Um homem se encarava fixamente através da sujeira em um espelho velho na parede. Lá estava seu reflexo, sua face cansada e aparentemente muito triste. Olheiras escuras e profundas em seu rosto denotavam que algo não estava certo. Ele não conseguia se lembrar com exatidão da última vez que havia pregado os olhos.
— Vamos ficar juntos para sempre... Ethan...Você ainda me ama...? Você ainda sente tudo aquilo que me disse?
Uma voz gentil e familiar passeava em lamentos pela sua mente. Percorria caminhos e pensamentos sem volta naqueles dias, destrinchando as mais profundas e intocáveis lembranças que se cravavam ali como pregos.
— Pare... Pare... Chega! — Atormentado, o homem fechava os olhos e suplicava para que aquilo cessasse.
Ele sentia que nada mais valia a pena. Ethan havia se tornado uma pessoa amargurada. Amizades e hobbies, como pescar no fim de semana, nada disso chamava sua atenção como antes. Nem mesmo aquele forte cheiro que pairava pelo ambiente pequeno e imundo onde estava lhe causava qualquer repulsa. As moscas voando ao seu redor, os sanitários fedidos e entupidos, o chão pegajoso impregnando as solas de seu par novo de sapatos, nada o fazia sentir qualquer emoção.
Nada, inanidade total. Mas, espere... Havia algo ali, sim... Sua única companhia, além dos insetos e de toda aquela sujeira, era aquela dúvida.
— Anthony, você estaria mesmo lá? — perguntou para o outro Ethan no espelho.
Fora daquele banheiro, chovia intensamente, como se as nuvens estivessem chorando. Pelo menos era isso que Ethan pensava, o que o fazia chorar também.
Não resistindo ao grande aperto em seu peito, ele teve que apoiar as mãos trêmulas sobre a pia. Pegou um punhado de água e jogou em seu rosto para limpar suas lágrimas. Apesar de estar com a cabeça cheia de incertezas, aos poucos começou a se sentir melhor.
Sacudiu-a, deu pequenos tapinhas em suas bochechas e tentou ajeitar seu cabelo com os dedos. No fundo, ele tinha a esperança de que aquela notícia fosse verdade, pois havia recebido aquela carta especial.
Quando a chuva cessou, Ethan saiu daquele lugar pouco iluminado e viu um céu nublado do lado de fora. Lembrou que estava em um estabelecimento público na beira de uma estrada vazia. Uma brisa gelada veio de encontro ao seu rosto, bagunçando seu cabelo, que não via uma tesoura fazia dias.
Ele caminhou lentamente até uma máquina velha que ali havia, retirou do bolso da calça uma quantia de dinheiro e pressionou um botão vermelho, recebendo um maço de cigarros em troca. Colocou o primeiro que encontrou na boca e o acendeu com um isqueiro velho que sempre levava consigo. As pessoas sempre lhe diziam que fumar era prejudicial à saúde, mas Ethan não se importava com aquilo. O cigarro era um bom amigo, o deixava calmo e o ajudava a organizar melhor seus pensamentos.
Ele estava sozinho ali fora e preferia dessa maneira, só ele, o cigarro, seu carro e a vista majestosa do Lago dos Sonhos. Não tão majestosa, pois uma névoa flutuava pela sua superfície cobrindo toda a região naquela manhã.
Recostando-se em um poste, ele deu um grande suspiro, pegou a tal carta e a leu mais uma vez:
Paraíso.
O melhor fim de semana da minha vida
Não se esqueça da nossa promessa:
Voltaremos lá algum dia!
Sei que as coisas estão difíceis agora...
Sei também que é minha culpa...
Mas você disse que pularíamos de novo no lago.
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Sussurros em Paraíso - DEGUSTAÇÃO
HorrorA vida de Ethan Barnes vira de ponta-cabeça ao receber uma carta especial do amor de sua vida. Nela há instruções para reencontrá-lo no "lugar especial" dos dois, na cidade de Paraíso. O que é impossível, pois o remetente da carta faleceu há um ano...