Capítulo dez

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O chalé permanecia do jeito que estive pela última vez, aos dezesseis anos.

As paredes de fora pintadas de um azul royal com bordas brancas, a chaminé acesa, as flores coloridas pelo jardim de grama verde, o balançador feito de pneu velho com uma corda marrom e as macieiras que, por muito, abrigaram a pequena Dom e suas leituras desenfreadas.

Sentia saudade dali e de tudo que aquele lugar representava.

- Dominique, minha criança!

- Tia Gus, meu Deus! - aperto minha tia em um abraço forte e cheio de saudade. Tinha medo de ela desmontar a qualquer momento, mas a saudade era maior e eu não consegui segurar o aperto.

Tia Gus mora com um par de ajudantes/funcionários há uns quatro anos, desde que meu tio Curtis faleceu em um acidente carro. Lembro que foi um dos marcos que separaram minha vida de uma forma que jamais será esquecida.

Tio Curtis podia ter o defeito que fosse, mas sempre foi leal e atencioso comigo, Melanie e com o resto da família. Era sempre ele que brigava comigo quando, nas reuniões familiares, as pessoas teimavam em levar leitões ou algum tipo de carne para comer.

Ele sabia que eu era vegana antes mesmo de saber o que isso significava.

- Que saudade eu estava de você, pequena. Na verdade, não tão pequena assim. - rimos, ela passa ambas as mãos em meus cabelos soltos. - Está enorme! E esse cabelo? Céus, tão diferente e linda!

- Obrigada, tia. Você também está tão diferente. Eu amei esse corte de cabelo, você arrasou! - ela faz uma feição convencida, me fazendo rir.

- Oras, que falta de educação a minha! Anda, anda! Entre. Perry, leve as malas da minha sobrinha até o quarto, por favor.

Logo, um homem de aparência asiática e sorriso reto, passa por nós, acenando levemente com a cabeça. Ele pega minhas malas com cuidado e sobe a escadaria.

Foi impossível não varrer o olhar por tudo ali. As paredes pintadas de um beje escuro, quase marrom, o piso de madeira desgastada, a viola no canto do cômodo, os sofás de dois lugares, o tapete preto e os quadros espalhados por todo lugar. Sorri ao ver um meu, abraçando Mel com um braço e um gatinho de pelos negros com o outro.

- Karamel, a primeira gatinha de vocês. - tia Gus fala, assim que me pega observando.

- Nunca soube realmente o que aconteceu com ela. Vocês diziam que alguém precisou levá-la embora. O que houve?

- Não sei se lembra, mas Curtis resgatou Karamel de um incêndio na delegacia, ela já tinha bastante idade, cheia de problemas. A coitada não durou mais que sete meses. Lembro que ela acabou falecendo na casinha que você fez para ela, quando você e sua irmã tinham ido para a escola. - arqueio as sobrancelhas, sentindo falta de Karamel. Por muito tempo, ela fora minha melhor amiga de toda a vida. Não era fácil socializar na escola, muito menos sendo filha de quem eu era ou irmã da "encrenqueira Melanie" - Tenho certeza que ela aproveitou seus últimos dias.

- Eu lembro que, na noite anterior, eu passei horas e horas com ela no meu colo, lendo os três porquinhos para Karamel enquanto Melanie jogava no celular, na cama bem em frente a minha. Quando ela me ouviu chorando na parte do lobo mau, soltou o celular, veio até mim, me abraçou e disse que estava tudo bem, o lobo nunca me alcançaria. Mas eu não estava com medo dele. - confesso, lembrando exatamente do momento relatado.

Flashback on

- Shiii, baby girl. Não precisa chorar por isso, tudo bem? É só uma história boba. Você é a deusa guerreira da minha tribo, não lembra? A mais corajosa de todas!

Cause i'm a fool for youOnde histórias criam vida. Descubra agora