Perfeição em palavra

O encontro de desencontrados

"De agora em diante tudo irá exigir uma decisão, assim como toda ação uma responsabilidade." Falava, Ana Julia pontualmente as 6:00 da segunda-feira na sua crônica semanal, ela que era formada em filosofia e jornalismo, logo em seguida continuou: "É incrível, como a existência é ao mesmo tempo tão sólida e líquida, agimos de tantas maneiras, mas nem sabemos o por que. Por que agir? Por que pensar? Suponho que agimos por que pensamos e pensamos por que existimos. Mas o que sustenta a existência é a própria inexistência, agimos por que sabemos que até o nada é alguma coisa e temos medo desse nada, alguma coisa, medo do inexistir..." Ela falou ainda mais coisas às 6:00, mesmo horário que pontualmente e diariamente Breno ligava a tv para se informar, enquanto se arrumava para mais um dia de atividades rotineiras.

Esse tinha tudo para ser apenas mais um dia, comum, até que Ana Julia falou: "A cidade de Ibamara será sede do 'Time IA programming' o maior desafio de programação de IA da região" ninguém sabia, nem mesmo Breno, que esse iria mudar não só os rumos da cidade, mas como a vida dele e todos os que assim como Breno, escreviam livros.

Mas, isso ficará pra depois, vamos nos prender a essa manchete: "A cidade de Ibamara será sede do 'Time IA programming' o maior desafio de programação de IA da região". Ela será vista sob muitas perspectivas, um leigo como eu, acharia algo muito legal pensar em um evento de tamanha notoriedade em nossa cidade. Ana Julia viu algo com um olhar mais social, Breno mais filosófico, Marcos como uma tremenda oportunidade e, por fim, Isaac como uma forma de lucrar ainda mais.

Mas iremos falar disso uma outra hora, agora vamos para uma pergunta que deve estar se fazendo: "Quem sou eu? Com quem estou falando?" e lhe respondo com algo simples e discreto "Sou apenas um caderno, e meus membros uma folha de papel" isso mesmo, eu sei tudo, ao mesmo tempo que não sei nada, tudo fica armazenado em mim, ah não ser que me jogue fora ou tenha uma borracha.

Agora, chega de falar de mim, vamos entender por que isso mudou os rumos dessa cidadezinha:

Em primeiro ponto, Ibamara é uma cidade média que fica perto de Lakamayara, capital da região. Por Lakamayara, ser maior os grandes eventos sempre acabam indo pra lá. Desse modo, fica óbvio por que esse evento é tão importante para a cidade.

Em segundo ponto, Ibamara é o ponto de encontro de vários escritores, pensadores acadêmicos e editoras, aqui fica a sede da TermiBook, cujo o dono é Isaac, e também da IdeBook, cujo donos é uma equipe de pessoas formadas em letras e trabalham com correções de texto, diferentemente do Isaac que escolhe firmar acordos com escritores e fazer com que ele deixe tudo necessário pra publicação em troca esses escritores escrevem, o acordo também defini que livros escritos por eles só podem ser publicados pela TermiBook, o principal escritor deles é Breno, que anteriormente foi apresentado.

Em terceiro ponto, Isaac é reconhecido por sua desfreada busca impensada em lucrar com a TermiBook, dizem que a casa onde ele mora é a mais barata possível e que a única coisa que ele se preocupa além do dinheiro é de manter todo dentro dos parâmetros legais, nesse ponto a TermiBook não pode reclamar, os profissionais são muito bem assalariados e com seus direitos extremamente reconhecidos, mas em troca eles produzem bastante e aquela equipe de mais ou menos 15 escritores é capaz de publicar um livro a cada 3 dias, admito que é algo incrível.

Nesse ponto, já compreende o quão bela é a vida de meu dono, o Breno, ele escreve textos e me usa pra tudo, em todos os lugares estou lá com ele, escrevendo, apagando, corrigindo, tendo ideias maneiras, algumas consolidadas e outras não, é uma pena que quando falo com ele, ele não me responde. Mas vou prosseguindo e um dia irei de conseguir conversar com ele.

Pronto, já deu 8:00 esse é o horário que Breno sai pra ir trabalhar, nesse momento, ele vai descer de elevador com um sorriso na boca e dando "oi!" ou "bom dia!" para todos, acho irônico que ele responde a todos que falam com ele menos o seu próprio livro que está sempre com ele. As 8:30 ele chega na TermiBook e vai logo conversar com a secretária do Isaac para saber qual a boa de hoje, porém, hoje em específico ela não foi e no lugar estava o próprio Isaac, com um olhar tenebroso e disse: "Quero conversar contigo!" Era algo importante, por isso Breno me colocou na mochila e foi falar com ele, por ser algo muito fechado, não ouvi o que eles conversaram, mas no final Breno foi reflexivo e passou direto pela secretaria que estava chegando atrasada e ele nem respondeu o "bom dia" dela, tentei mas ela também me ignorou ainda ficou com uma cara tipo "O que aconteceu com ele?".

