QUATRO DIAS

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"Se existe algo mais sublime que a capacidade de amar, só pode ser o amor por si só."
--- Desconhecido.

Ontem depois de chegar em casa, extremamente cansada, como se eu tivesse feito uma série de exercícios só tomei uma ducha e caí na cama.
Assim que acordei, senti uma preguiça incrível e uma vontade de ficar na minha caminha. Mas, minha mãe me gritou pra fazer as coisas.
Tudo me fazia ficar tranquila. Eu tava tão suave, mas tão suave que se alguém tentasse me irritar eu não daria atenção alguma. Talvez fosse pelo clima frio e a garoa fina que caía lá fora, ou talvez fosse porque eu só estava em paz comigo mesma.
Era de tarde quando mandei mensagem pro Edu.

---- E aí. Tudo suave?
Visualizado.

---- Oii. Sim e com você?
Visualizado.

---- Tô bem sim. Escolheu o que a gente vai fazer hoje??
Visualizado.

---- Ss.
E sobre isso tem uma coisa q eu tenho que avisar...
Visualizado.

---- Manda.
Visualizado.

---- Uma amiga minha tá de passagem pela cidade e perguntou se a gnt podia ir com ela...
Visualizado.

---- "A GNT" vc né?! O q tu disse?
Visualizado.

---- Q A GNT ia sim e q VC vai com a gnt.-- visualizado.

---- Tá. N me culpe se ela me achar chata.-- visualizado.

---- Ela nn vai te acjar chata
Achar*-- visualizado.

---- Que Odin me abençoe com bastante paciência. Amém.
Que hrs nós vai?-- visualizado.

---- 18h00.
Ok?-- visualizado.

-

--- Ok.-- visualizado.
Offline.


Seria muita bênção divina se o dia fosse 100% bom. Então comecei a achar que aquela era a uva passa do meu arroz e poucas pessoas gostam de uvas passas no arroz.
Me deitei na minha cama, ouvindo música pelos fones. "...Eu teria ficado em casa, pois eu estava melhor sozinha..." cantava Dua lipa num ritmo bem festeiro. Uma música que eu achei que se encaixava perfeitamente no meu caso. "... Estou me apaixonando por aquele que pode partir meu coração?..." Sim estava, completamente lascada. Sentia isso nos meus ossos, sempre que ele dizia que eu tava "Ok" ou me mantinha afastada dele. Mas, vida que segue. Deixei de pensar nisso e fui desenhar. Tentei fazer algo bonito mas, nada me agradou. Quando vi já eram 17 horas. Corri pro banho e depois escolhi um moletom cinza com estampa da Docinho e uma calça comprida pra ficar quentinha.
Desci pra avisar minha mãe que ia sair com o Edu e uma amiga dele. Pouco tempo depois ele chegou.
---- Oi...-- disse me olhando de cima a baixo. Sorri pra ele e respondi:
---- Oi. Onde tá sua amiga?
---- Ela tá...-- fez uma pausa, como se estivesse faltando algo. Arqueei uma sobrancelha e então ele continuou.--- Ela tá na praça. Esperando a gente.-- concluiu
---- Ah, tá. Vamo então?-- disse fechando o portão e começando a caminhar do lado dele. Estavamos em silêncio, vez ou outra ele me olhava um pouco envergonhado? E eu o sorria.
---- Ali tá ela.-- disse apontando pra uma garota de cabelo liso, pele clarinha, olhinho puxado, parecia uma idol. Caminhamos até ela.
Assim que chegamos lá. Ela agarrou o braço dele e despejou uma tonelada de assunto, com umas cinquenta perguntas cada e ele ainda tinha que justificar a resposta. Fiquei calada só vendo eles conversarem e rirem de uma forma que ele nunca havia feito quando estava só COMIGO.
Peguei o celular e abri o Twitter me distraindo um pouco. Logo em seguida parece que não tinha mais nada e eu o bloqueei, guardando o celular no bolso. Quando o Edu me fez uma pergunta.
---- Qual a melhor série que você já viu?-- perguntou me olhando. Suas mãos ainda estavam no bolso do moletom e a menina ainda estava agarrada no braço dele, agora me olhando.
"A série de erros da minha vida." pensei. Ponderei um pouco, pensando em todas as poucas séries que já havia visto e nenhuma delas fora boa o bastante pra mim.
---- Você sabe como eu sou.-- foi tudo o que respondi e ele entendeu. Confirmando com um aceno. Isso foi o suficiente pra fazer a menina ficar irritada.
---- Isso não é resposta!-- exclamou e eu nem me dignei a iniciar um debate. Ainda estava suave demais pra me irritar.
---- Ela não gosta muito de séries, sempre preferiu filmes, sagas e animes.-- Edu respondeu  por mim. O que foi o ápice do estresse dela.
---- Eu tava falando com ela.-- disse a uva fazendo bico e Edu riu dela.

