- Dona Eunice, pode falar? Preciso de ajuda, essa porcaria desse Skype...
- Calma, doutor – Adiantou-se dona Eunice, que conhecia a implicância do chefe com a tecnologia. – Qual o problema do Skype?
- O problema, Eunice – Ele fez uma pausa, envergonhado. – O problema é que eu não sei onde eu botei o Skype, acho que eu destruí ele.
- Não dá para destruir o Skype, doutor – Ou será que dá? Ela hesitou por alguns segundos, antes de continuar – Me explica exatamente o que o senhor fez.
Ela trocou o telefone de orelha e ajustou o notebook no colo, devido a pandemia, agora ela podia trabalhar do sofá de casa. Privilégio de poucos, pensou ela. Doutor Facundo suspirou do outro lado, ela quase podia ver ele arrumando o bigode, como fazia toda vez que estava nervoso.
- Eu fui abrir o Skype, cliquei em cima e dei enter, só que errei a tecla e acho que apertei delete.
A gargalhada alta e desengonçada dela atravessou o telefone antes que ela pudesse conter-se.
- Onde tá a graça, Eunice? Eu preciso atender o Joaquim, da padaria, daqui a pouquinho, e destruí o Skype. O que vamos fazer? Você vai ligar para eles?
- Pro Skype?
- É.
Dessa vez ela conseguiu segurar a risada antes que ela chegasse do outro lado. Respirou fundo, se recompôs e partiu em socorro do velho bigodudo.
- O senhor não destruiu o Skype, doutor, só apagou o ícone.
- Certeza?
- Certeza, faz o que eu disser que vai dar tudo certo – Ela se ajeitou no sofá e fez o passo a passo junto com ele – Deu certo?
- Hum, deu, é, acho que deu, essa foi por pouco, hein?
- É, imagina se tivesse que indenizar o Skype por destruir o aplicativo deles, né?
O computador do doutor começou a apitar, alguém estava ligando.
- Engraçadinha, tenho que ir, acho que o Joaquim já está chamando.
- Chegou cedo, bom atendimento, doutor.
A linha ficou muda, ela sorriu e bebericou um gole de chá. Algumas coisas nunca iriam mudar.
***
Facundo demorou mais do que deveria para atender a chamada, tinha dedos grossos e curtos, difíceis de manusear o mouse e o teclado. Dona Eunice vivia dizendo que ele tinha implicância com a tecnologia, mas isso não era verdade. Tinham uma relação instável, mas amigável.
Quando finalmente conseguiu acertar o botãozinho verde, quem apareceu do outro lado não foi o seu Joaquim.
- Você não é o Joaquim da padaria – Disse ele.
- Ah, oi, doutor Facundo? Eu ouvi falar muito do senhor e...
- Desculpa amigo, mas eu tenho um atendimento agorinha, se você ligar para minha secretária ela pode agendar um horário...
- Não, por favor, você não está entendendo, é urgente!
O homem realmente parecia precisar de ajuda. Estava pálido, esquelético, o cabelo precisava de um corte e uma boa lavada, e a barba implorava por uma navalha. Ou duas.
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Dr. Facundo e os estranhos ocupantes do seu divã
Short StoryDr. Facundo é um psicólogo famoso por atender os mais estranhos pacientes do planeta. Quer agendar a sua consulta?