Capítulo 1

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       -Amor, pega aquela coisa ali pra mim.
      
       -Que coisa?- Tirei os olhos da comida por um instante para olhar o Eduardo, que estava muito concentrado na sua nova obra, que seria uma escultura toda feita com uma espécie de barro, e, bem parecia um...- Pelo amor de Deus, o que é isso?
      
       -O que sente olhando para ele?
      
       Lorenzo olhou por alguns minutos, analisando. Era como se tivessem feito a escultura de um homem, depois dado socos até ele ficar irreconhecível (literalmente). Parecia agora uma confusão de amassados em barro.
      
       -Sinto confusão e um pouco de pena do pobre homem.
      
       -É exatamente isso. Transparece a confusão da mente humana, a confusão que somos por dentro, só que agora essa confusão que somos está ao avesso, exposto.

       -Bem exposto mesmo; Mas o que você queria?

       -Ah, sim. Pega aquela coisa ali em cima, tá atrás de você.
      
       Lorenzo suspirou, detestava quando Eduardo fazia isso, era só falar o nome, pegaria e pronto. Desligou a comida, estava tudo pronto. Iriam jantar hoje apenas arroz, salada e carne assada com batatas, que estavam com um cheiro maravilhoso.
      
       -Ok, amor... Mas qual o nome? Tem várias coisas atrás de mim.
      
       -Inclusive uma bunda linda e deliciosa- Eduardo sorriu malicioso e largou a escultura de lado, indo em sua direção.
      
       Eduardo era de uma beleza incrível. Negro, alto e magro, tinha um porte elegante, andava sempre com uma pose confiante. Seus cabelos cacheados e olhos negros o deixavam encantador, foram as primeiras coisas que notou quando o viu numa exposição, notou o brilho dos seus olhos enquanto admirava a sua própria obra, pois era a primeira. Lorenzo viu as mãos passando pelo cabelo, indicando também um pouco de nervosismo, e ele se apaixonou por Edu naquele instante.

       Lorenzo sorriu tímido e ajeitou os óculos. Saiu detrás do balcão que separava a sala (e agora estúdio de artes) da cozinha. Seu amor veio em sua direção, abraçou, o encostando numa das cadeiras do balcão.
      
       -Quer saber, deixa pra lá. Depois eu termino. Esse cheiro tá maravilhoso- Eu estava me desconcentrado, já que sua mão passeava pelo meu corpo, me aquecendo. Primeiro ombros, depois descendo lentamente, indo parar na minha cintura. Ele se encostou mais e me apertou mais, beijando meu pescoço, e com a outra mão segurando minha nuca, depois meu cabelo. Engoli em seco.
      
       -Eu, eu... Ahn... Fiz carne assada, coloquei um pouco de vinho e... - esqueci o que ia dizer quando sua mão desceu da minha cintura para a bunda, pegando e me trazendo mais para si.
      
       -Acho que seu cheiro está mais saboroso do que da comida, talvez eu coma a sobremesa primeiro- senti seu sorriso enquanto ele mordia meu ombro.
      
       Ele me beijou, de maneira lenta e doce, começou a tirar minha camisa e eu o ajudei a tirar a dele, fomos caminhando até o sofá...
      
       Até o celular tocar, e pelo som do toque, era meu pai. Com certeza com alguma coisa urgente, ou algo ruim, já que qualquer recado para o filho era dado simplesmente por sua secretária. Lorenzo não tinha uma relação boa com seu pai, mas também não era como uma guerra. Era só uma relação fria. E era assim desde que sua mãe morreu, quando tinha apenas 6 anos.
       Ele passou nervosamente a mão pelo cabelo e olhou para o Eduardo. Ele parecia tenso e triste, mas indicou para ele atender o celular. Os dois não eram assumidos, e Edu foi o primeiro (de tudo) para ele. Não sabiam a reação do seu pai ao saber que o filho é gay, então decidiram esperar até ter mais reconhecimento na empresa. E eles pretendiam revelar para todos seu relacionamento no dia do aniversário do Lorenzo.
      
       Lorenzo foi até a mesa da sala/estúdio e pegou o celular.
      
       -Alô?
      
       "Lorenzo, demorou para a atender."
      
       -Desculpa, estava preparando meu jantar. Algum problema?
      
       "Não, só queria saber como está."
      
       Lorenzo olhou confuso para Eduardo, que fez cara de "O que houve?". Lorenzo deu de ombros, meio perplexo ainda.
      
       -Estou... Bem. Algum problema, pai?- Lorenzo voltou a perguntar.
      
