Uma dor terrível fez Antarah recuperar os sentidos; estava num lugar luminoso, um rosto desconhecido o encarava.
— Escuta? — indagou uma voz abafada.
Antarah fez que sim. Olhou para as queimaduras que cobriam seus braços e se perguntou como aquilo havia acontecido. Suas memórias mais recentes pareciam confusas e irreais – havia o monstro na floresta, e aquele estrondo quando chegou em casa. Mas e depois? Por um momento questionou-se se não havia morrido e aquela era a outra vida.
— Onde eu estou? — perguntou ao desconhecido parado ao lado dele.
Não obteve resposta. Mirou o espaço: estava num salão amplo e claro, mas sem janelas, havia uma fileira de camas idênticas e Antarah estava deitado em uma delas.
O estranho que o encarava chamou sua atenção. Era um homem magro, de roupas cândidas, assim como cada detalhe naquele lugar.
— Nome. Seu nome.
— Antarah.
— Mohammed. Médico da pele — apresentou-se o homem.
Antarah pensou por uns instantes.
— Estou num hospital?
Mohammed fez um sinal sutil em confirmação, estava focado nas queimaduras de Antarah, analisando-as e procurando-as por baixo dos lençóis e roupa que cobriam o corpo do garoto.
Antarah nunca havia estado num hospital ou visto um médico antes, mas sabia que usavam agulhas e ervas e pequenas lâminas; por isso, sobressaltou-se assustado quando Mohammed lambeu a palma da mão e fez menção de tocar uma queimadura.
— Quê isso? — exclamou, esquivando-se. Sentiu uma pontada dolorosa na perna esquerda ao se mexer.
Mohammed apenas bufou e tomou à força o braço de Antarah, deitando a mão com saliva sobre a queimadura. O rosto de Antarah se contorceu em asco.
Depois de alguns minutos, Mohammed retirou a mão e revelou com uma expressão orgulhosa: a queimadura havia desaparecido, dando lugar a uma pequena cicatriz rosada.
Antarah estava incrédulo, passou os dedos sobre a pele inegavelmente restaurada.
— Como... como você fez isso?
Com os braços cruzados sobre o peito, Mohammed sorriu envaidecido como resposta. Depois focou-se em curar as queimaduras restantes. Antarah não fez resistência, qualquer coisa que atenuasse suas dores serviria.
— Estou louco — sussurrou Antarah para si mesmo, com um riso tenso. — Primeiro um monstro na floresta, agora tem um estranho me curando com cuspe.
Vasculhou os outros pacientes nas camas aos lados, ninguém de sua família estava entre eles. Um pensamento ruim lhe veio a mente, causando calafrios. Negou-o imediatamente. Estava tudo bem. Eles estavam bem, em algum outro lugar.
No teto, havia uma porção de afrescos apagados pelo tempo. No centro, um sol dourado e redondo com uma frase no meio que dizia: "Cuida, e destruirá o mal". Ao redor do sol, havia uma sequência de ilustrações de pessoas fazendo as mais curiosas coisas: desde ler uma pilha de livros, até carregar um esqueleto, ou encher uma taça com sangue que jorrava do nariz de outra pessoa. Antarah não pode evitar achar as pinturas cômicas e questionar-se ainda mais sobre o estranho hospital e como havia parado lá. A essa altura, Mohammed já havia terminado seu trabalho e ido embora sem dizer uma palavra sequer. No lugar do médico, surgiu uma mulher bonita e gorda, com um sorriso acalentador.
— Marhabá¹ — cumprimentou ela, suas vestes eram idênticas às de Mohammed, mas sua aura completamente oposta. — Me chamo Abla, sou a médica dos ossos e vim cuidar de você! Qual o seu nome?
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A Arte da Caça
FantasyNo Líbano, uma sociedade secreta centenária se dedica à caçar Ifrites - monstros carnívoros invisíveis capazes de controlar os elementos da natureza. Numa noite, Antarah, um humano, tem sua família devorada por Ifrites; e Ventania, uma Ifrite, esca...