. Perdoe o vovô, estou um pouco voado hoje. - Disse.
Ao longo daquele dia passamos muito tempo juntos. Foi tudo muito agitado, pessoas entrando e saindo. Comprando ou apenas olhando. A livraria tinha um ar rústico. Prateleiras de madeira e um canto para leituras. Muitas crianças visitavam aquele lugar e ficavam maravilhadas. Todas as sextas havia o espaço para ler histórias e pelo visto esse hábito ainda perdurava. Vovô pediu para que eu lesse para elas já que não estava mais sozinho. Ao fim do expediente começamos a organizar tudo para fechar o lugar.
-Vou fechar o caixa, minha querida. Daí podemos ir para casa.
-Tudo bem. Vou até a lanchonete aqui ao lado para comprar alguma sobremesa para nós. - Disse enquanto pegava minha bolsa.
- Certo, querida. Tome cuidado!
Sai e atravessei a rua. A lanchonete ficava na esquina seguinte. Andei até lá e admirei a vitrine de tortas. Todas eram muito lindas e pareciam muito saborosas. Acabei escolhendo a clássica de chocolate. Esperei enquanto a moça embalava para que eu pudesse levar. Paguei por tudo e estava me dirigindo a porta da livraria novamente até que meu celular tocou.
- Pronto! - Atendi desajeitada.
- Então, acho que te encontrei! - A voz do outro lado respondeu me oferecendo uma pequena risada.
Eu simplesmente soltei a torta no chão. Minhas mãos começaram a tremer. Por pouco não perdi o controle de minhas pernas. Não era possível! Aquela voz, aquela risada.. A paz deu lugar a uma escuridão mórbida no meu coração. Fiquei ofegante, tudo começou a girar de repente e a única coisa que consegui, foi apenas desligar o telefone. Meu avô avistou a cena e correu até mim.
-O que houve minha querida?
Eu não conseguia responder, estava estática. Será que o inferno vai continuar?
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O Conto de Eros
RomanceUma adaptação moderna do conto de Eros e Psiquê. O Deus do amor, em uma missão fora atingido erroneamente por uma de suas flechas de ouro. Obrigado a se afastar da humana da qual está ligado por amor, sua memória é ocultada e ele começa uma vida no...