Triângulo

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Irene caminhava sozinha pelos corredores da firma. Já passava das 22 horas e o silêncio reinava absoluto por ali. Com toda a diligência de quem está habituado, ela foi desligando os aparelhos desnecessários e as luzes até chegar na saída principal do escritório.

Fechou tudo e colocou o alarme. Tomou então o elevador para descer até a recepção do prédio comercial. A guarda da noite, Cilene, lhe acenou de longe enquanto Irene verificava o horário do ônibus.

Seu aplicativo de conversas estava cheio de notificações. Muita coisa inútil, como fotos de comida no grupo de família e piadinhas no grupo dos amigos da já terminada faculdade. Porém, uma entre algumas mensagens privadas lhe chamaram atenção.

Abriu o chat com Renata e leu o que tinha recebido

[Renata]: Hoje encontrei o Roberto outra vez no horário de almoço! Claro que falei de você pra ele

[Renata]: Ele pareceu bastante animado quando falei que o pessoal está combinando um barzinho na quinzena

[Renata]: Você vai ir, não vai? Ele vai aparecer de certo lá

Irene saiu da portaria e atravessou a rua logo antes do ônibus chegar na avenida já vazia pelo tardar da hora. Pegou a linha que levava direto para casa e sentou-se num banco próximo do cobrador. Pegou o celular e releu as mensagens recebidas de Renata.

Com um suspiro, Irene apertou os olhos e se forçou a digitar a resposta que julgava mais adequada.

[Irene]: Você fica falando demais de mim pra ele

[Irene]: Tá na cara que ele quer é se encontrar com você no dia do barzinho, sua boba

[Irene]: Devia investir logo

Fechou o aplicativo e colocou os fones de ouvido, preenchendo-se com uma de suas músicas pop preferidas do momento. Bem agitada, bem romântica e um tanto melancólica. Combinava perfeitamente com o que ela sentia naquele momento.

Enfiada até o pescoço em um triângulo amoroso sem solução. Se pelo menos conseguisse fazer Renata entender...

Uma nova notificação lhe despertou dos pensamentos. Era uma resposta.

[Renata]: Deixa de ser besta. É óbvio que o Roberto sempre foi afim de você

[Renata]: Estou só tentando te ajudar

[Renata]: A ter mais coragem

[Renata]: Se continuar enrolando vai colocar tudo a perder

Isso era verdade. Irene não tinha coragem, nunca tivera. Sempre evitara ao máximo se colocar naquele tipo de situação, uma situação onde tudo dependia apenas dela e de ter coragem. Pois não tinha. Talvez nunca fosse ter.

Mas se continuasse fugindo... Se continuasse negando... Iria acabar colocando tudo a perder.

Então...

Talvez?

[Irene]: Você tem razão

[Renata]: Estou te dizendo

[Renata]: Só quero sua felicidade

[Renata]: Amiga

Irene olhou para fora do ônibus. Ainda tinha alguns minutos até que passasse da parada do condomínio onde a amiga de escola e faculdade morava.

[Irene]: Sua mãe tá em casa?

[Renata]: Minha mãe? Não, te falei que ela foi ficar com o José

[Renata]: Pq?

[Irene]: Posso passar aí?

[Renata]: Agora?

[Irene]: É

[Renata]: Claro, mas pq?

[Renata]: ...

[Renata]: É sobre o Roberto?

[Irene]: .... é sim

[Irene]: Tbm

[Renata]: tá bom, claro, vem sim

[Renata]: tô aqui pra te ouvir

Irene hesitou em digitar a reposta que veio à sua cabeça. Ao invés disso falou sem voz, apenas com o movimento dos lábios

"Espero que sim. Não terei coragem de falar isso duas vezes."

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