Tudo ficou para trás

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No outro dia bem cedo meu pai bateu tanto na minha porta que acabou a maçaneta frouxa.
- Krystian abra a porta.
Levantei ainda forçando os olhos para ficarem abertos, ainda não estava na hora de me aprontar para a escola.
Abro a porta e me deparo com meu pai usando seu uniforme de quando era do exército.
- Tome um banho bem rápido e vista uma roupa formal. Vou levar você para se alistar.
Fiquei em choque, não quero servir o quartel. Aquilo não poderia estar acontecendo.
- E não ouse fugir ou coisa assim. Será pior.
Antes de pensar em qualquer coisa eu corri para o quarto dos meus pais. Meu pai estava mexendo em uma gaveta e minha mãe estava dormindo.
- Mãe acorde. - Gritei tão alto que até meus irmãos acordaram. - O pai quer levar para o quartel.
- Isso é verdade? - perguntou a senhora Milles ao marido com cara de espanto. - Não pode fazer isso sem que ele queira. Não está sendo racional.
- Não quero saber, sou eu que decido tudo. Nossa família precisa voltar para os trilhos ou tudo vai para os ares. Ele vai se alistar e é melhor servir. Se for preciso implorar para ser aceito vai fazer o que for preciso.
- Mãe não deixe ele me levar por favor!
- Filho, você precisa fazer isso, mas não precisa servir, se você não quiser não fique. Ninguém pode te obrigar a nada, não tenha medo. - A mãe de Krystian o acalmou.
Pelo menos ele sabia que podia contar com ela.
- Vai tomar seu banho já! - Seu pai estava muito irritado.

No carro, o senhor Milles respirou fundo e começou a falar.
- É melhor você servir, terá outra visão do mundo. Você vai se tornar uma outra pessoa, uma pessoa melhor.
Os olhos de Krystian se encheram de lágrimas.
- Me tornar uma outra pessoa? Uma pessoa melhor? O que o senhor pensa a respeito de mim? O que pensa que eu sou?
- Você não é nenhum monstro, eu sei. Eu sei o que você tenta esconder da família.
- Eu não tenho nada para esconder de vocês. O que o senhor quer dizer?
- Eu sei que você é gay! E não admito.
Tudo ao meu redor ficou escuro. Não conseguia enxergar nem ouvir nada. Meu mundo desabou e eu estava paralisado.
- Você servindo o quartel vai ser renovado e vai ver que não é isso que você quer para sua vida. Diga que estou errado. Diga que você não é o que eu disse.
Naquele momento eu não sabia o que fazer. Sabia apenas que não podia ter medo e não podia esconder quem eu era de verdade.
- Não. - disse.
- Não o que?
- Não é mentira. O senhor tem razão, não sou hétero.
- Como assim não é hétero?
- Sou bissexual, pai!
O senhor Milles acelerou o carro e em questão de minutos estavam no estacionamento no quartel.
- Agora me escute. Você vai entrar, e dizer que quer se alistar e servir. Entendeu?
- Não vou servir. Vou apenas me alistar.
O senhor Milles abriu a porta e puxou Krystian para fora do carro, o puxão foi tão forte que Krystian caiu no chão e bateu as costas no carro que estava estacionado ao lado.
- Ei o que está fazendo? - Perguntou um rapaz que passava por eles.
- Isso é problema de família, vê se não se mete!
- Me chamo Taehyung, está tudo bem? - Perguntou o rapaz para Krystian, ajudando ele a se levantar.
- Está sim, obrigado. - agradeci.
- Tire as mãos dele, ele consegue se levantar sozinho. - Disse o senhor Milles.
- Ele está sangrando, o que você fez? Vou levar ele até a enfermaria do quartel.
- Largue do meu filho!
O senhor Milles segurou o braço de Krystian e o guiou para dentro do quartel. Taehyung ficou observando.

Dentro do quartel o pai de Krystian não deixava o menino responder nenhuma das perguntas feitas na entrevista de recrutamento. E claro, o pai sabia o que dizer para fazer o menino ser aceito.
- Bom, Krystian tem o perfil perfeito para ser aceito. - Disse o entrevistador. - Mas eu gostaria de entrevistar ele em particular, sem a sua presença senhor Milles, por gentileza espere lá fora.
Krystian deu o primeiro sorriso do dia.
- Tudo bem, se você quer assim.
O pai de Krystian saiu. E o entrevistador perguntou se ele realmente queria servir e Krystian disse que não, aproveitou que estava sozinho e contou que estar ali era desejo somente de seu pai.
Chamaram então o senhor Milles de volta para a sala.
- A entrevista já terminou. Senhor Milles, o Krystian infelizmente não foi aceito.
- Como assim não foi aceito, o perfil dele se encaixa perfeitamente nos quesitos de avaliação.
- As respostas que o senhor nos deu se encaixam no quadro de avaliação. O rapaz não deseja estar aqui. E não será forçado por ninguém a entrar. Ele nos contou tudo o que aconteceu até o momento em que chegaram aqui. Krystian, eu lamento ter passado por isso. Pegue este cartão, se precisar ligue para nós.
- Obrigado, senhor.
Krystian se despediu e saiu. Seu pai saiu logo depois. Os dois foram andando em direção ao carro, mas Krystian passou direto.
- Onde pensa que vai? Entre no carro agora e vamos direto pra casa.
- Não, eu vou pegar um ônibus e vou para a escola. Vou tentar fazer a prova que o senhor me fez perder.
Krystian saiu pelo portão sem olhar para trás e entrou no ônibus.

Quando chegou a escola, Krystian ainda tinha uma hora e meia até o fim da aula. Explicou o que aconteceu para o professor, que concordou em deixá-lo fazer a prova.
Assim que acabou, os alunos saíram e Krystian ouviu alguém chamando seu nome, quando virou para ver quem era, viu o menino que o ajudou no quartel.
- Oi, como você está? Perguntou Taehyung.
- Ah, estou bem obrigado por me ajudar.
- Não foi nada, você resolveu seu problema com seu pai?
- É uma longa história.
- Eu quero ouvir todos os detalhes. - Taehyung parecia realmente interessado em saber. - Vamos ao shopping? Você me conta tudo, além disso quero te pedir algo.
Krystian olhou curioso para Taehyung.
- Vou ligar para meu pai e pedir a alguém para nos levar.
- Tudo bem. - Krystian ainda estava curioso. Mas se sentia bem e confiava em Taehyung.
O carro chegou, os dois entraram e foram para o shopping. Krystian pensava no que Taehyung poderia pedir a ele.

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