Apenas um dia horroroso

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Capítulo I

  Lucas

  Tirei o meu fone pra ouvir melhor o que minha mãe estava gritando ali, na porta do quarto.
  - E a escola, esqueceu? - Ela disse.
  - Hoje é o último dia, provavelmente nem vai ter aula.
  - Por isso mesmo. Depois você terá muito tempo pra tocar guitarra.
  Eu realmente não via necessidade em ir para a escola naquele momento. Sentar em uma cadeira e ouvir um discurso de final de ano durante a manhã toda, não era lá muito produtivo. Porém eu já havia faltado ontem, e em quase todas as semanas nos últimos meses. E eu sabia que a minha mãe não estava nada satisfeita com isso.
  - Ah, tudo bem. Já estou indo.
  Peguei a minha mochila, mas antes de sair resolvi tocar um último som. Ao menos tentei, até ela gritar do outro lado da casa:
  - Eu sei que você não saiu daí ainda! 
  Caramba, ela não perdia uma mesmo. Deixei a guitarra de lado e fui.

Eudora

- Estamos quase chegando. - Tia Clara disse. Ela estava tentando sorrir, mas sabia que eu não queria estar aqui.
  - Você irá conhecer novas pessoas, fará novos amigos, vai ser legal! -  Nem ela mesma parecia acreditar em suas próprias palavras, o que tornava a situação ainda mais deprimente.
  - Talvez - Respondi. Eu não fazia questão de esconder a minha insatisfação, mas também não fazia questão de demonstrá-la ao máximo. Tudo isso seria somente um processo de aceitação, afinal não havia nada que eu pudesse fazer a respeito.
O motorista estava calado, provavelmente perdido em seus próprios pensamentos. Eu olhava para a janela ao meu lado, onde começava a surgir edifícios e semáforos, e o som de buzinas exaltadas e automóveis congestionados começavam a se expandir. Provavelmente havíamos chegado, ao passo que o carro diminuía sua velocidade aos poucos.

 
Lucas

         O sinal da escola tocou, trazendo os meus sentidos de volta a ação.
  - Lucas, venha até aqui por favor. - A professora me chamou. Sua expressão facial não estava das melhores, lá vinha bomba.
  - Entreguei os boletins ontem, mas você estava ausente.
  - Sim, eu estava muito mal... tipo, com gripe sabe.
  - Sei sim. - Falou me olhando de cima a baixo, parecia um pouco preocupada.
  - Então eu posso receber hoje?
  - Certamente, ele está aqui. E é sobre isso que eu quero conversar com você.
  Peguei o boletim que estava em sua mão, e antes que pudesse analisá-lo, ela disse:
  - Você reprovou em 3 matérias.
  Eu não estava surpreso, já sabia que o meu desempenho na escola havia decaído muito. Porém, mesmo o previsível pode nos abater, e era exatamente assim que eu me sentia, um cachorrinho abatido, um lixo humano que nem a única obrigação que possuía conseguia dar conta.
  - Eu sinto muito, mas você terá que ficar de recuperação.
  - É, eu sei...
  - O que aconteceu Lucas? Suas notas no começo do ano estavam ótimas.
  - Eu só estava meio desanimado.
  Ela me olhou silenciosamente e provavelmente decidiu deixar os prováveis motivos do meu fracasso de lado, e prosseguir.
  - Bom, pegue este papel. Nele contém todos os horários de aula e os conteúdos que você  precisará estudar.
  - Obrigado professora.
  - Por nada, entregue isto pro seu responsável ok?
  - Ok.
  Acenei com a cabeça e saí da sala, percebi que ela havia ficado me encarando por trás com uma espécie de expressão desprezível.
  Os alunos estavam gritando e correndo pelos corredores, eu me perguntava se seria só eu que não estava me sentindo feliz e animado com o fim do ano. Procurei meu colega de turma Carlos, ele estava no refeitório com alguns amigos, acenei de longe e ele consentiu, íamos para casa juntos desde o início do ano, quando descobrimos que morávamos próximos um do outro. Ele era bem humorado e sempre cumprimentava vários amigos quando chegávamos e saíamos das escola, e eu só sobrava como sempre. No início do ano eu cheguei a pensar que talvez as pessoas começassem a falar comigo pelo fato de me verem andando junto com ele, mas isso não aconteceu, eu era apenas sua sombra ou sei lá, alguém insignificante que ia para casa com ele.
  - Vamos?- Ele disse se aproximando de mim.
  - Vamos.
  Vimos o diretor Bruno na entrada da escola, se despedindo de todos os alunos que por lá passavam.
  - Tchau meninos, boas férias!- Ele disse acenando para nós.

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