Capítulo 1 - Jantar

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POV Louis

Chega a ser cômico observá-los daqui de cima. Papai e Lottire estão no jardim treinando para uma guerra que sequer irão participar. Uma única gota de suor luta para continuar escorregando na testa de meu irmão, ele não aguentaria dois minutos em uma batalha. Mesmo que sejam musculosos e andem com tanta arrogância, ainda assim não passam de dois principezinhos. Suas armaduras perfeitamente polidas, sem um arranhão, provam que é tudo uma questão de imagem.

Disso o meu pai entende: a imagem dele e da família.

Tantas estátuas espalhadas pelo reino, pouca renda distribuída. Todas as mulheres quase se matam para atingirem a beleza e juventude da minha mãe, as moças disputam pela atenção de meu irmão e a lista continua... Uma espécie de pão e circo, somos a distração da fome que sentem. Se eu ao menos fosse o próximo na linha de sucessão, poderia tentar melhorar as coisas, mas isso não cabe a mim. Portanto, observo já que nada que eu fale fará alguma diferença. Aceito calado, pois é melhor do que que ser exposto e castigado. Uma vez, Lottire elevou o tom de voz para falar com papai e levou um soco tão forte que seus lábios sangraram. Eu era novinho na época e não quero passar por isso. Principalmente porque estou cada vez mais próximo de partir mesmo que em péssimos termos.

– Alteza. – Uma criada adentra o quarto. - O jantar será servido às 18 horas. Vossa Majestade pediu para que assegurasse que chegaria no horário. - disse ela tímida, fez a reverência e deixou o cômodo.

Não tem volta. Nunca teve, na verdade. O noivado está marcado para hoje a noite e logo estarei longe. Partir do Reino Ametista e rumar o Reino Crisocola me dá calafrios, mas ao menos será um novo ar, uma nova vida ao lado de uma mulher que vi duas ou três vezes na vida. Ela é bela, tem um ar gracioso, não nego. Nunca conversamos direito, mas sei que ela gosta de sol e cavalos. Bem, eu não aprecio o calor e nem mesmo os equinos. Talvez tenhamos algo em comum, não sei. Espero que sim. Chacoalhando a cabeça para espantar os devaneios, direciono-me para o banheiro para me limpar e então vestir-me de maneira adequada para tal evento.

Um traje pesado e com incontáveis camadas esperava por mim. Tantos acessórios, tantos broches de vitórias que não lutei, luvas, anéis... sufocante. Melhor eu me recompor antes que tenha outro ataque. Da última vez, era como se minha garganta fechasse e meu coração tivesse desistido de trabalhar, assim se forçando a bater o mais rápido que podia para que saísse do meu peito. Por isso, adiantei-me e pedi à serva que me trouxesse um chá para deixar meus sentimentos menos extravagantes. A última joia pendia em uma das minhas orelhas e a última unha já havia sido pintada de roxo, a cor do meu reino. Quanta vaidade... Mas ordens são ordens, e ninguém se desfaz das vontades do rei.

Atravessando enormes salas e vendo meu reflexo nos espelhos espalhados pelos corredores que passava, finalmente cheguei à sala de jantar. Eu estava bonito, até. O cabelo penteado para trás, a roupa me caía bem. As luvas brancas estavam um pouco largas, e os buracos para a saída dos meus dedos estavam meio folgados, mas isso as deixava confortáveis. Minha mãe já estava em seu lugar à mesa quando cheguei, sua aparência era pálida mas seus cabelos loiros continuavam sedodos e brilhantes. Ninguém acreditaria que ela está a lutar contra uma enfermidade, nem mesmo seu marido acredita e, por isso, a fazer sair da cama, colocar maquiagem e roupas de luxo para manter as aparências. A foto da família perfeita precisa estampar a capa do jornal! Patético. Seus olhos cintilavam um azul suave nas pálpebras, quando os piscava lentamente eu sentia sua dor. Espero que façamos isso rápido para que ela possa descansar.

– Por que sua pele brilha tanto? – Lottire não se deu o trabalho de esperar que eu sentasse à mesa para que começasse a me açoitar com seus comentários peçonhentos.

– Eu não contarei o meu segredo. Não funcionaria em você. – respondi com a mesma aspereza.

– Garotos, sejam gentis! Nossos convidados já estão a caminho. – a voz angelical de Stevie, minha mãe, soou em um tom sereno pela sala.

– Adentrando a sala, Rei Simon Targana, Rainha Camille Targana e Princesa Eleanor Targana. – anunciaram os guardas.

Então os três se mostraram, com todos os seus adornos e pompa. Sempre com o queixo para cima, quase que com dificuldade de enxergar o chão, era possível ver o quão forte eram suas mandíbulas bem marcadas; um traço predominante nos Targana. As unhas com um tom frio de azul expunham o orgulho que têm de serem crisocolanos. Vestir as cores das pedras do reino mostra, acima de tudo, status. E é por isso que iremos nos unir: status. Eleanor e eu. Tomlinsons e Targanas. Crisocola e Ametista. Poderia ser mais miserável? Gosto de acreditar que sim.

– É uma honra compartilhar essa refeição e celebrar com vocês. Aos noivos! – Camille ergueu sua taça de vinho com um sorriso em seu rosto. Quase me contagiei com sua animação, faltou um pouco mais de entusiasmo.

O jantar demorou um pouco para passar, a conversa não soava natural, os tópicos eram os mesmos. Então convidei Eleanor para um passeio no Jardim, assim nos conheceríamos e minha mãe poderia descansar. O sol já havia se posto e a atmosfera estava totalmente azul, com um toque melancólico e irônico da mãe natureza. A brisa batia suave no rosto da princesa que franziu o nariz. Sua pele não reluzia, apenas seus olhos. Talvez fosse o excesso de maquiagem, mas não parecia confortável. Tentei conversar com ela, nada além dos assuntos já citados enquanto estávamos todos juntos. Eu esperava uma conexão mas ela parecia se afastar, o que me despertou algo que eu não esperava: alívio. Ela também não queria estar ali. Fazia muito tempo desde que eu não sentia algo, mas aquele momento me trouxe conforto.

– Olha, Louis, eu sei que você não queria estar aqui. Sejamos sinceros, um casamento arranjado não é o que nos inspira. – ela disse para mim, pude ver verdade em seus mirantes. Não consegui controlar minhas expressões, mostrando que ela, de fato, leu os meus pensamentos. – O que eu quero dizer é que eu entendo você não ter interesse em mim, em não sermos grandes amantes um do outro. Vamos unir nossos reinos, deixar nossos pais felizes e, com sorte, seremos bons amigos.

Sorri sem graça. Foi fácil ler minhas emoções, que não eram muitas. Ficamos ali mais um tempo sentindo o vento fresco, sem olhar um para o outro, até que fomos chamados para despedir da família. Aquela noite talvez eu finalmente dormiria melhor, depois de tanto tempo me sentindo monótono, a sensação de consolo e compreensão poderia melhorar meu sono. Não pensaria mais na criatura que me persegue enquanto durmo, estaria ocupado demais aproveitando o resquício de esperança que eu tenho a respeito do casamento.

Always You | Larry StylinsonOnde histórias criam vida. Descubra agora