       "Está tudo bem. Não posso ligar para conversar com meu filho? Saber como está?"
      
       -Não, claro... Estou bem sim, e o senhor?
      
       "Estou bem. Animado também, seu aniversario está próximo", ele deu uma pausa, pirragueou, "Podemos fazer um jantar aqui em casa, um jantar apenas para pessoas próximas, se você quiser."
      
       Lorenzo só ficava mais e mais confuso, esperando que algo acontecesse para explicar essa conversa repentina com seu pai. Carlos Villard era um homem frio, não demonstrava fraqueza, medos. Raramente (ou quase nunca) tinha demonstrações de afeto. Essa mudança brusca de comportamento deixou Lorenzo sem reação.
       
       "Então? Não posso esperar eternamente, Lorenzo. Jantar aqui em casa, no seu aniversário."
      
       -Seria muito bom- respondeu sem muita conficção, o que passou despercebido para Carlos.
      
       "Ótimo, mandarei organizarem tudo para o jantar. Faça uma lista de convidados, e rápido.", um barulho e depois alguém chamando, "Terei que ir agora, tenho assuntos para resolver." Como de costume, seu pai simplesmente desligou, sem se despedi. Mesmo assim, Lorenzo continuava desconfiado.
      
       -O que seu pai queria? E essa cara ai de espanto? Algo ruim?- Eduardo perguntou curioso.
      
       -Não sei se é ruim... Mas ele sugeriu um jantar, no dia do meu aniversário, na casa dele. Falou que vai organizar tudo e me mandou fazer a lista de convidados.
      
       -Sério? Isso parece bom! Seu pai costuma apenas te dar um presente, as vezes mal deseja um "feliz aniversário".
      
       -Sim, só achei... Estranho, sei lá. Do nada isso. Não acha estranho?
      
       -Para com isso, vai ser bom- Edu deu uma pausa- Talvez... Você possa até falar sobre a gente.
      
       Lorenzo estava ansioso. Ele planejava mesmo falar sobre seu relacionamento com o Eduardo para seu pai, mas ainda assim se sentia temeroso.
      
       Apesar de ser seu pai, Lorenzo não conhecia ele. Eles não conversavam muito, e quando conversavam era sobre a empresa. Quando ainda era novo tentava uma aproximação e sempre se deparava com um muro de gelo. Depois, já na adolescência, se sentia deprimido... Mas essa é uma época que não gosta de recordar. Com o tempo, notou que o que realmente importava para o Carlos, era sua empresa, então apenas se desinteressou a ter uma relação de pai e filho, e decidiu apenas investir na vida profissão. Sabia que Carlos iria apenas colocar pessoas competentes, e não abriria privilégios para ninguém, mesmo sendo seu filho.
      
       A prova viva disso é ele ter começado na área de serviços gerais, onde conheceu muitas pessoas legais, e hoje considera amigos. Assim, pagou sua faculdade (seu pai disse que poderia pagar metade, a outra metade ele teria que trabalhar para ter). Lorenzo sabia que seu pai fazia essas coisas para pressiona-lo á desistir, mas apenas o tornou uma pessoa melhor, e o distanciou mais de Carlos. Podia lembrar da expressão no rosto de seu pai quando defendeu mais benefícios para os funcionários, como creche e descontos em farmácias. Para Carlos, o salário que recebiam mais o vale alimentação e transporte eram o suficiente, já Lorenzo achava que não, que podiam melhorar. Foi o primeiro de muitos desentendimentos com seu pai. Mas agora, com a posição que almejava na empresa, conseguiu fazer muitas melhorias, pequenas e grandes coisas que deixavam Lorenzo feliz, a empresa prosperava e os funcionários estavam bem. Conseguiu aprovar os descontos para creches, farmácias, hospitais, psicólogos. Com isso, até seu pai admitiu: os funcionários rendiam mais, eram mais dispostos. Menos acidentes, demissões, desentendimentos, o ambiente de trabalhou se tornou mais leve.
      
       Ele iria conseguir contar tudo. Lorenzo não podia e não queria adiar mais isso, era um homem já e conseguiu sua independência. Se seu pai não aceitasse, não poderia fazer nada, só seguir sua vida do lado da pessoa que amava. Realmente poderia apenas ser um exagero sua preocupação com o jantar. Não passaria disso: um jantar de aniversário, com amigos próximos e seu pai.
      
       -Sim, vai ser bom. Me ajuda a escolher uma roupa legal? Você é melhor nisso que eu- riram enquanto iam preparar a mesa para jantarem.
      
       Sim, ficaria tudo bem.

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⏰ Última atualização: Sep 10, 2020 ⏰

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