Nós passamos por uma sala, que era a sala do TI, a TermiBook escrevia muitos livros por isso era necessária um viés naqueles computadores bonitos, cujos jamais consegui compreender como seria possível escrever numa folha em branco sem caneta, lápis ou ter que folear. Dessa sala, surgiu uma pessoa, cujo o nome era Marcos, trabalhava ali e pediu para que Breno cuidasse da sala enquanto ele iria ter que dar uma saída, sempre muito educado Breno prontamente aceitou e entrou na sala. O que nós não imaginávamos é que ele estava indo na sala de Isaac, pedir pra sair um pouco mais cedo para poder se inscreve no 'Time IA programming'. Mas, quem iria imaginar que ele seria alguém tão bom no que faz?

Marcos retornou, eles conversaram por umas meia hora, viraram até que amigos, já que o livro "O amanhã do ontem" escrito por Breno era o livro favorito de Marcos, inclusive esse também é meu livro favorito. Agora Breno está indo pra sala, nesse momento ele me coloca na mesa e liga essa máquina de caráter duvidoso que escreve sem caneta. Agora enquanto sou esquecido por Breno, vamos falar sobre essa obra, ela é incrível, nela Breno faz reflexões sobre como o ontem e o hoje são coisas ao mesmo tempo tão próximas e distantes, como o ontem interfere no hoje e etc.

A hora do almoço chegou, agora Breno desliga essa coisa, fecha a mochila, se levanta e se alonga, me pega na mão, passa pela sala de TI fala com Marcos, depois cumprimenta a secretária e vai pro restaurante que fica ali perto. No restaurante ele toma todo o cuidado comigo, me coloca nem tão longe e nem tão perto, para que ele seja capaz de escrever em mim se pensar em algo, ao mesmo tempo que me mantêm limpo.

Depois do almoço ele passa em casa, vai no banheiro, um lugar que eu não vou, mas sei para que serve, depois de ir no banheiro ele me pega junto com a mochila e vai com passos acelerados para o trabalho, incrível como todo dia pós almoço ele é capaz de quase se atrasar, chegando no trabalho ele novamente fala com todos dali, ele sempre preza pela boa convivência com quem está ao seu redor, eu que conheço bem ele, sei que por algum motivo foi abatido pela conversa com Isaac, ainda não sei como nem por que, mas irei de descobrir.

Sentado na mesa, usando aquela coisa estava o melhor escritor da cidade, até que de repente toca uma outra máquina, a qual chamam de celular, ele nem olhou pra mim só saiu da sala e foi atender. Só sei que quando ele voltou estava levemente mais feliz e falava que naquela noite ele teria um encontro. Certamente, não sei o que é isso, por que nem mesmo um escritor consagrado, leva cadernos para esse tipo de evento, suponho que pela alegria e pela forma de falar seja algum evento importante ou premiações.

Por volta de umas 16:30, a secretaria passou pelas salas levando consigo cafés e bolinhos, como fazia todos os dias, ali era incrível, por que além dos bolinhos ela levava uma flores e dizia "Ajuda a manter os livros vivos" não sei o que queria dizer, só sei que tinham um cheiro incrível e me sentia fortalecido ao cheirar, Breno levava todos os dias para casa e eu passava a noite inteira sentindo esse cheiro.

Porém, hoje em específico, aconteceu algo muito ruim, aquele tal encontro mexeu com o motivo de minha existência de tal forma, que ele acabou por me trocar por um objeto da mesa que estava perto de mim. Ele estava feliz, animado e com pressa só pegou o objeto e colocou na mochila sem olhar. Tentei gritar para avisar que estava sendo esquecido, porém foi tudo em vão e ele se foi sem mim.

Nesse dia descobri que todas as noites antes de fechar a secretaria junto com Isaac iam de sala em sala, verificar se algo foi esquecido ou se estava sujo. Ao chegarem na minha sala, logo me viram, com uma boa escolha, a secretária me pegou na mão e afirmou que Breno me esqueceu, Isaac me pegou, apesar que eu tenha ficado todo arrepiado lembrando das fervorosas histórias que rondava a vida dele, ele me pegou e disse que levaria pra Breno.

Ele me pegou na mão e foi pra casa de Breno, porém ao chegar lá estranhamente Breno não estava. Ele pegou na outra mão aquela máquina que fez meu dono me abandonar pela noticia de um tal encontro. Ele ficou como se conversasse sozinho, falando o nome "Breno" algumas vezes e guardou o celular após falar "Tudo bem, vou levar pra casa e amanhã lhe dou." Só sei que a partir dali Isaac seguiu pra sua casa e eu logo pensei que seria a pior noite da minha vida.