Aquele que nunca morreu

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     No berço da civilização, no local cercado por dois rios, onde tâmaras cresciam nos oásis ao longe se erguia uma cidade cujo o nome era pequeno, mas sua sabedoria era grandiosa.
     Nesse lugar existia uma família cujo o nome foi esquecido pelo tempo mas que era conhecida pela sua longevidade que excedia a de qualquer outra pessoa, alguns da família alcançavam a marca dos oitenta anos com a disposição de um jove de 15 anos! E isso fez com que essa família tivesse a atenção do rei, e essa atenção evoluiu para uma amizade que garantia os membros da família privilégios invejados por todos os outros cidadãos do local.
     Certo dia, um jovem da família chamado Askar se encontrou com uma senhora que lhe pediu um pedaço do pão que ele comia, ele recusou, e além disso a humilhou pelo fato de não poder comprar o próprio pão, até que a senhora gritou com toda força em seus pulmões:

-Acha mesmo que pode me humilhar por motivo tão banal???? Pois bem, agora eu lhe tiro os seus privilégios da sua família!! A partir de hoje os homens da sua família não viveram mais do que 25 anos!!! Vocês irão desaparecer lentamente até não restar mais ninguém!!!

     O jovem Askar simplesmente a ignorou e continuou seu caminho, mas na meia noite do dia seguinte, exatamente no seu aniversário de 25 anos ele caiu morto ao chão, e o mesmo aconteceu com os seu irmãos e seus filhos, e assim a família diminuiu e perdeu os seus privilégios. A partir daí eles vagaram pelas terras vazias de um mundo ainda não tão explorado por gerações. Notou-se também que a maldição não afetou apenas os homens, mas sim as mulheres, que mantinham sua grande longevidade mas que não aguentavam ver seus filhos, netos e maridos morrerem tão cedo, e acabavam se matando de tristeza por causa disso.
     Décadas, séculos e milênios se passaram e a família que já nem preservava seu sobrenome original ainda passava a história de Askar pela frente e como isso havia os colocado na posição que se encontravam, e com isso eles se tornaram cada vez mais gentis com medo da pena que já haviam até se conformado ficar pior. Até que em uma pequena vila fundada por irmãos que diziam ter sido criados por lobos, nasceu alguém que escaparia desse ciclo.
     Na família havia nascido um garoto que já mostrava uma inteligência acima da média que ao contrário dos outros não se conformava com a ideia de ter a morte o esperando onde esperava seus antecessores, começou a bolar um plano para escapar dela. E quando completou 25 anos, ele estava sentado em uma cadeira, olhando para a Lua esperando para que ela se encontra se bem ao meio do céu sabendo que a morte estaria ali, e ele estava certo afinal, a própria agora marchava em direção a ele, mas quando ela se aproximou ele sorriu com um sorriso malandro, olhou nos olhos dela e disse:

-Pare aí mesmo, eu tenho uma proposta

A morte parou curiosa:

-Proposta? Qual seria?

O jovem sorriu com um sorriso ainda mais malandro:

-Bom, você tem andado ao lado da minha família a gerações certo?

-Não posso dizer a quantos anos pois isso foi inventado por vocês humanos, mas sim eu acompanho vocês a muito tempo mesmo

-Eis então a proposta, você já deve ter se cansado de sempre ter que nos buscar na mesma hora por tanto tempo, então por que não fazemos algo diferente?

-Algo diferente?

-Sim, afinal tem alguém muito especial com quem quero morrer ao lado

A morte olhou em volta pensativa por algum tempo, então olhou de volta para o jovem:

-Pode ser, agora me diga quem é essa pessoa que você acha tão especial e eu te posso te garantir que só morrerá quando ela morrer

O jovem deu uma curta risada de alguém que havia acabado de ganhar uma aposta, se levantou da cadeira e respondeu:

-Com você

A morte olhou para ele por alguns instantes confusa mas logo respondeu:

-C...COMIGO?!? M..mas eu....

-Você o que? Eu ouvi falar que ninguém escapa da morte e que com isso não há exceções certo?

-Sim mais...

-O que significa que você também pode morrer certo?

A morte ficou quieta e depois respondeu baixinho:

-Sim, existe mais de uma morte, cada uma é responsável pela família de algum ser vivo, e quando essa família morre, a morte vai junto...

-Certo, então está decidido eu só morrerei quando você morrer, afinal você disse que iria me garantir isso

-Mas não tem ninguém mais com quem você queira morrer?

-Veja bem, a minha esposa morreu ano passado, eu não tenho irmãos e meu filho vai morrer aos 25 anos, e duvido que ele vá conseguir fazer o que eu fiz, afinal...

O jovem caminhou até um velho baú que continha pergaminhos e escritas em tábuas de argila:

-...não fui o único que tentou achar uma maneira de te enganar, mas aparentemente fui o único que não desistiu de achar uma maneira de fazer tal feito, tudo que precisei fazer foi continuar de onde eles pararam e notei duas coisas em consideração quando fui fazer esse plano: primeiro, não dá para te enganar mais de três vezes, e também nunca dá para utilizar o mesmo plano duas vezes

-E você conseguiu... eu aceitei sua proposta, e eu não posso voltar atrás na minha proposta o que quer dizer que...

-Eu venci!

A partir daí sabe se pouco o que aconteceu, sabemos apenas que o jovem viajou pelo mundo durante toda a história da humanidade, e sempre anotava o que via no que pudesse anotar, desde o papiro até os computadores, e contava essas histórias para todas as gerações da sua família que se espalhavam pelo mundo, com isso a sua lenda se alterou dependendo de onde fosse contada, a sua versão favorita era a uma versão japonesa dela que falava que ele havia ido para um castelo embaixo do oceano depois de salvar uma princesa do mar.
     O interessante disso é que você já pode tê-lo visto e nem ter percebido.

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