-- Vó, to indo, beijão. -- Fala Maria João, que prefere ser chamada como Jojo, enquanto pega seu skate para ir logo para a pista.
-- Onde você ta indo Maria João!? -- Grita Dona Natália da cozinha, que sempre esquece para onde a menina vai todas as tardes e se recusa a chamar ela de Jojo.
-- Que Maria João, vó? Já falei que é "Jojo", repete comigo "Jo jo", caraca, não é difícil.
-- Apenas responde a pergunta, Maria João. -- Diz Dona Natália com um tom de deboche.
-- Uai, vó, para onde eu sempre vou?
-- E eu que tenho que saber? Quem sai é você.
-- Pra pista de skate, senhora.
-- Não me chama de senhora, eu sou jovem, quantas vós de 40 anos você conhece.
-- Senhora, você tem 80, não força.
-- Vai pra sua pista de skate e me deixa quieta, Maria João. E NÃO ESQUECE, CAPACETE, JOELHEIRA E EM CASA AS 15H.
-- Disso você não esquece, né? -- Jojo bate a porta e vai embora.
A minha vó é uma figura, eu amo aquela mulher. Sou extremamente grata por ela ter me criado depois que... bem... fui abandonada por um casal. Sim, um casal, eles não são meus pais, minha vó sim.
Eu sou a única menina que frequenta aquela pista, é meio chato porque parece que aqueles meninos nunca viram uma pessoa do sexo oposto antes, mas é incrível porque todo mundo que está lá olha para mim. Provavelmente porque sou mulher, mas gosto de pensar que é pelo meu talento, que cai entre nós, não é pouco.
Cheguei na pista, sempre tem as mesmas pessoas aqui, mas hoje tem uma pessoa nova, um menino, sentado com um violão tocando alguma música brega do Arthur Aguiar, será que ele conhece o rock? Guitarra? Que mal gosto. Mas ele até que é bonitinho, mas o que um garoto que toca violão ta fazendo numa pista de skate?
Vejo o Bernardo, um menino qualquer de 14 anos que conheci aqui, indo levar suco para ele, será que ele está acompanhando o Bernardo? Na verdade, a maior pergunta é: por que eu to me importando com isso? Ele nem é tão bonito assim... Tá, ele é bem bonito. Será que tem a minha idade? Aí meu Deus, Jojo, foca.
Procuro o Carlos, meu melhor amigo, a única amizade verdadeira que fiz nessa pista, o resto são só colegas, são legais, mas não é qualquer um que tem o privilégio de virar amigo de Maria João Dantas. Cadê esse garoto? Que saco, nunca chega na hora.
Ligo para ele, porque não sou obrigada a ficar aqui plantada esperando
-- Fala tu, Jojo.
-- Cadê você, garoto?
-- Puts, Jojo, me enrolei aqui, mas ja to chegando, marca um dez.
-- Onde você está e o que está fazendo?
-- Aí Jojo... Chegar aí te explico
-- Você tem 8 minutos contados no relógio!
-- Demorou, estou chegando.
Carlos devia estar com alguma menina, ele sempre está, mas as vezes elas moram longe e ele vai o quão longe for por um beijo na boca. Carlos é gato e charmoso mas não faz nem um pouco o meu tipo, ele dava muito em cima de mim antigamente, e admito que já ficamos uma vez, mas já passou, hoje em dia a gente da risada quando lembra.
Ele finalmente chega.
-- Hm, demorou 7 minutos exatos, está de parabéns. -- Jojo fala com um tom de deboche.
-- Muito obrigado, é só mais um dos meus charmes -- Ele responde no mesmo tom.
-- Agora me explica o motivo do atraso, mocinho.
-- Estava com a Eduarda, e ela mora a umas 3 cidades daqui, me enrolei.
-- Caramba, Carlos, o que você não faz por um beijo?
-- Eu não teria que ir de pagar uber pra lá se a garota mais bonita do meu bairro gostasse de mim...
-- Mas você não já ficou com a Fernanda na festa de ano novo?
-- Estou falando de você, sonsa.
-- Ah, sim -- Ela ri muito alto -- Lamento, mas não, você não é bem o meu tipo.
-- No carnaval do ano passado eu era exatamente seu tipo, né?
-- Para de graça, foi só uma vez.
-- Tá bom, não está mais aqui quem falou. -- Ele da um gole na garrafa de água que comprou no caminho. -- Quem é o cara do violão? Nunca vi ele aqui antes.
-- Ah... Não sei, acho que uma amigo do Bernardo, ele é bonitinho, né?
-- Toca bem, se interessou?
-- Eu nem conheço o garoto, Carlos.
-- Vamos lá falar com ele.
-- Você está doido? Se quiser pode ir, mas eu vou ficar bem aqui.
-- Tudo bem, mas saiba que vou fazer uma propagando sua.
-- Carlos, se você por acaso falar o meu nome, eu mato você
Carlos da um sorrisinho e vai andando em direção do garoto que ainda está tocando violão, Jojo nem se importa, vai pra pista sem o Carlos.
-- E aí, cara -- Carlos cumprimenta o menino do violão.
-- Oi, e aí.
-- Nunca te vi aqui, anda de skate também?
-- Pô, eu até queria saber andar -- O menino para de tocar e solta uma risada -- Mas não, só vim acompanhar meu melhor amigo, o Bernardo.
-- Ah, sim. Nem perguntei, qual seu nome?
-- Gustavo, e o seu?
-- Carlos, prazer.
-- Prazer. Deixa eu te perguntar, quem é aquela menina que estava com você? Sua namorada?
-- Meu Deus! Não! Ela é minha melhor, a Jojo.
-- Jojo... Achei legal.
-- Ah, não, não é o nome dela. Mas se não quer levar um soco na boca, só chama ela pelo nome.
-- Por que? Qual o nome dela de verdade?
-- Maria João, mas ela não gosta que chamem ela assim, nem eu sei porque... Mas por que esse interesse todo na Jojo?
-- Ah, não sei... Ela é a única menina aqui, é bonita, anda de skate... Sei lá, só me chamou atenção.
-- Olha que coincidência, você também chamou a atenção dela... -- Carlos da uma risadinha.
-- Sério? -- Gustavo responde todo empolgado.
-- Calma, campeão, foi exagero, ela só... notou sua presença aqui. -- Gustavo faz uma cara e desapontado -- Mas vindo da Jojo, já é muita coisa.
-- Quantos anos você tem? Acho que nem perguntei
Gustavo tenta desviar do assunto.
-- Tenho 15 e a Jojo também... -- Da um empurrãozinho no ombro dele. -- E você?
-- Eu tenho 15 também.
-- Olha só, mais uma coisa em comum entre você e a Jojo...
Um barulho enorme toma conta da pista segundos antes de Carlos gritar o nome da amiga...
VOCÊ ESTÁ LENDO
O AMOR NÃO PREVISTO
RomanceMaria João é uma garota que foi abandonada pelos pais quando tinha apenas 3 anos. Ninguém sabe explicar o motivo, nem mesmo sua avó, a Dona Natália, que diz não entender. Mas será que ela não entende mesmo? Mesmo com muitas coisas ruins em sua vida...