Não tenho desculpas
Por todas essas despedidas
Me chame quando acabar
Porque estou morrendo por dentro
Sober- Demi lovato
Tem dias que a sobriedade me atinge de forma cruel,ela é a vadia que insiste em me mostrar quão merda é a minha vida, Hoje foi um desses dias.
Ela simplesmente gritou e gritou repetidas vezes que minha vida era inútil,que ninguém me amava,que eu era um peso na vida de todos. No começo eu a ignorei,mas ela é insistente e barulhenta,impossível não lhe ouvir, e eu, bom eu resolvi da melhor forma, acabando com ela.
Dois comprimidos de dramin,e um copo de vodka e eu estava pronta pra encarar o mundo,os demônios de minha mente estavam alimentados e dormiam a sono aberto e eu teria paz por algumas horas. Pelo menos foi o que eu achei que aconteceria, engano meu. Enquanto curtia minha "vibe" meu celular apitou, minha excelentíssima progenitora queria saber se seus filhos ja estavam na escola,se a casa estava limpa, se o almoço estava pronto,as compras feitas e se seu marido ja havia chegado. Respondi que só faltava ir ao mercado e ouvi incessantes quinze minutos de desaforos,pra ela era um absurdo não estar tudo pronto,ja eram 11h da manhã eu deveria ter tudo em ordem. Ouvir o quanto eu sou irresponsável e não faço nada direito acordou todos os meus demônios novamente,porém eu não tinha tempo pra lhes dar atenção,tinha que correr ao supermercado e buscar meus irmãos na escola. Meus irmãos, meus três pestinhas,a razão pela qual eu ainda não desisti de viver. Eles são o que eu tenho de mais valioso,é com eles que eu tenho meus momentos de alegria,principalmente com a caçula,ela foi quem me fez lutar pra me manter viva nesses últimos 4 anos,só que nem seu lindo sorriso tem me feito ignorar o desejo de por um fim a tudo.
Mercado,ok! Buscar as crianças,ok! Dar almoço a elas,ok! Limpar o que sujamos,ok! Parece que enfim acabei tudo,penso em colocar um filme pra assistirmos mas o barulho do carro estacionando na garagem me faz congelar,ele chegou. Corro com as crianças pro quarto,coloco os três na cama e imploro que eles fiquem em silêncio até eu voltar,eles sabem o perigo de me desobedecerem então fecham os olhos e fingem estar dormindo,isso me dói profundamente. Saio do quarto e corro pra cozinha e um segundo depois ele entra cambaleando.
"- Cadê a minha comida?Por que meu prato não está servido a minha espera?" Grita o pai dos meus irmãos,ele está fedendo a álcool e cigarro.
"- Desculpe ela esfriou,eu retirei pra esquentar quando o senhor chegasse."
Ele resmunga algo que eu não consigo entender e se joga no sofá,liga a Tv e fica assistindo os esportes enquanto eu sirvo sua comida. Depois de almoçado,ele se levanta e vai ao quarto das crianças,torço pra que ele não os perceba acordados,não aguentaria ver meus irmãos apanharem de novo, por sorte deu tempo dos dois mais novos durmir,e o mais velho soube mentir bem,agora é só esperar o bêbado ir dormir e nós teremos algumas horas de paz. Uma hora depois ele dormia a sono aberto,e eu desabava em minha cama,eu não deveria estar chorando,se ele ou minha mãe perceberem que chorei eu vou estar ferrada,mas eu simplesmente não aguento mais tudo isso. Choro em silêncio até me acalmar,lavo meu rosto e vou até o quarto dos meus irmãos,eles tem que aproveitar a paz momentânea pra serem crianças,brincar,assistir desenho e tals. Enquanto eles brincavam eu imaginava como seria a vida sem eles,acho que a melhor coisa que a minha mãe ja fez na vida foi trazer meus irmãos ao mundo. As 18h dou banho nos três e sirvo um lanche aos mesmos,a qualquer momento a partir de agora o pai deles pode acordar ou nossa mãe chegar,então os coloco sentados no sofá assistindo desenho e arrumo tudo novamente,nada deve estar fora do lugar. Um tempo depois minha mãe chega e não está sozinha,o cunhado dela está junto,ela me manda arrumar as crianças porque iriam jantar na casa dos tios,depois vai pro quarto acordar o marido. Obviamente ela percebeu que ele havia bebido e então uma discussão entre eles dera início,arrumei meus irmãos sob o som de seus gritos,as crianças me olhavam assustadas e eu as tentava acalmar,porém era impossível ja que eu mesma estava nervosa,além de ter o cunhado da minha mãe me seguindo com os olhos,eu sabia que sobraria pra mim no fim daquela discussão,dito e feito,meia hora depois ela voltou gritando comigo.
