Esse relógio não quer andar de jeito nenhum. O "tic-tac" dos ponteiros só faz com que meu nervosismo aumente, assim como a movimentação da minha perna embaixo da carteira. Eu preciso muito que o intervalo comece logo, ou eu vou enlouquecer de tanta ansiedade.
Cara, eu sabia que devia ter entregado aquela droga de carta pessoalmente, e não ter deixado o Caique fazer o papel de cupido. E se ele tivesse errado a garota? Ou estragado o envelope? Ou até mesmo ter jogado no lixo junto daquela pilha enorme de comunicados e provas dos outros bimestres? Ele vai ser um homem morto.
O sinal estridente toca. Levanto da cadeira com tanta rapidez que chego a bater meu joelho na parte de madeira, cara, isso doeu pra caramba. Saio da sala correndo e me direciono para a sala duas portas atrás da minha. Me ponho plantada do lado do batente, espionando de canto o interior da sala, procurando o garoto magricela e de cabelo longo que chamo de melhor amigo.
"Esse otário nem me esperou?"
— Bu! - salto para trás, batendo contra o peito de Caique. O mesmo começa a rir, me segurando pelos ombros. — Você precisava ver a sua reação!
Me viro e começo a estapear o ombro do garoto, o que pareceu aumentar suas risadas. Suspiro no momento que paro, dando um sorrisinho de lado.
— Você vai ser um homem morto na próxima vez que fizer isso, Amorim. Eu 'tô te avisando.
— Claro, claro. Assim como avisou das outras trezentas vezes e ainda sim se assusta que nem uma mocinha. - ele me lança um olhar de deboche.
— E aí? Você entregou a carta pra pessoa certa? - pergunto nervosa, começando a estralar os dedos.
— Eu alguma vez já entreguei uma carta pro destinatário errado, Brito?
— Eu preciso mesmo citar todos os nomes? A gente pode começar pela Catarina, depois vem a Denise, a Karina, a... - ele me interrompe.
— Tá, tá. Já entendi. A culpa não é minha se você escolhe meninas com um rosto igual, Luna. Mas, sim, eu entreguei a carta pra menina certa. Olhei para a foto que você me mandou via mensagem dez vezes antes de a entregar em mãos. Feliz?
— Mais que feliz. - solto um risinho bobo.
Eu espero que a Evelyn não me dê um pé na bunda. Eu literalmente reescrevi aquela carta vinte e cinco vezes, querendo que saísse perfeita pra ela. E também espero que ela seja pelo menos bissexual, porque eu não aguento mais me apaixonar por hétero.
Chegamos na cantina, que estava lotada de adolescentes e alguns professores estavam no meio daquela bagunça. O colégio Martin Aragão tinha três pavilhões com lanchonetes embutidas. Prevendo que aquele lugar um dia abrigaria muitas pessoas, os fundadores não se seguraram ao planejar e construir a escola. Todos os espaços lá dentro eram quase enormes, mas pareciam pequenos quando tinha muita gente, como se pudesse explodir de superlotação a qualquer minuto.
Entramos na fila gigantesca que já tinha se formado. Caique conversava com um menino na nossa frente quando Ísis chegou.
— Eu posso furar fila com vocês, né? - ela sorriu ao dizer.
— Sempre, minha querida. Entra aqui que tem espaço. - a puxo para perto, deixando ela entre eu e Caique.
Ísis é uma das minhas amigas mais próximas, quase a única verdadeira que eu tenho. Me aproximei dela no oitavo ano, depois de me declarar e descobrir que ela não curtia meninas. Foi uma baita desilusão, mas gerou uma boa amizade. Seu cabelo cacheado, agora platinado, estava preso em dois coques acima da cabeça e a pele negra retinta brilhava um pouco. Não sei dizer se é por causa do calor ou do iluminador que ela poderia ter passado.
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Pra quê a pressa?
RomanceLuna Brito é uma aluna do segundo ano do ensino médio no colégio estadual Martin Aragão. Ela é uma das garotas mais conhecidas da escola, sendo conhecida por seu talento na música e uma beleza sem igual. Sua vida toma rumos inesperados no dia que se...