Todas as luzes da cidade.

JUSTIN

Sinto uma forte pontada na cabeça quando a claridade invade o quarto, passo alguns segundos lutando contra o sono antes de conseguir abrir os olhos por completo. Minha cabeça lateja ainda mais forte quando levanto o corpo da cama, estou completamente suado. Por alguns segundos a ideia de fugir do treino se torna real em minha mente, mas desisto assim que lembro que o jogo contra os Vixens é daqui a uma semana e também porque sei que o treinador não compraria nenhuma mentira sabendo da festa de ontem.

Entro embaixo do chuveiro deixando todo o trabalho de me manter acordado no choque térmico que a água gelada dá em meu corpo assim que escorre por ele. Passo alguns segundos imerso na esperança de que a dor de cabeça desapareça quando sair dali. Espero que Jeremy ainda não tenha chegado de viagem porque duvido muito que Celeste já tenha organizado toda a bagunça do andar de baixo. Aparentemente, só o meu quarto foi capaz de sobreviver. E parando um pouco para pensar, não sei porque ainda me preocupo com a presença dele, a casa estando de pé ou não, ele sequer se importaria.

Meu pai e eu mal nos vemos durante a semana, posso contar três dias durante todo esse mês que tive o privilégio de ver sua cabeça careca desfilando pela sala de estar, caminhando com suas malas pesadas apressado para uma nova viagem. Desde a separação tem sido assim, Jeremy viajando a negócios e Pattie voltando a aproveitar sua vida, o que não é ruim de fato, gosto que cada um esteja ocupando sua mente com o que realmente importa. 

Com o tempo, acabei me acostumando a estar sozinho.

Termino de me arrumar alguns minutos depois e quando desço as escadas tenho a boa notícia de que tudo já está em seu devido lugar, mas o que de fato me alegra é o cheiro de café fresco e a voz desafinada de Celeste vindo direto da cozinha. Celeste é corpulenta e tem os braços gorduchos mais lindos que já vi, ela veste um avental azul enquanto dança animada pela cozinha cantarolando uma música de James Morrison. Quando me vê, um sorriso largo se desenha em seus lábios e como de costume eu faço uma reverência a convidando para dançar.

Nós bailamos pela cozinha antes da música acabar com a gargalhada alta de Celeste. Esse é o resumo de meus dias desde que tenho dez anos e minha mãe precisou trabalhar na mesma proporção do meu pai, somos eu e Celeste contra o mundo.

— Sei que hoje tem treino, então fiz seu suco preferido e a saladinha de frutas que você adora. — Celeste diz com afeto empurrando vagarosamente a comida em minha direção quando sento na mesa.

— Céuzinha, o que seria de mim sem você?

— Nada. — ela responde convencida, apertando meu nariz como fazia quando eu era uma criança — Não esqueça de ligar para o seu pai antes de ir.

— Por favor, Celeste. Jeremy não vai querer receber uma ligação pra saber se estou vivo. Notícia ruim corre rápido, ele sabe disso.

— Ligue pro seu pai antes de ir para a escola ou eu vou esfregar o seu celular no vômito de seus amigos. — Ela ameaça apontando seu dedo indicador em minha direção, sempre fez isso, tentou manter o contato mínimo entre eu e meu pai. Algumas vezes a própria Celeste ligava pra ele e passava para mim afirmando que Jeremy que havia ligado para saber como tinha sido o jogo da noite anterior. — Por Deus, por que ainda insistem em beber se sempre passam mal?  

— Desculpa, Céu. Te amo, Céu. — digo apressado antes de sair correndo da cozinha, já estou três minutos atrasado para o treino, perdi muito tempo conversando enquanto deveria estar a caminho da escola. Sequer tive tempo de olhar o celular aquela manhã.

Envio uma mensagem rápida para Jeremy antes de começar a dirigir: "Bom dia, pai. Passando pra avisar que ainda estou vivo."

Ele visualiza, mas não responde. Nada de novo sob o sol.