"- Escondeu que ele estava bêbado por quê? Achou que ia sair ganhando com isso? Claro se ele bebe escondido,você pode fazer o que quiser dentro dessa casa,ele vai apagar e você vai poder sair fazer das suas sem que eles saiba não é? O máximo que vai acontecer é eu descobrir e cumprir minha promessa de acabar com ele,e é tudo que você quer,mas adivinha? Seu plano não deu certo. Nós vamos sair pra jantar em família, quando eu chegar eu quero as roupas do varal dobrada e passada,e vê se dessa vez faz direito,se mostre util pra alguma coisa. Se eu chegar e não estiver tudo pronto você se prepara." E dito isso ela saiu,com os meus irmãos seu marido e seu cunhado,quem olhar de fora diria que se trata de uma linda família feliz. Assim que o carro vira a esquina de casa me entrego novamente as lágrimas,choro de raiva,eu odeio ela,odeio ele,e odeio mais ainda o tio dos meus irmãos. Me engasgo várias vezes com o choro,enquanto choro faço o que me foi ordenado,em meio ao pranto termino tudo e então tenho tempo pra sofrer em paz. As vozes demoníacas gritam dentro de mim,pedem que eu de um basta em tudo isso. Que eu nos liberte. "É facil você sabe o que tem que fazer" é o que elas dizem. Meu celular apita,outra mensagem da minha mãe reafirmando suas ameaças do que me aconteceria se não estivesse tudo pronto quando ela chegasse em casa.
Por que ela não pode me tratar como filha? Como parte da família? Por que eu não mereço ter o carinho e o amor de mãe? Eu não aguento mais,a dor está insuportável,eu preciso fazer alguma coisa pra parar. Me desculpe irmãozinhos eu não sou forte o bastante,eu os amo mas não consigo mais. Entro no quarto do casal e pego uma sacola de remédios controlados que meu padrasto deveria tomar mas não toma. Abro todas as 4 caixas e debulho todos os comprimidos em cima da cama,pego a garrafa de vodka que eu escondo entre minhas coisas,sirvo um copo,encho a mão com os comprimidos e levo a boca,com a ajuda da vodka engulo e pego o restante dos remédios repetindo a cena anterior. Meu coração aperta,as vozes comemoram, e eu choro com mais vigor que antes. Esta feito,não da pra voltar atrás,mas eu não deveria ter sido tão egoista,meus irmãos vão ficar desprotegidos aqui. Pego uma roupa e vou pro banheiro tomar um banho,o porque eu não sei mas me deu vontade de tomar banho antes de morrer. De baixo da água quente meu choro chega ao ápice,nunca chorei tanto em minha vida,eu quero a paz,eu não me arrependo disso eu só estou com medo pelos meus pequenos,quem vai cuidar deles agora? Eu definitivamente não deveria ter pensado só em mim.
Meu coração começa a acelerar,dói muito,uma dor física,minha cabeça está latejando,meu corpo não se sustenta e eu caio no piso gelado do box, a água continua correndo sob meu corpo porém eu não sinto mais,minha boca está seca,minha língua formiga e meus olhos se fecham. A escuridão me consome,mas eu ainda estou viva,eu sinto meu coração batendo muito,muito forte. Agora é questão de minutos,em alguns minutos eu terei a minha tão sonhada paz. A dor no peito fica mais forte,sinto a superfície molhada e gelada abaixo de mim,sinto o calor das lágrimas,ouço o barulho da água escorrendo e então, silêncio. Tudo some e eu me entrego a esse momento.
"Perdão meus amores a mana não conseguiu ser forte por vocês. Lembrem que os amo muito"
Meu corpo fica leve e então acabou,eu não sinto mais nada.Game over!!
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O dia após meu suicídio.
General FictionÁgua fria,o piso gelado,os gritos de socorro, as lágrimas abundantes,uma decisão irreversível,e então o fim. Acabou,não tem mais volta. Eu estou morta. Capa feita pela talentosa May Akira.