---- Olha pra ela.-- eles me olharam e eu subi o capuz pra esconder minha vergonha e irritação.
---- Quê que tem?-- indagou curiosa.
---- Parece que ela ia responder sua pergunta?-- respondeu com uma retórica. Então voltaram a conversar algo sobre Game of thrones e The Witcher. Eu estava só olhando o pessoal passando por nós. Me sentindo a própria estátua da liberdade, segurando uma tocha. Quando percebi que o tio do algodão doce estava na praça de novo e não consegui evitar sorrir.
---- Você quer um?-- perguntou Edu, me deixando impressionada. Então ele estava olhando na mesma direção que eu? Ele estava prestando atenção em mim também! Fiquei mais feliz.
---- Uhum. Mas, tô sem dinheiro.-- disse sorrindo e ele sorriu pra mim.
---- Vou comprar lá. Você quer também?-- perguntou a Uva passa e ela fez uma cara cómica.
---- Quê?-- perguntou confusa.
---- Algodão doce.-- respondi a pergunta dela. Ela negou com um aceno de cabeça.
Ele se levantou e foi até o tiozinho. Deixando apenas nós duas. Me senti numa arena de leões da roma antiga. Parecia que ela ia me matar a qualquer momento. Ela não gostava de mim e deixava o descontentamento dela para comigo bem explícito.
---- Vocês namoram?-- perguntou. Neguei com um aceno.---- Então são só "amigos"?-- desenhou aspas no ar e eu não soube o que responder.--- Você gosta dele?-- perguntou como se não fosse óbvio e eu só continuei calada. Logo ela se calou também e Edu já estava próximo a nós duas, quando ela correu e se jogou nos braços dele, o abraçando fortemente . Virei o rosto para ignorar aquela cena. Ó Odin, porque soltastes Locky antes da hora? Dai-me paciência, porque se der força eu arrasto a cara dela na praça. Pedia mentalmente aos deuses, até que meu celular tocou. Tirei ele do bolso e quando voltei a atenção ao Edu ele estava meio concentrado em beijar a menina. Parece que ele gostava de uva passa. Me levantei, atendendo o celular e indo até a cafeteria.
---- Oi.-- disse esperando a outra pessoa me responder.
---- Oi. Tá tudo bem contigo? Quanto tempo. Tô morrendo de saudade.-- respondeu animado. Fazia tempo que eu não conversava com ele. Ele se tornou meu melhor amigo e pouco mais de um ano havia se mudado pra Brasília.
---- Mais ou menos e por aí? Como tá o Gregory e o Gael?-- perguntei.
---- Tá todo mundo bem por aqui. Porquê "mais ou menos"? Algum problema?--- seu tom de voz parecia mais preocupado.
---- Problemas com um crush que não me crusha. Mas, eu vou...-- fui interrompida. Alguém tinha puxado minha manga me fazendo olhar pra trás.
---- Espera. Por favor.-- pediu, seu olhar estava desnorteado e parecia que ele queria se desculpar do pior erro que cometera. Não sei.
---- Hm.-- disse.
---- Alô? Tu ainda tá aí? Me conta carai. Tô curioso.-- meu amigo falando e eu o ouvia pelo fone.
---- Aquilo... Desculpa.-- disse por fim, olhando pra baixo com tristeza?
---- Tudo bem.-- respondi sorrindo o mais amável possível para que ele não ficasse triste na minha frente.--- Foi só um beijo. Não foi como eu imaginei e eu nem tava preparada pra algo assim ainda, até porque não foi comigo, então foi um pouco difícil aceitar.-- concluí.
---- Foi errado! Não diga que tá tudo bem, se as coisas não estão!-- ele esbravejou me dando uma bronca. Ele errou e agora briga comigo?
---- O que você quer que eu faça?-- perguntei e ele ficou calado.--- Me responde! Quer que eu diga que eu fiquei triste por você ter beijado outra garota? Você sabe que eu fiquei! Quer que eu te xingue ou xingue ela por isso? O que te faz acreditar que eu já não xinguei mentalmente?-- disse sem gritar, porém completamente irritada com ele. Ele me olhava surpreso.
---- Eu nunca sei o que se passa na sua mente...-- falou desviando o olhar e coçando a nuca.
---- Você.-- disse e me virei. Não queria que ele visse prestes a chorar.--- O que eu sinto por você não vai mudar do dia pra noite, e eu não quero que você ache que meu amor é fraco o suficiente pra desabar depois de um erro...-- fiz uma pausa respirando fundo e engolindo o choro.--- Eu só preciso ficar sozinha um instante.
---- Eu não queria.-- ele disse e eu fiquei perdida. Ele enfim estava negando meus sentimentos?--- Digo... Eu não queria aquele beijo. Eu vou deixar ela em casa, quando você se sentir melhor você vai...-- ele deixou a frase morrer ali. Talvez tivesse se achando egoísta demais.
---- Eu mando mensagem. Ainda temos dois dias.-- disse e entrei na cafeteria. Me sentei e pedi um chocolate quente, assim que a garçonete trouxe eu bebi. Bebi o chocolate e minhas lágrimas. Engolindo toda aquela história.

SEIS DIASOnde histórias criam vida. Descubra agora