Capítulo Único

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Devo começar dizendo que você está simplesmente linda. Mesmo com seu cabelo bagunçado pela brisa do mar e um simples conjunto de short, blusa e sandálias de dedo. Mesmo com a ponta do nariz descascando do sol e o tom avermelhado da pele em alguns lugares onde a roupa não cobriu. Você está.

Eu nunca tive o prazer de passar meus dedos entre os fios do seu cabelo, nem ver o que você esconde por baixo dessas roupas tão simples. Nunca beijei a ponta do seu nariz ou qualquer parte do seu corpo além do rosto. Mas mesmo assim... mesmo assim me reservo o direto de dizer que você está linda.

Você é linda.

Apesar de toda essa observação a despeito dessa beleza tão sua, a primeira coisa que meus olhos captam quando te vêm são seus dedos de unhas pintadas em um azul clarinho, fincados na areia, revirando-a como se estivesse desenterrando um tesouro.

Eu quase desejo que você não o encontre.

Não encontre, por favor.

Por favor.

Você está tão concentrada na tarefa, o cenho franzido, os olhos estreitos e a boca cerrada. Pareceria até mesmo brava, não fosse a pequena curva no canto dos lábios que denuncia um sorriso escondido e o brilho da curiosidade em seus olhos comprimidos.

Não encontre. Deixe que se perda nessas areias.

Levanta-se, diga que está cansada dessa brincadeira e corra para o mar.

Só...

Só não encontre.

Por um breve momento sua expressão de concentração me leva de volta no tempo, transportando-me para quatro anos atrás, quando estávamos no colegial e eu te vi pela primeira vez. Quando meus olhos esquadrinharam cada pedacinho do seu rosto e percebi que aquilo era o que as pessoas chamavam de amor à primeira vista.

Os sentimentos ainda são os mesmos até hoje.

Não encontre. Não encontre.

Sou trazido de volta pelo som tímido do que seria uma risada de contentamento do meu melhor amigo, que está sentado ao meu lado na varanda apreciando o mesmo show. Ele também está feliz e seus olhos refletem o que as palavras não dizem.

Você encontrou o tesouro, no fim das contas.

Por favor...

O que você tanto procurava trata-se de uma joia, cuja tal eu ajudei a escolher. Você ergue a cabeça e seus olhos encontram a varanda, poucos metros à sua frente, e meu coração para uma batida apenas com a visão do seu sorriso incandescente que remete nada mais que felicidade.

Como você é linda!

Sim, você é.

Mas eu sei da realidade, eu sei que você não está olhando para mim. Seu sorriso não é meu e tampouco é para os meus braços que você corre quando se ergue do chão e pega a pequena caixinha vermelha, antes lustrosa, mas agora suja de areia.

E percebo o quanto fui tolo de pensar que nada sentiria quando chegasse o momento. Como se o fato de eu ter ido ajuda-lo a comprar o anel e o ouvido falar de você a viagem toda fosse fazer com que doesse menos.

Não dói menos.

O engraçado de tudo isso é que eu sei que ele também te ama. Eu sei, pois há quatro anos ele te viu pela primeira vez. Ele esquadrinhou seu rosto detalhadamente. Ele soube que era amor à primeira vista. E ele me disse. Foi a primeira e única vez que ele revelou seus sentimentos assim tão abertamente.

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